Luiz
Carlos Formiga
> Vacinação desafio de urgência
No estado atual
da sociedade, a severidade das leis penais não constitui
uma necessidade?
(... ) Infelizmente, essas leis mais se destinam a punir o
mal depois de feito, do que a lhe secar a fonte. Só
a educação poderá reformar os homens,
que, então, não precisarão mais de leis
tão rigorosas."
O Livro dos Espíritos, Alian
Kardec, questão 796
Foi um ano histórico para a ciência biomédica
aquele de 1890. No Instituto Robert Koch, de Berlim, Von Behring
e Kitasato apararam a Imunologia no seu nascimento. Demonstraram
esses pesquisadores que no soro sangüíneo de animais
inoculados com o microrganismo causador da difteria (crupe) havia
a presença de substâncias ou fatores antibacterianos.
Naquela época era a difteria uma doença que se apresentava,
no mundo, com alta taxa de mortalidade infantil. No período
de 1883-84 Klebs e Löeffler conseguiram demonstrar que aquela
doença, que se apresentava inicialmente como uma dor de
garganta levando à prostração severa, era
causada por um micróbio (bacilo diftérico).
Quatro anos depois Roux e Yersin demonstraram que aquele quadro
era principalmente produzido pela distribuição sangüínea
de forte veneno (exotoxina). E em 1890 esses missionários
da ciência conseguiram demonstrar no soro de animais de
laboratório a presença de um fator capaz de neutralizar
os efeitos do tóxico microbiano. Nascia assim a era da
soroterapia, que abriria novas perspectivas no campo da medicina
curativa. Não ficam aí os trabalhos dos abnegados
pesquisadores da ciência médica. Contribuição
maior vem de Ramon que, trinta anos depois, preocupado talvez
com os efeitos colaterais que o tratamento pelo soro acarretava,
embrenha-se pelos caminhos, nem sempre tranqüilos, da medicina
preventiva. Ramon em 1923 apresenta à sociedade biomédica
uma descoberta que iria revolucionar o então "status
quo" no campo das doenças humanas transmissíveis.
Apresenta-nos um derivativo do veneno bacteriano que, conservando
suas características antigênicas, isto é,
sendo capaz de estimular o organismo a produzir suas próprias
defesas, seus antídotos, perdera sua capacidade tóxica
ou venenosa. Nascia assim a Imunologia para a Ciência e
com ela a vacinação infantil.
Estabelecer um serviço de imunização infantil
eficaz e permanente é, para qualquer país, dar um
passo adiante no sentido do desenvolvimento social e econômico.
Entretanto, para se estabelecer este serviço é necessário
trilhar caminhos cheios de percalços, uma vez que:
1) os serviços de saúde
não estão vinculados às mães para
poder administrar às crianças a vacina de que
necessitam na idade apropriada;
2) as necessidades técnicas de um Programa Nacional de
Vacinação exigem conhecimentos técnicos
no planejamento, na administração e uma supervisão
prática dos serviços;
3) a fabricação, estocagem e aplicação
são extremamente dispendiosas. Entretanto, muito se pode
fazer, melhorando os sistemas de atenção à
saúde para levar às crianças e às
mães a imunização; melhorando-se os sistemas
para atender a população rural e setores da população
urbana que disponham de menos recursos. A colaboração
de uma população bem informada, a obtenção
de fundos e o fortalecimento efetivo dos serviços básicos
de saúde são objetivos difíceis mas acessíveis.
Não podemos esquecer que
a vacina não precisa ser inventada. É uma técnica
relativamente antiga e efetiva.
Os resultados que parecem grotescos é que apesar da revolução
tecnológica registrada nos meios de comunicação
social (a televisão, o rádio, os documentos cinematográficos,
as revistas ilustradas) sigamos ignorando a possibilidade de evitar
tantas mortes. Milhões de crianças sobrevivem a
infecções evitáveis com a vacinação,
porém arrastam para o resto de suas vidas trágicas
seqüelas: lesões cerebrais, paralisias, atraso do
crescimento, enfermidades pulmonares crônicas, cegueira,
surdez, etc.
Nos países desenvolvidos 80% das crianças estão
imunizadas contra as enfermidades mais mortíferas da infância:
difteria, coqueluche, tétano, poliomielite e sarampo.
O sarampo, muito mais contagioso do que a varíola, é
grave problema de saúde pública, entretanto, basta
uma dose da vacina de vírus vivo para obter-se um grau
de proteção de 95% por espaço mínimo
de 4-5 anos, e provavelmente durante toda a vida da pessoa vacinada.
*
Mas se o ano de 1890 é um marco na história da saúde
física, o ano de 1857 é o marco na história
da saúde física e mental com a chegada do Consolador.
Quando Allan Kardec inspirado pelas "Vozes dos Céus"
publicou "O Livro dos Espíritos" a filosofia
tremeu nas suas bases. Porque a Doutrina Espírita é
a vacina que arranca da treva, que apresenta a estrada da redenção
e que diz que todos os nossos erros são resgatáveis.
O homem está na Terra em experiência evolutiva. A
Terra não é um lugar de degredo, não é
o vale das lágrimas, não é o inferno. É
a bendita escola, é o jardim onde colhemos e semeamos.
A Terra é o educandário de luz, no qual forjamos
a nossa própria evolução, no qual adquirimos
as experiências da nossa redenção. A Doutrina
Espírita desde 1857, 123 anos atrás, inaugurou a
era do espírito imortal. Tem-se agora a certeza de que
os mortos voltam e voltam para nos arrancar do caos e nos levar
na direção de Deus. Se nós devemos a Behring,
Kitasato, Klebs, Löeffler e a Ramon a era da vacinação,
devemos a Denis, Flammarion, Crookes, Delanne, Bezerra e a Kardec,
iluminados por Jesus, a era da vacinação mental,
o prenúncio de uma era melhor, sem poluição
psíquica. Porque, à semelhança da Medicina,
a Doutrina Espirita institui da mesma forma as técnicas
de vacinação, apresentando como referência
bibliográfica o Evangelho de Jesus, o maior tratado de
Imunologia que a humanidade conhece, como o afirmou Joaquim Murtinho
pelas mãos de Francisco Cândido Xavier. Os instrutores
religiosos, mais do que doutrinadores, são médicos
do espírito, que raramente ouvimos com a devida atenção,
enquanto na carne.
A semelhança da soroterapia para as doenças orgânicas,
instituiu a Doutrina Espírita a desobsessão que
vai desenvolver defesa estabelecida por ação exterior.
É um tratamento com dose muita vez indeterminada, porque
é muito mais fácil educar do que reeducar.
Os estados mórbidos da mente humana costumam ser distribuídos
por duas condições gerais de desordem mental: neurose
e psicose, distintas primariamente por intensidade de desarranjo.
A primeira pertence à área da Psicanálise
e a segunda à da Psiquiatria. Neurose é um distúrbio
emocional da personalidade que conduz o doente a um estilo de
vida desajustado. Ele está sempre em conflito consigo mesmo
e com o ambiente. No primeiro caso, porque tendências contraditórias
se debatem dentro dele, como a necessidade de afeto e a hostilidade.
No segundo, porque luta agressivamente contra os fatores externos
como se estes constituíssem uma ameaça à
sua vida e, ao mesmo tempo, procura recuar diante deles como se
julgasse não poder enfrentá-los. Acha o neurótico
que deve lutar antes de cooperar e, por isso, é fortemente
competitivo (ainda que não pareça).
Neurose corresponde em trabalhos espíritas ao termo clássico
perturbação, definida como estado de ânimo
desajustado, em que o indivíduo não consegue manter
a estabilidade emocional e mental, desviando-se para a tristeza,
pessimismo, desânimo, agressividade e reações
negativas desse tipo.
A fim de alcançar um ajuste precário com a circunstância
em que vive, o paciente vê-se forçado a criar diversas
maneiras de pensar e agir, conhecidas como pseudo-soluções,
visto não resolverem o problema íntimo. Muitos são
os comportamentos apresentados, mas as pessoas assumem um de três
tipos de atitude geral (com inúmeras variações
individuais):
1) aproximam-se dos outros porque
precisam ansiosamente de afeto e não suportam a solidão;
2) opõem-se porque são agressivamente ambiciosos
e querem dominar e possuir tudo;
3) afastam-se porque mal toleram o contacto humano e sentem-se
melhor no isolamento. São três atitudes predominantes
que não excluem as opostas, também presentes mas
inaparentes. O sujeito que está em oposição
aos outros é carente de afeição, mas procura
ocultar isso. Servem para caracterizar três tipos básicos
de personalidade: complacente, agressiva e indiferente. O homem
normal contém esses elementos em proporções
equilibradas. É amistoso, solidário, cooperativo.
Sintomas orgânicos aparecem não em número
pequeno (depressão, fobias, palpitações,
inibição, cansaço, angústia, micção
freqüente, etc.)
Aspecto fundamental do estado
neurótico são as perturbações nas
relações humanas e no trabalho. Pelas atitudes acima
mencionadas, vê-se logo que o neurótico defronta
enormes dificuldades no relacionamento com os seus semelhantes.
Tanto que uma das definições afirma que "a
neurose é uma perturbação nas relações
humanas"; em suma, é-lhe muito difícil gostar
dos outros, tratar com os outros e confiar na amizade deles. A
atividade no neurótico é sempre inferior à
sua capacidade, de modo que no trabalho ele é pouco produtivo.
Nota-se bem que as perturbações emocionais atrapalham
fortemente o aproveitamento da encarnação.
No curso da neurose o raciocínio conserva-se normal. Parece,
às vezes, desviado da normalidade porque usa bases falsas;
assim, o sujeito pensa que ninguém gosta dele, o mundo
é um lugar mau e perigoso, ou inversamente ele adora todo
mundo. Ora, esses juízos são falsos e falseiam os
raciocínios enunciados. Na verdade, o mecanismo de pensar
está intacto. Existe o senso da realidade e a vida social
é possível. O neurótico convive conosco,
no trabalho e dentro do lar.
Na psicose, a desorganização da mente é muito
mais avançada. O senso da realidade e a vida social mostram-se
nulos ou quase.
O psicótico não pode conviver conosco, a sociedade
manda segregá-lo para tratamento e assim é indispensável,
pois não pode responder pelo que faz.
O que mais importa perguntar é o que se mostra no fundo
das neuroses e psicoses, impregnando o espírito. Lá
está, bem perceptível, a citada tríade afetiva
do desequilíbrio mental. Os agentes etiológicos,
os "micróbios" do egoísmo, do orgulho
e da hostilidade numa associação sinérgica.
A causa geral de qualquer perturbação psíquica
reside na desobediência constante às determinações
da Lei de Deus (abandono sistemático das obrigações
impostas pela Lei). Uns estão rebelados contra a vida,
o mundo e Deus; outros estão desanimados ante os obstáculos
a remover do próprio caminho. Um dia, eclodem os variados
sintomas neuróticos ou psicóticos, conforme a intensidade
da perturbação íntima. Temos assim, como
causa específica as imperfeições afetivas
do Espírito, sendo o egoísmo a base dos sentimentos
desequilibrantes da alma, esse excessivo apego ao próprio
bem, sem considerar o dos outros. É a chamada "hipertrofia
congênita do eu" ou ainda "obsessão neurótica
do eu". Em outras ocasiões encontramos associado o
orgulho, inflação da personalidade, o desejo de
parecer superior ao que é. Assim esses indivíduos
só se ocupam de suas conveniências e vantagens. "Eles
gostam de levar vantagens em tudo" ignorando os outros. O
psicólogo Adler e o psicanalista Ralph fizeram comentários
muito pertinentes quando dizem que "todos os fracassados
- neuróticos, psicóticos, criminosos, bêbados,
crianças-problemas, suicidas, pervertidos e prostitutas
- dão à vida um sentido privado; ninguém
é beneficiado pelas realizações dos seus
objetivos e os seus interesses não vão além
de suas próprias pessoas...". Aninhado nas raízes
inconscientes está sempre o grande fator que influencia
a conduta consciente - o egoísmo. A pessoa que é
sempre teatro de lutas e dores é a pessoa que está
sempre ocupada com pensamentos relativos a si mesma.
Um fator a mais está sempre presente, a obsessão
- a influência maléfica, intencional ou inconsciente,
exercida por Espíritos imperfeitos sobre a humanidade encarnada,
de modo prolongado. "O predomínio de uma mente sobre
a outra produzindo constrição”. A obsessão
complica o quadro dos desequilíbrios já existentes
e é causa única de multas formas de demência.
Um homem pode enlouquecer só porque um Espírito
mau se lhe aderiu à organização perispiritual,
dominando-lhe a vontade e impondo-lhe seus pensamentos. Valiosa
contribuição no campo da obsessão pode ser
encontrada no livro do médico Adolfo Bezerra de Menezes
- "A Loucura sob Nova Prisma". Estudos mais recentes,
realizados no Hospital Psiquiátrico de Uberaba, parecem
indicar que o processo é mais comum do que se supõe.
A obsessão é portanto um constrangimento que um
indivíduo sente, graças à presença
perturbadora de um ser espiritual. Pode ser classificada em três
graus distintos, como se lê em "O Livro dos Médiuns",
de Allan Kardec, que as descreveu em seu capítulo XXIII
como ninguém ainda o fez com tanta segurança. A
obsessão simples - muito peculiar a quase todos os indivíduos
- seria um tipo de "gripe emocional", que todos nós
podemos ser dela vítimas, porque vivemos num mundo atribulado,
imediatista, agressivo. Desequilibrando-nos e sintonizamos com
os Espíritos também agressivos e desequilibrados.
Quando ela se agrava é a obsessão por fascinação.
O indivíduo se acredita abençoado por forças
superiores e não admite o intercâmbio com os Espíritos
menos ditosos; finalmente, quando ele perde o senso de equilíbrio,
cai no que o Evangelho chamava de possessão e que Allan
Kardec, muito adequadamente voltou a denominar como obsessão
por subjugação. Subjugação porque
a entidade subjuga-o, imprime-lhe a vontade e passa a exercer
nele um predomínio quase total.
Allan Kardec, antecipando-se às descobertas de Klebs e
Löeffler (1883-84), quando demonstraram a presença
de uma entidade microbiana na difteria; as de Behring e Kitasato
(1890), demonstrando um fator neutralizante no soro de animais
de experimentação, e ainda as de Ramon em 1923,
que introduziu a técnica da vacinação antidiftérica,
nos traz com "O Livro dos Médiuns", no ano de
1861 a técnica da desobsessão e revive, com auxílio
do Espíritos abnegados, a técnica da vacinação
mental deixada há quase 2.000 anos por Jesus e hoje redescoberta
pelos estudiosos do comportamento humano como Adler. "O Evangelho
segundo o Espiritismo" deixa no século passado contribuição
incomensurável, permitindo ao homem a oportunidade de desenvolver
recursos próprios de defesa contra suas próprias
imperfeições. Na doença diftérica
a vacinação encontrou o caminho adequado para livrar
a criança muita vez da morte. Mais interessante é
que, insatisfeitos com "apenas" o vacinar, os pesquisadores
desenvolvem um teste para avaliar a relativa susceptibilidade
da criança à doença, em outras palavras,
dispõe a ciência biomédica de um teste capaz
de avaliar se a criança, vacinada ou não, possui
defesas capazes de protegê-la contra um ataque da doença.
Analogicamente possui o homem um teste seguro para verificar se
a evangelização surtiu efeito no sentido do desenvolvimento
de recursos contra a poluição psíquica. Conhece-se
o verdadeiro espírita pela sua transformação
moral.
No campo do tratamento espiritual a desobsessão corresponde
à soroterapia no tratamento antitóxico da doença
infecciosa. O médico socorre o paciente com a injeção,
intravenosa ou intra-muscular, do medicamento capaz de estabelecer
defesas (imunidade passiva) previamente produzidas no exterior.
O indivíduo pode ser reequilibrado de fora para dentro,
mas o processo patológico foi exercido e, ainda, corre
risco de vida ou de seqüelas. A evangelização
infanto-juvenil atua no mesmo campo da desobsessão, entretanto,
à semelhança da imunização ativa (vacinação),
permite o desenvolvimento de "elementos de defesa",
mesmo antes do contacto com as fontes de infecção.
A criança vacinada, mesmo que possa sofrer o processo de
agressão microbiana e ficar doente, dispõe de resistência
que acarreta quadro clínico mais brando e cura em tempo
menor. A criança evangelizada será o homem vacinado
do futuro e mesmo diante de um mundo imediatista e atribulado
responderá favoravelmente à atmosfera neurotizante
das grandes metrópoles.
Estabelecer um serviço de imunização infantil
eficaz e permanente é, para qualquer país, dar um
passo adiante no sentido do desenvolvimento social e econômico;
estabelecer-se uma campanha nacional permanente de evangelização
infanto-juvenil é anunciar a era nova. É lançar
as bases para que o país venha a assumir o seu destino
de coração do mundo, verdadeiro celeiro de amor.
É por isso que o ano de 1857 é mais importante que
o de 1890. Se o ano de 1890 trouxe a contribuição
científica para a Medicina, a mensagem de 1857 trouxe Jesus
de volta para nós, dizendo-nos que a verdadeira felicidade
consiste em dar, em servir, em reter no coração
a amor para distribuir em abundância.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Bol. Ofic. Sanit. Pan. (OMS), 82(4): 285-299, 1977.
Franco, D. P. Anotações palestras diversas. Kardec, A.
O Livro dos Espíritos (tradução). 51a ed. FEB,
RJ, 1980. Kardec, A. O Livro dos Médiuns (tradução).
4a ed. FEB, RJ, 1904.
Rizzini, C.T. Evolução para o Terceiro
Milênio: tratado psíquico para o homem moderno. 1aed. EDICEL,
SãoPaulo, SP, 1977.
Reformador, 99 (1823): 61-64, fevereiro, 1981
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