“Dá conta
de tua administração”,
Lucas, 16:2
A pesquisa, para alguns docentes, é atividade sublime. Como
sublime é toda religião. Emmanuel, através de
Chico Xavier, na página “Doutrina Espírita”
nos lembra que “toda religião fala de penas e recompensas.
No entanto, só a Doutrina Espírita elucida que todos
colheremos conforme a plantação que tenhamos lançado
à vida, sem qualquer privilégio na Justiça Divina.”
("Religião dos Espíritos", edição
da Federação Espírita Brasileira).
Comentamos anteriormente em “Ensino e pesquisa na universidade:
questão de lei ou de visão de mundo?” Caderno
de Pesquisa, São Paulo (69): 5-16, 1989, o valor que o binômio
ensino-pesquisa possui para uma boa parte dos professores universitários.
Mas, a pesquisa tem sido praticamente negligenciada nos orçamentos
da grande maioria das instituições de ensino superior
e, em geral, parece desempenhar papel secundário na carreira
do professor. Existe uma ênfase quase absoluta na formação
profissional, em detrimento das atividades de pesquisa, o que torna
a integração entre ensino e pesquisa bastante problemática.
São bem poucas as universidades brasileiras que têm uma
política global de pesquisa definida e clara, na qual estejam,
por exemplo, estabelecidas institucionalmente as principais linhas
de pesquisa e recursos alocados.
A organização estudantil pode parecer secundária,
mas é importante politicamente e também para o “ethos
científico”. Num bom número de universidades brasileiras
não existem Centros Acadêmicos como na UFRGS. Ali é
possível encontrar a relação de grupos de pesquisa
ativos na Faculdade.
Um dos grupos está agora estudando “Direitos Fundamentais
e Novos Direitos”. A linha de pesquisa tem por “objetivo
analisar, primeiramente, a evolução histórica,
a discussão conceitual e a positivação dos Direitos
Fundamentais ao longo da história. Num segundo momento, pretende
estudar as relações entre os Direitos Fundamentais e
a emergência dos ditos Novos Direitos, suas gerações,
a natureza jurídica e as soluções positivadas
que os ordenamentos jurídicos vem trazendo a eles” (http://www6.ufrgs.br/caar/?cat=28).
Alguns momentos históricos são importantes para que
se proceda a uma análise da pesquisa científica no cenário
acadêmico.
No Brasil, a criação da Universidade de São Paulo
em 1934 é um marco fundamental da Institucionalização
da pesquisa em uma universidade. Alguns cientistas professores da
Universidade do Brasil (em 1931) lograram obter êxito semelhante
ao que teve Carlos Chagas Filho na criação do Instituto
de Biofísica (1945). No âmbito da educação,
em 1937, já no Estado Novo, foi criado o Instituto Nacional
de Estudos Pedagógicos (INEP) e em 1951 foi criada a Comissão
de Aperfeiçoamento de Ensino Superior (CAPES). A Universidade
de Brasília foi criada em 1961 com a proposta de incorporar
a pesquisa ao ensino universitário. Em 1968, em plena vigência
do autoritarismo político a Lei da Reforma Universitária
reafirma o principio da indissociabilidade do ensino e da pesquisa.
O discurso é mais uma vez mais forte do que a concessão
de meios para efetivá-la na prática, o que demonstra
a necessidade de vontade política de proceder à institucionalização
da pesquisa.
Por outro lado, além de estar com o “pires na mão”
o docente pesquisador ainda deverá considerar a possibilidade
de encontrar desvios administrativos. Nesta hora estamos presenciando
uma crise na Universidade de Brasília, onde se suspeita que
verbas destinadas a pesquisa foram desviadas para outros fins. No
dia 8 de abril de 2008, o Ministério Público Federal
no Distrito Federal e o Ministério Público do Distrito
Federal e Territórios entraram na Justiça Federal, contra
o reitor da UNB e o Decano de Administração, com uma
ação de improbidade administrativa.
A lei preceitua positivamente a indissociabilidade entre o ensino
e a pesquisa, mas no quadro atual das instituições vigentes,
esse preceito é apenas uma indicação. Esta constatação
faz surgir questionamento no plano político e acadêmico.
Deve a pesquisa se concentrar em institutos especializados e grandes
universidades, integrados por pesquisadores produtivos e experientes,
cabendo às demais universidades e instituições
de ensino superior ocuparem-se do ensino e da profissionalização?
Ou deve a pesquisa ser encarada como uma atividade básica de
toda a universidade?
A luta pela industrialização, travada a partir dos anos
30, do século passado, e logo após a Segunda Guerra
Mundial, criou a necessidade de inovações tecnológicas
que não foram geradas a nível nacional. Hoje, a despeito
do avanço nas Ciências Biomédicas, o veterano
na Faculdade de Direito pode não ter assistido uma aula sobre
“células tronco”. No entanto, o assunto é
desafio de urgência para ministros do Supremo Tribunal Federal,
na ADI 3510, contra o artigo 5º da Lei de Biossegurança,
que permite a destruição de embriões humanos.
Por outro lado, os alunos de graduação na Faculdade
de Direito da UFRGS ao estudar as relações entre os
Direitos Fundamentais e a emergência dos Novos Direitos já
estão debruçados sobre a Bioética e o Biodireito
e ainda com possibilidade da obtenção de Bolsas de iniciação
científica: PIBIC-CNPq, BIC-Propesq, FAPERGS.
O Brasil é um país onde encontramos grandes contradições.
Nas Ciências Jurídicas discutimos ainda o que é
pesquisa em Direito e ainda estamos procurando os grandes objetivos
de pesquisa.
Assim, a história dessa possível e desejada indissociabilidade
entre o ensino e a pesquisa, ainda e por muito tempo, estará
sendo escrita em abono ou desafio à lei no cotidiano de cada
um dos docentes-pesquisadores, em cada universidade deste país.
Na Doutrina Espírita aprendemos com Emmanuel que “a fortuna
e a autoridade não são valores únicos de que
devemos dar conta hoje e amanhã. No livro Fonte Viva, o autor
espiritual nos lembra que “a oportunidade de trabalhar é
uma bênção, a possibilidade de servir é
um obséquio divino, o ensejo de aprender é uma porta
libertadora e que o tempo é um patrimônio inestimável.”
Na mesma oportunidade pergunta enfático: “que fazes dos
talentos preciosos que repousam em teu coração, em tuas
mãos e no teu caminho?”.
Mas, é no livro que referimos no primeiro parágrafo
que ele nos faz sentir o peso da administração, quando
diz: “"Espírita" deve ser o claro adjetivo
de tua instituição, ainda mesmo que, por isso, te faltem
as passageiras subvenções e honrarias terrestres. Doutrina
Espírita quer dizer Doutrina do Cristo. E a Doutrina do Cristo
é a doutrina do aperfeiçoamento moral em todos os mundos.
Guarda-a, pois, na existência, como sendo a tua responsabilidade
mais alta, porque dia virá em que serás naturalmente
convidado a prestar-lhe contas.
Luiz Carlos Formiga
http://www.jornaldosespiritos.com/2007.3/col49.22.htm