Luiz Carlos D. Formiga

>    Alteridade - Termômetro

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Luiz Carlos D. Formiga
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A diversidade é uma realidade irremovível da Seara e seria utopia e inexperiência tratá-la como “joio”. Imprescindível propalar a idéia do ecumenismo afetivo entre os seareiros, para que a cultura da alteridade seja disseminada e praticada no respeito incondicional a todos os segmentos. A atitude de alteridade será -- o termômetro -- do progresso das idéias espíritas no movimento, será o “trigo” vicejante e plenificado na ética da fraternidade vivida. As instituições embebidas desse espírito promoverão o diálogo franco e transparente e construirão através das relações as transformações. O desafio está lançado.


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Roustaing, o Termômetro e os Direitos Fundamentais.

"o erro não se torna verdade por se difundir e multiplicar facilmente.
Do mesmo modo, a verdade não se torna erro pelo fato de ninguém ver
".
Gandhi

Sobre Roustaing não posso opinar. Não encontrei tempo para ler e estudar suas obras. No entanto, isto não impede as "contaminações" pelas amizades que tenho com pessoas dele admiradoras, aqui no Rio de Janeiro. Tenho encontrado entre os adeptos de Roustaing pessoas que dignificam o ser humano e com elas tenho amizade. Isso já me rendeu boicote em casa espírita e em estação de rádio. No entanto, acredito na pessoa humana como investimento divino. Um dia vão mudar e me compreender.

Não sou adepto de Roustaing. Nesse assunto sou ignorante confesso, mas tenho, eventualmente, lido o que dizem adversários e divulgadores. Existem outros ignorantes "confessos". São os que leram, não entenderam e fizeram a opção pela intolerância. Ignoram também as liberdades. Proibir uma obra é revelar temor. Pessoas, na revolução de 64, induziram-me a ler o Manifesto Comunista. Gostei. No entanto, gostei mais do Manifesto do Sermão da Montanha. Na época vivenciava ambiente conflitante, pois era espírita acadêmico de biomedicina na Faculdade de Ciências Médicas da UEG e também aluno-Aspirante a Oficial da Reserva do Exército (CPOR).

"Pessoas" me fazem recordar palavras de um jurista-filósofo, membro da Academia de Letras e reitor da USP: "o novo Código Civil começa proclamando a idéia de pessoa e os direitos da personalidade. Não define o que seja pessoa - o indivíduo na sua dimensão ética, enquanto é e enquanto deve ser". Miguel Reale leciona que "a pessoa é o valor-fonte de todos os valores, sendo o principal fundamento do ordenamento jurídico".

Sendo objetivo digo que "uma pessoa só tem liberdade religiosa se puder optar num ou noutro ponto de vista, sem perder sua dignidade como cidadão. A liberdade de crença e religião, sendo preservadas, aprimoradas e estendidas a todos os indivíduos, trará ainda maior evolução dos direitos e garantias individuais, que conduzem à justiça social e à paz entre os povos".

Pessoas participaram do Encontro de Cúpula Mundial de Líderes Religiosos e Espirituais pela Paz Mundial e assinaram o "compromisso com a paz global". Consideraram que as religiões têm contribuído para a paz no mundo, mas também têm sido usadas para criar divisão e alimentar hostilidades. Estes participantes concordaram que em um mundo interdependente, a paz requer concordância sobre valores éticos fundamentais. Declararam diversos compromissos. Destacamos a determinação de conduzir a Humanidade através de palavras e obras a um renovado compromisso com os valores éticos e espirituais, que incluem um profundo sentido de respeito por todas as formas de vida e pela dignidade inerente a cada pessoa e o seu direito de viver em um mundo livre da violência.

A revista Fraternidade (Lisboa) publica a reportagem. Nela soubemos que assinaram o "Compromisso" os integrantes da delegação brasileira, junto com Bawa Jain, Secretário-Geral do "The Millennium World Peace Summit" .

Como existem hoje no mundo muitos conflitos, tendo como base o pensamento religioso, acreditamos ser fundamental o respeito à liberdade de religião e o exercício da tolerância religiosa.

A religiosidade está presente no seio das sociedades humanas em todos os tempos. É um direito fundamental incluído em todas as Constituições. Situa-se no cerne das discussões sobre direitos humanos. Advoga-se que foi a origem de todos os demais direitos, sendo consagrado por tratados internacionais. Sua importância é inquestionável. No passado foi palco de graves conflitos, incluindo as atrocidades nas inquisições. Ainda hoje está presente nos graves conflitos existentes ao redor do mundo. A paz é favorecida através da tolerância e é de interesse de todos.

Encontramos estudos sobre a proteção à liberdade de religião ou crença no Direito Constitucional e Internacional. Na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos Pactos Internacionais sobre direitos humanos se proclamam os princípios da não-discriminação e da igualdade perante a Lei e o direito à Liberdade de pensamento e de convicção.

Importante é a luta para que não se menospreze a violação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, em especial a liberdade de religião OU CRENÇA DE QUALQUER NATUREZA.

A expressão exterior da liberdade religiosa é uma forma de manifestação do pensamento (penso, logo co-existo). Nesta coexistência vamos encontrar liberdades: a de crença; de culto e de organização. Da liberdade de crença surge a de escolha (ou não) da religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa, a liberdade (direito) de mudar de religião. Há limites, pois essa liberdade não compreende a de embaraçar o livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença, uma vez que esta liberdade vai até onde não prejudique a dos outros.

Esse direito pode ser estudado nos julgados do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. O artigo número 9, da Convenção Européia dos Direitos do Homem, trata da Liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Diz que "qualquer pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de crença, assim como a liberdade de manifestar a sua religião ou a sua crença, individual ou coletivamente, em público e em privado, por meio de culto, do ensino, de práticas e da celebração de ritos".

O Decreto 678, de 06 de novembro de 1992, do Governo Brasileiro, trata do assunto com base no Direito Constitucional Internacional, Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), ratificado em 25 de setembro de 1992. O artigo 12 da Declaração enfatiza o artigo número 9 acima referido, expressando o direito de mudar de crença e consagrando os demais direitos.

As pessoas só acordam para a importância da liberdade religiosa depois de serem alvos de alguma ameaça concreta. Acordei quando seu Júlio, na União Espírita Suburbana, Méier. RJ.RJ,, me contou o que religiosos fizeram com uma casa espírita nos anos dourados (1960).

Vamos saltar aos anos 90.

Até 1992 funcionou na UFRJ o "Grupo Jésus Gonçalves", no Centro de Ciências da Saúde. Com Edesio (Fraternidade André Luiz) e Paulo Hobaica (Obreiros do Bem) fizemos muitos estudos espíritas e combatemos o leproestigma, que assustou funcionários diante de um caso de hanseníase (rapidamente curado) entre nós. Este grupo foi o embrião do NEU-RJ. Promovemos um encontro que reuniu 300 pessoas, no anfiteatro nobre ("quinhentão") para ouvir e debater o tema "Regressão de Memória". Convidamos o jornalista Luciano dos Anjos. Surgiu o "fogo amigo".

Ainda não sou adepto de Roustaing e não estou preocupado em agradar a ninguém, mas registrar o interesse pelo direito constitucional e pela liberdade de crença.

A liberdade de religião é muito importante para a humanidade, sendo um dos pilares dos direitos humanos e da Democracia. Sou espírita, democrata. Sei que a democracia, como lecionava Norberta é cansativa (1990-2005), onera o tempo, mas não me apresentaram coisa melhor. Creio que um dos seus defeitos é não ter conseguido contornar o poder neurótico.

A liberdade religiosa está no cerne da problemática dos direitos humanos fundamentais. Não existe plena liberdade cultural, nem plena liberdade política sem liberdade religiosa. Alguns autores vão mesmo ao ponto de ver na luta pela liberdade de religião a verdadeira origem dos direitos fundamentais. Não se trata aí apenas da idéia de "Ética da Tolerância" como a declinamos para os Núcleos Espíritas Universitários, mas da concepção da liberdade de religião e crença, como direito inalienável do homem, tal como veio a ser proclamado nos modernos documentos constitucionais. Toda a doutrina, leis, declarações de direito internacional, julgados, pareceres, notícias apontam para o respeito e a proteção à liberdade de religião e crença como requisitos para o exercício pleno da democracia e cidadania e ainda como meios de combater a discriminação e a intolerância religiosa e de crença. Na aplicação, o exercício dessa liberdade não pode prescindir do princípio da igualdade, pois está calcada na idéia da dignidade da pessoa humana e necessita do reconhecimento de sua importância pelo poder político. Esta liberdade já despontava em nossas Constituições desde 1824. Pode ser utilizada como termômetro para avaliação do grau de democracia e cultura de um povo.

Vacinar pessoas é um grande desafio. Intolerância não é doença contagiosa, mas é contagiante. Para enfermidades ligadas aos direitos fundamentais existem remédios constitucionais. O primeiro arcabouço sustentador do direito constitucional é o princípio da legalidade. Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei.

No artigo de número 9 da Convenção Européia podemos encontrar julgados enfatizando as convicções humanas, de ordem religiosa, filosófica, moral, política, social, econômica ou científica. Esses direitos podem ser invocados individualmente ou por pessoa jurídica.

Há uma queixa (número 8282/78) que originou a Decisão de 14 de julho de 1990, onde a Comissão reconheceu que uma campanha de agitação contra uma igreja ou grupo religioso pode acarretar responsabilidade do Estado se as autoridades não tomam medidas apropriadas para lhe por fim. A casa espírita, lá nos anos dourados, teve que fazer as malas. A agressão sofrida não ganhou a mídia espírita como "a psicografia diante dos tribunais". Agora em 2005 escrevi um texto que também não foi aceito num periódico espírita - "Torres Gêmeas Afro". Nele faço um relato sobre o problema vivido pelos Umbandistas e pelos adeptos do Candomblé. Com eles também mantenho amizade, caso contrário teria que renegar muitos amores familiares, que não pensam como eu.

Na universidade fomos treinados para tudo examinar, incluindo a hipótese do absurdo. Meu laboratório, no Departamento de Patologia, funcionava como Centro de Referência do Ministério da Saúde para as Corinebacterioses. Recebemos do LACEN de Brasília uma amostra suspeita de Corynebacterium diphtheriae, agente de infecção respiratória grave no período infantil. Acontece que o bacteriologista clínico a havia isolado de líquido espermático e no nosso laboratório demonstrou grande capacidade de produzir exotoxina. Publicamos o caso nas Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. Não fosse o cuidado do LACEN a amostra teria sido referida como difteróide (aquele que parece, mas não é). Posso até parecer, mas ainda não sou.

Em matéria religiosa, para que possamos desenvolver quaisquer convicções é necessário que haja a possibilidade de comunicação com outros e conseqüentemente ter acesso a diferentes pontos de vista. Num Estado de Direito, a liberdade religiosa só tem sentido em condições de reciprocidade e o direito de igualdade pressupõe o direito à diferença (somos iguais, mas diferentes e, diferentes, mas, sobretudo, iguais)

Luiz Carlos D. Formiga

 


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Nota do Autor:

Torres Gêmeas Afro-brasileiras. Preconceito, Estigma, Mídia e Ordenamento Jurídico.

http://www.terraespiritual.locaweb.com.br/espiritismo/artigo1322.html

http://geocities.yahoo.com.br/nucleo_espirita_universitario/

http://www.morhan.org.br/

 

 


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