A diversidade
é uma realidade irremovível da Seara e seria utopia
e inexperiência tratá-la como “joio”. Imprescindível
propalar a idéia do ecumenismo afetivo entre
os seareiros, para que a cultura da alteridade seja
disseminada e praticada no respeito incondicional a todos os segmentos.
A atitude de alteridade será -- o termômetro
-- do progresso das idéias espíritas no movimento, será
o “trigo” vicejante e plenificado na ética
da fraternidade vivida. As instituições embebidas desse
espírito promoverão o diálogo franco e transparente
e construirão através das relações as
transformações. O desafio está lançado.
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Roustaing, o Termômetro e os Direitos
Fundamentais.
"o erro não se torna verdade por se
difundir e multiplicar facilmente.
Do mesmo modo, a verdade não se torna erro pelo fato de ninguém
ver".
Gandhi
Sobre Roustaing não posso
opinar. Não encontrei tempo para ler e estudar suas obras.
No entanto, isto não impede as "contaminações"
pelas amizades que tenho com pessoas dele admiradoras, aqui no Rio
de Janeiro. Tenho encontrado entre os adeptos de Roustaing pessoas
que dignificam o ser humano e com elas tenho amizade. Isso já
me rendeu boicote em casa espírita e em estação
de rádio. No entanto, acredito na pessoa humana como
investimento divino. Um dia vão mudar e me compreender.
Não sou adepto de Roustaing.
Nesse assunto sou ignorante confesso, mas tenho, eventualmente, lido
o que dizem adversários e divulgadores. Existem outros ignorantes
"confessos". São os que leram, não
entenderam e fizeram a opção pela intolerância.
Ignoram também as liberdades. Proibir uma obra é revelar
temor. Pessoas, na revolução de 64, induziram-me a ler
o Manifesto Comunista. Gostei. No entanto, gostei mais do Manifesto
do Sermão da Montanha. Na época vivenciava ambiente
conflitante, pois era espírita acadêmico de biomedicina
na Faculdade de Ciências Médicas da UEG e também
aluno-Aspirante a Oficial da Reserva do Exército (CPOR).
"Pessoas" me fazem
recordar palavras de um jurista-filósofo, membro da Academia
de Letras e reitor da USP: "o novo Código Civil começa
proclamando a idéia de pessoa e os direitos da personalidade.
Não define o que seja pessoa - o indivíduo na sua dimensão
ética, enquanto é e enquanto deve ser". Miguel
Reale leciona que "a pessoa é o valor-fonte
de todos os valores, sendo o principal fundamento do ordenamento jurídico".
Sendo objetivo digo que "uma
pessoa só tem liberdade religiosa se puder optar num ou noutro
ponto de vista, sem perder sua dignidade como cidadão. A liberdade
de crença e religião, sendo preservadas, aprimoradas
e estendidas a todos os indivíduos, trará ainda maior
evolução dos direitos e garantias individuais, que conduzem
à justiça social e à paz entre os povos".
Pessoas participaram do Encontro
de Cúpula Mundial de Líderes Religiosos e Espirituais
pela Paz Mundial e assinaram o "compromisso com
a paz global". Consideraram que as religiões têm
contribuído para a paz no mundo, mas também têm
sido usadas para criar divisão e alimentar hostilidades. Estes
participantes concordaram que em um mundo interdependente, a paz requer
concordância sobre valores éticos fundamentais. Declararam
diversos compromissos. Destacamos a determinação de
conduzir a Humanidade através de palavras e obras a um renovado
compromisso com os valores éticos e espirituais, que incluem
um profundo sentido de respeito por todas as formas de vida e pela
dignidade inerente a cada pessoa e o seu direito de viver em um mundo
livre da violência.
A revista Fraternidade (Lisboa) publica
a reportagem. Nela soubemos que assinaram o "Compromisso"
os integrantes da delegação brasileira, junto com Bawa
Jain, Secretário-Geral do "The Millennium World Peace
Summit" .
Como existem hoje no mundo muitos
conflitos, tendo como base o pensamento religioso, acreditamos ser
fundamental o respeito à liberdade de religião e o exercício
da tolerância religiosa.
A religiosidade está presente
no seio das sociedades humanas em todos os tempos. É um direito
fundamental incluído em todas as Constituições.
Situa-se no cerne das discussões sobre direitos humanos. Advoga-se
que foi a origem de todos os demais direitos, sendo consagrado por
tratados internacionais. Sua importância é inquestionável.
No passado foi palco de graves conflitos, incluindo as atrocidades
nas inquisições. Ainda hoje está presente nos
graves conflitos existentes ao redor do mundo. A paz é favorecida
através da tolerância e é de interesse de todos.
Encontramos estudos sobre a proteção
à liberdade de religião ou crença no Direito
Constitucional e Internacional. Na Declaração Universal
dos Direitos Humanos e nos Pactos Internacionais sobre direitos humanos
se proclamam os princípios da não-discriminação
e da igualdade perante a Lei e o direito à Liberdade de pensamento
e de convicção.
Importante é a luta para que
não se menospreze a violação dos direitos humanos
e das liberdades fundamentais, em especial a liberdade de religião
OU CRENÇA DE QUALQUER NATUREZA.
A expressão exterior
da liberdade religiosa é uma forma de manifestação
do pensamento (penso, logo co-existo). Nesta coexistência
vamos encontrar liberdades: a de crença; de culto e de organização.
Da liberdade de crença surge a de escolha (ou não) da
religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa,
a liberdade (direito) de mudar de religião. Há limites,
pois essa liberdade não compreende a de embaraçar o
livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença,
uma vez que esta liberdade vai até onde não prejudique
a dos outros.
Esse direito pode ser estudado nos julgados do Tribunal Europeu dos
Direitos do Homem. O artigo número 9, da Convenção
Européia dos Direitos do Homem, trata da Liberdade de pensamento,
de consciência e de religião. Diz que "qualquer
pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência
e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de
religião ou de crença, assim como a liberdade de manifestar
a sua religião ou a sua crença, individual ou coletivamente,
em público e em privado, por meio de culto, do ensino, de práticas
e da celebração de ritos".
O Decreto 678, de 06 de novembro de
1992, do Governo Brasileiro, trata do assunto com base no Direito
Constitucional Internacional, Pacto de São José da Costa
Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), ratificado
em 25 de setembro de 1992. O artigo 12 da Declaração
enfatiza o artigo número 9 acima referido, expressando o direito
de mudar de crença e consagrando os demais direitos.
As pessoas só acordam para a importância da liberdade
religiosa depois de serem alvos de alguma ameaça concreta.
Acordei quando seu Júlio, na União Espírita Suburbana,
Méier. RJ.RJ,, me contou o que religiosos fizeram com uma casa
espírita nos anos dourados (1960).
Vamos saltar aos anos 90.
Até 1992 funcionou na UFRJ
o "Grupo Jésus Gonçalves", no Centro
de Ciências da Saúde. Com Edesio (Fraternidade
André Luiz) e Paulo Hobaica (Obreiros do Bem)
fizemos muitos estudos espíritas e combatemos o leproestigma,
que assustou funcionários diante de um caso de hanseníase
(rapidamente curado) entre nós. Este grupo foi o embrião
do NEU-RJ. Promovemos um encontro que reuniu 300
pessoas, no anfiteatro nobre ("quinhentão") para
ouvir e debater o tema "Regressão de Memória".
Convidamos o jornalista Luciano dos Anjos. Surgiu
o "fogo amigo".
Ainda não sou adepto de Roustaing
e não estou preocupado em agradar a ninguém, mas registrar
o interesse pelo direito constitucional e pela liberdade de crença.
A liberdade de religião é
muito importante para a humanidade, sendo um dos pilares dos direitos
humanos e da Democracia. Sou espírita, democrata. Sei que a
democracia, como lecionava Norberta é cansativa (1990-2005),
onera o tempo, mas não me apresentaram coisa melhor. Creio
que um dos seus defeitos é não ter conseguido contornar
o poder neurótico.
A liberdade religiosa está
no cerne da problemática dos direitos humanos fundamentais.
Não existe plena liberdade cultural, nem plena liberdade política
sem liberdade religiosa. Alguns autores vão mesmo ao ponto
de ver na luta pela liberdade de religião a verdadeira origem
dos direitos fundamentais. Não se trata aí apenas da
idéia de "Ética da Tolerância"
como a declinamos para os Núcleos Espíritas
Universitários, mas da concepção da
liberdade de religião e crença, como direito inalienável
do homem, tal como veio a ser proclamado nos modernos documentos constitucionais.
Toda a doutrina, leis, declarações de direito internacional,
julgados, pareceres, notícias apontam para o respeito e a proteção
à liberdade de religião e crença como requisitos
para o exercício pleno da democracia e cidadania e ainda como
meios de combater a discriminação e a intolerância
religiosa e de crença. Na aplicação, o exercício
dessa liberdade não pode prescindir do princípio da
igualdade, pois está calcada na idéia da dignidade da
pessoa humana e necessita do reconhecimento de sua importância
pelo poder político. Esta liberdade já despontava em
nossas Constituições desde 1824. Pode ser utilizada
como termômetro para avaliação do grau de democracia
e cultura de um povo.
Vacinar pessoas é um grande
desafio. Intolerância não é doença
contagiosa, mas é contagiante. Para enfermidades ligadas
aos direitos fundamentais existem remédios constitucionais.
O primeiro arcabouço sustentador do direito constitucional
é o princípio da legalidade. Ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
da lei.
No artigo de número 9 da Convenção
Européia podemos encontrar julgados enfatizando as convicções
humanas, de ordem religiosa, filosófica, moral, política,
social, econômica ou científica. Esses direitos podem
ser invocados individualmente ou por pessoa jurídica.
Há uma queixa (número
8282/78) que originou a Decisão de 14 de julho de 1990, onde
a Comissão reconheceu que uma campanha de agitação
contra uma igreja ou grupo religioso pode acarretar responsabilidade
do Estado se as autoridades não tomam medidas apropriadas para
lhe por fim. A casa espírita, lá nos anos dourados,
teve que fazer as malas. A agressão sofrida não ganhou
a mídia espírita como "a psicografia diante dos
tribunais". Agora em 2005 escrevi um texto que também
não foi aceito num periódico espírita - "Torres
Gêmeas Afro". Nele faço um relato sobre
o problema vivido pelos Umbandistas e pelos adeptos do Candomblé.
Com eles também mantenho amizade, caso contrário teria
que renegar muitos amores familiares, que não pensam como eu.
Na universidade fomos treinados para
tudo examinar, incluindo a hipótese do absurdo. Meu laboratório,
no Departamento de Patologia, funcionava como Centro de Referência
do Ministério da Saúde para as Corinebacterioses. Recebemos
do LACEN de Brasília uma amostra suspeita de Corynebacterium
diphtheriae, agente de infecção respiratória
grave no período infantil. Acontece que o bacteriologista clínico
a havia isolado de líquido espermático e no nosso laboratório
demonstrou grande capacidade de produzir exotoxina. Publicamos o caso
nas Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. Não fosse o
cuidado do LACEN a amostra teria sido referida como difteróide
(aquele que parece, mas não é). Posso até parecer,
mas ainda não sou.
Em matéria religiosa, para
que possamos desenvolver quaisquer convicções é
necessário que haja a possibilidade de comunicação
com outros e conseqüentemente ter acesso a diferentes pontos
de vista. Num Estado de Direito, a liberdade religiosa só tem
sentido em condições de reciprocidade e o direito de
igualdade pressupõe o direito à diferença (somos
iguais, mas diferentes e, diferentes, mas, sobretudo, iguais)
Luiz Carlos D. Formiga