ESE, Capítulo IV, 25 e 26
Estudo apresentado na Instituição Espírita Joanna
de Angelis em 24 de maio de 2005
INTRODUÇÃO
No item 25 do Capítulo IV de O
Evangelho Segundo o Espiritismo, Kardec pergunta aos
Espíritos sobre a necessidade da encarnação e,
no item 26, comenta sobre a resposta que eles dão. É
o assunto tratado nestes itens que iremos hoje estudar.
No trecho em questão, veremos
que Kardec perguntou sobre a encarnação e os Espíritos
responderam como se ele tivesse perguntado sobre a reencarnação,
uma vez que se prenderam à intenção e não
à letra da pergunta. Para o nosso objetivo, no entanto, acreditamos
ser necessário fazer clara a distinção entre
o que seja a necessidade da encarnação
e a da reencarnação, posto que ambas
são necessárias e por diferentes razões.
Encarnar é viver em um corpo físico, não implicando
em nenhuma conotação adicional com respeito à
quantidade de vezes em que isso é possível a um único
Espírito. Quando queremos saber porque necessitamos encarnar,
nossa dúvida é quanto ao ser ou não ser possível
evoluir o tempo todo na espiritualidade, sem jamais interagir com
a matéria bruta. Já, quando falamos em reencarnar, estamos
falando sobre a necessidade do Espírito encarnar ou não
mais de uma vez. Tal questão está relacionada ao percurso
necessário para que possamos evoluir e a verificarmos se uma
única vida é tempo bastante para tal intento. Sabendo,
agora, do que vamos tratar, vamos, inicialmente, falar da necessidade
da encarnação para, somente depois, tratarmos da necessidade
da reencarnação.
A NECESSIDADE DA ENCARNAÇÃO
Não poucas vezes algum irmão nos pergunta sobre o porque
de precisarmos encarnar, uma vez que, segundo afirma, com base no
relato dos autores espirituais, tudo o que se encontra na Terra também
se encontra no plano espiritual. Lembram os irmãos que assim
pensam que, no plano espiritual, existem lares, famílias, cidades
e comunidades várias, amigos e inimigos, trabalho e repouso,
veículos, tudo, enfim, de que alguém necessita para
ter uma vida igual àquela que se passa na Terra, sendo possível
lá, como cá, praticar a reforma íntima e evoluir
pelo estudo sério e pelo trabalho caritativo dedicado e amoroso.
A resposta a tal questionamento é justamente o tema da primeira
parte deste estudo, isto é, saber qual a real necessidade da
encarnação, qual a real necessidade de vivermos em um
corpo material e de interagirmos com a matéria bruta para podermos
evoluir até a perfeição.
Se lermos com atenção a resposta que São Luiz
deu a Kardec no Item 25 de O Evangelho Segundo o Espiritismo,
veremos que ela não satisfaz a curiosidade de tais irmãos.
25. É um castigo a encarnação
e somente os Espíritos culpados estão sujeitos a sofrê-la?
A passagem dos Espíritos pela vida corporal é necessária
para que eles possam cumprir, por meio de uma ação material,
os desígnios cuja execução Deus lhes confia.
É-lhes necessária, a bem deles, visto que a atividade
que são obrigados a exercer lhes auxilia o desenvolvimento
da inteligência. Sendo soberanamente justo, Deus tem de distribuir
tudo igualmente por todos os seus filhos; assim é que estabeleceu
para todos o mesmo ponto de partida, a mesma aptidão, as mesmas
obrigações a cumprir e a mesma liberdade de proceder.
Qualquer privilégio seria uma preferência, uma injustiça.
Mas, a encarnação para todos os Espíritos, é
apenas um estado transitório. E uma tarefa que Deus lhes impõe,
quando iniciam a vida, como primeira experiência do uso que
farão do livre arbítrio. Os que desempenham com zelo
essa tarefa transpõem rapidamente e menos penosamente os primeiros
graus da iniciação e mais cedo gozam do fruto de seus
labores. Os que, ao contrário, usam mal da liberdade que Deus
lhes concede retardam a sua marcha e, tal seja a obstinação
que demonstrem, podem prolongar indefinidamente a necessidade da reencarnação
e é quando se torna um castigo. - S. Luís. (Paris, 1859.)
Ora, por que – perguntariam
eles, provavelmente insatisfeitos com a resposta de São Luís
– os desígnios de Deus hão de requerer ação
no plano material? Se, tanto a inteligência quanto a bondade,
podem ser desenvolvidos na espiritualidade, qual a necessidade de
se encarnar, qual a necessidade de se agir no plano material? Na espiritualidade
– continuariam eles - não estaríamos, também,
exercendo, a todo instante, o livre-arbítrio e nos sujeitando
todo tempo à lei da causalidade e às demais leis de
Deus? Não nos é possível, lá, tanto quanto
cá – concluiriam - fazermos uso de nosso livre-arbítrio
e de nossa força de vontade tanto para o bem quanto para o
mal?
Tentando encaminhar essa questão,
vejamos o que Kardec perguntou aos Espíritos, no desdobramento
"a" da Questão 175 de O Livro dos Espíritos:
175. Haverá alguma vantagem
em voltar-se a habitar a Terra?
"Nenhuma vantagem particular, a menos que seja em missão,
caso em que se progride aí como em qualquer planeta."
a) Não se seria mais feliz permanecendo na condição
de Espírito?
"Não, não; estacionar-se-ia e o que se quer é
caminhar para Deus."
Está aí uma afirmação
que nos interessa. Que estarão querendo dizer os Espíritos,
ao afirmarem, de modo tão peremptório, que permanecer
na espiritualidade é o mesmo que estacionar? O raciocínio
de nossos irmãos nos estava conduzindo à conclusão
contrária, não é mesmo?
Mais adiante, ainda em O Livro dos Espíritos,
Kardec continua:
196. Não podendo os Espíritos
aperfeiçoar-se, a não ser por meio das tribulações
da existência corpórea, segue-se que a vida material
seja uma espécie de crisol ou de depurador, por onde têm
que passar todos os seres do mundo espírita para alcançarem
a perfeição?
"Sim, é exatamente isso. Eles se melhoram nessas provas,
evitando o mal e praticando o bem; porém, somente ao cabo de
mais ou menos longo tempo, conforme os esforços que empreguem;
somente após muitas encarnações ou depurações
sucessivas, atingem a finalidade para que tendem."
Está mais que claro, pela Codificação,
tanto em O Evangelho Segundo o Espiritismo quanto em O
Livro dos Espíritos, que os Espíritos só
podem evoluir encarnados. Foi o que disseram os Espíritos e
o que Kardec entendeu e aceitou. Mas, por que?
A vasta obra de André Luiz,
que nos veio pela abençoada mediunidade de nosso saudoso Chico,
trouxe-nos preciosos ensinamentos de como as coisas se passam no mundo
espiritual, ensinamentos esses, mais tarde, corroborados por diversos
outros Espíritos, através de outros médiuns.
Vejamos se desse farto material, aliado às lições
que obtemos da Codificação, tiramos algum elemento que
falta ao nosso raciocínio.
O estudioso atento e que aprendeu
que a Doutrina é evolutiva, aprende, por exemplo,
que nossa real identidade no mundo espiritual é transparente,
podendo nossos inimigos de outras eras reconhecer-nos sem grande dificuldade,
ao contrário do que ocorre quando estamos encarnados, onde
uma nova personalidade nos esconde dos desafetos que nos queiram prejudicar.
Fica sabendo, também, que não há dissimulação
no plano espiritual, sendo nossos pensamentos e emoções
facilmente percebíveis por quem esteja em nossa faixa de sintonia.
Qualquer tentativa de nos reconciliarmos
com alguém a quem tenhamos prejudicado no passado incorrerá
em fracasso se estivermos no plano espiritual, uma vez que nosso medo
da reação de nossos desafetos ou nossa postura defensiva
contra sua possível vingança estarão sempre a
nos denunciar. Do mesmo modo que o cão percebe se a pessoa
perto dele está serena ou com medo, amorosa ou agressiva, reagindo
conforme tal percepção, os Espíritos desencarnados
percebem as emoções e pensamentos uns dos outros e reagem
de acordo com eles, de nada valendo o autocontrole com que qualquer
um deles tente esconder o que sente ou o que pensa dos demais.
Impossibilitados de nos reconciliar com nossos desafetos do passado
e fazendo novos desafetos a todo instante pela impossibilidade de
escondermos dos outros nossos pensamentos e emoções
a respeito deles, já não nos parece mais difícil
entender porque ficaríamos praticamente estacionados se permanecêssemos
indefinidamente no plano espiritual. Podermos evoluir envolvidos em
atividades caridosas com o apoio de Espíritos mais evoluídos,
sem dúvida. No entanto, somente conseguiríamos ajudar
os Espíritos sofredores caso esses não nos conhecessem
ou caso, apesar de nos conhecerem, nada de mal tivesse jamais ocorrido
entre eles e nós.
Por outro lado, ao encarnarmos, nos é dada uma oportunidade
toda nova de recomeço. Temos uma nova aparência, nada
lembramos de nossas vivências pretéritas e possuímos
domínio sobre o que falamos e sobre a expressão que
estampamos em nosso rosto, sendo-nos possível dissimular pensamentos
e emoções. Nossos Espíritos Protetores utilizam
tal situação para juntar, nas mesmas famílias,
nas mesmas comunidades, Espíritos que necessitam de reconciliação.
Protegidos uns dos outros pelo "disfarce" do corpo físico,
temos a oportunidade de travar novas relações com todos.
Se soubermos fazer uso dessa possibilidade, com sabedoria, não
só não mais faremos desafetos como iremos, pouco a pouco,
reparando nossos erros do passado e sublimando, em relações
de família equilibradas e amorosas, o ódio dos inimigos
figadais de outrora.
A encarnação é,
portanto, mais uma benção que recebemos
da bondade divina. Toda vida existente no universo deve ser respeitada
como tal. Porém, sabermos amar a vida onde quer que ela se
encontre pressupõe que saibamos amar a nossa própria.
Aprendamos, portanto, a amar e respeitar nosso corpo, tratando-o com
cuidado e atenção, para que, saudável, ele seja
o instrumento de nosso progresso e dos demais seres com quem nos relacionamos
na vida. Afinal, o corpo físico que ganhamos
a cada encarnação é o templo onde,
com estudo e trabalho no bem, construiremos o reino dos céus
que Jesus ensinou estar dentro de nós.
A NECESSIDADE DA REENCARNAÇÃO
Agora que já sabemos que é necessário encarnar,
viver em um corpo físico, para evoluir, resta estudarmos o
porque de necessitarmos viver em um corpo físico mais de uma
vez. A pergunta que ora se coloca, portanto, é: Qual a Necessidade
da Reencarnação?
Uma vez que acreditamos serem as
leis de Deus soberanamente justas, somos forçados
a admitir que fomos todos, sem exceção, criados no mesmo
estágio inicial, isto é, simples e ignorantes, e dotados
do mesmo potencial evolutivo, que nos levará à perfeição.
Imaginar que um de nós possa
ter sido criado sábio, belo e saudável e um outro, deficiente
mental, feio e doente, que um possa ter sido criado caridoso e gentil
e outro, perverso e violento, admitir tais possibilidades é
negar justiça nas leis divinas, o que equivale a negar a própria
divindade.
Dizemos isso com segurança, pois não pode Deus ser menos
justo que o homem. Se, mesmo a humanidade, ainda tão atrasada,
sabe ser justa nas competições esportivas, separando
cada desporto em classes e categorias, de acordo com as habilidades
atingidas pelos participantes, como poderíamos esperar de Deus
menor justiça, privilegiando a uns e prejudicando a outros
em uma disputa desigual?
Desse modo, não há como negar que somos todos criados
iguais e temos todos o mesmo destino. Resta uma questão: será
possível a um de nós evoluir do estado de simplicidade
e ignorância completas ao de perfeição moral e
intelectual em uma só existência?
As evidencias obtidas até hoje pelos paleontólogos nos
revelam que a espécie humana surgiu, há, aproximadamente,
dois milhões e meio de anos, provavelmente na África.
Mesmo se admitirmos, o que não corresponde à realidade,
que iniciamos nossa jornada no reino hominal, o bom-senso e um simples
raciocínio nos levam a concluir pela total impossibilidade
de um ser humano, no estágio desse homem primitivo, que sequer
o fogo sabia fazer, poder passar ao de um moderno gênio da ciência,
capaz de desvendar os segredos do átomo, em uma única
existência, fosse ela de 50, 70, 100 ou mesmo 1000 anos.
Supor que aquele Homo Habilis viveu uma única vida é
negar a premissa de que todo ser humano é fadado à perfeição.
Nem necessitamos ir tão longe no passado. Olhemos para nós
mesmos: quanto tempo nos falta para chegarmos ao estágio de
um Ghandi, de um Chico Xavier ou de uma Madre Tereza? Com sinceridade,
pode algum de nós ser tão ingênuo para achar que
consegue chegar lá ainda nesta vida? Não, para evoluirmos,
mesmo do estágio em que estamos neste século XXI até
à perfeição faltam milênios e esses milênios
requerem a pluralidade de existências.
O que está na origem de nossa
necessidade de reencarnar, portanto, é a Lei da Evolução.
Somos todos criados simples e ignorantes e temos todos o mesmo potencial
de evolução, tanto em bondade quanto em sabedoria. E,
ao fim da jornada seremos todos perfeitos. Não dizemos isso
por pura especulação, nem, tampouco, baseados na Codificação.
Quem nos disse que, um dia, seremos perfeitos foi Jesus, ao nos exortar:
"Portanto, sejam perfeitos
como é perfeito o Pai de vocês que está no céu".
(Mt 5,48)
PERFEIÇÃO, A NOSSA META FINAL
Tem-se escutado, quando em vez, expositores falando em uma tal "perfeição
relativa". Isso nos preocupa porque pode levar alguém
a conclusões erradas. Desse modo, vamos refletir um pouco sobre
o relativo e o absoluto.
O mecânico de automóveis
que não erra nenhum diagnóstico e que repara peças
e sistemas defeituosos de modo a que o veículo volte a funcionar
como se novo fosse, pode ser chamado de um mecânico perfeito.
O engenheiro civil que não erra nenhum cálculo, não
esquece nenhuma especificação e tudo faz em conformidade
com os melhores critérios de projeto, pode ser entendido como
um engenheiro civil perfeito. O aluno que domina todas as matérias
do Ensino Fundamental e ao qual se pode fazer qualquer pergunta desse
ciclo acadêmico sem que ele erre a resposta, pode ser chamado
de aluno perfeito do Ensino Fundamental. No entanto, se pedirmos ao
mecânico de automóveis perfeito que ele conserte um avião,
ao engenheiro civil perfeito que ele projete um circuito eletrônico
ou ao aluno perfeito do Ensino Fundamental que nos responda uma questão
do Ensino Médio, todos eles fracassarão na resposta
à nossa solicitação. Fica claro, portanto, que
cada um deles é perfeito em relação ao conhecimento
que estudou. Isso é o que se chama de "perfeição
relativa".
Um Espírito que tenha aprendido
tudo o que pode ser aprendido junto à humanidade terrestre,
pode ser dito perfeito relativamente à humanidade terrestre.
Se ele tiver aprendido tudo o que é possível aprender
nos diversos mundos do nosso sistema solar, ele poderá ser
dito perfeito relativamente ao sistema solar. É assim que iremos
evoluir, superando cada o estágio associado a cada mundo quando
pensarmos e agirmos com a perfeição relativa a cada
um.
Não podemos perder de vista, no entanto, por mais que saibamos
que, a cada estágio que superarmos, nos faremos perfeitos em
relação a ele, que a nossa meta final é a perfeição
absoluta. Atingiremos a perfeição absoluta quando nada
mais houver na criação que não saibamos, quando
tudo o que pensarmos ou fizermos em qualquer parte de qualquer universo
esteja em exata concordância com as leis de Deus. Nesse estágio
final, o relativo deixa de existir, posto que algo que seja relativo
a tudo é absoluto para tudo.
Essa perfeição
absoluta à qual um dia chegaremos é a perfeição
possível a uma criatura. Como Jesus nos ensinou a ver Deus
como Pai, de natureza, portanto, semelhante à nossa, fica claro
o que o Mestre quis dizer quando nos exortou: "...sejam perfeitos
como é perfeito o Pai de vocês que está no céu."
Seremos perfeitos ao final da jornada.
Não 'perfeitos relativos", mas, simplesmente,
"perfeitos". Como nos sabemos criaturas, não
há margem para confusão.
COMO AGE A REENCARNAÇÃO
Para avançar na senda evolutiva, temos que aprender, para aprender,
temos que vivenciar experiências variadas, para vivenciar experiências
variadas, temos que nos relacionar com a diversidade de outras criaturas
que povoam o universo.
Temos que nascer ricos para aprendermos
a usar o dinheiro visando o progresso da humanidade e não apenas
o nosso, pobres para aprendermos que nos é possível
ser úteis aos nossos irmãos, mesmo sem dispormos de
recursos materiais, bonitos para sabermos como utilizar a beleza para
influenciar os outros para o bem, com nosso exemplo de humildade e
trabalho, feios para que saibam que a feiúra não é
obstáculo às nobres ações, saudáveis
para sermos motores das grandes realizações, doentes
para mostrarmos, aos que se sentem fracos e incapazes, o quanto pode
aquele que tem força de vontade. Se reencarnarmos em uma sociedade
tranqüila, teremos muito a aprender, não mais nem menos,
porém, que se nascermos em uma sociedade em guerra ou em outra
situação calamitosa.
As características
de cada reencarnação que temos, sejam elas
raciais, familiares, econômicas, sociais ou religiosas, são
sempre as mais adequadas ao estágio de evolução
no qual nos encontramos, tendo sido cuidadosamente escolhidas pelos
nossos protetores e guias espirituais visando nosso melhor aproveitamento.
Os Espíritos evoluem através
de sucessivas vidas na carne e, por força da Lei da Causalidade,
todas as ações cometidas por eles contrárias
às Leis da Natureza farão com que vivenciem, em momentos
posteriores, situações onde terão a oportunidade
de reparar seus erros. São as chamadas expiações.
Essas oportunidades são incontáveis, de modo a respeitar
tanto a Lei da Causalidade quanto o Livre Arbítrio. Desse modo,
se uma situação de vida destinada a oferecer ao Espírito
uma oportunidade nova de reparar um erro não é aproveitada,
surgirá outra, outra e outra mais, em sucessão interminável
até que a diretriz da Lei seja cumprida e a harmonia seja estabelecida.
Outro tipo de experiência que
os Espíritos vivenciam durante sua evolução são
as chamadas provas, isto é, situações
não antes vividas onde eles terão que aplicar a sabedoria
e a bondade adquiridas até então para mostrar estarem
em condição de aproveitar as lições nelas
contidas.
Sejam provas ou expiações,
as experiências que vivemos são, antes de tudo, lições
que temos que aprender. Sempre que um método utilizado não
funcionou, novo método de ensino é aplicado até
que as lições sejam aprendidas. Não existe pecado,
não existe punição. Tal percepção
das leis de Deus é um resquício dos ensinamentos que
tivemos quando seguíamos outras religiões. O que existe
é aprendizado contínuo nos caminhos da evolução
incessante.
A REDE ESCOLAR DE DEUS
O Mestre dos Mestres costumava utilizar-se de acontecimentos do dia-a-dia,
comportamentos sociais e personagens conhecidos para, por meio de
paralelos ou alegorias, tornar a realidade espiritual compreensível
ao povo.
Utilizando o mesmo método que
Jesus usava, vamos aprofundar nosso entendimento da necessidade da
reencarnação, pensando na instituição
escolar humana, como fez o Codificador.
Antes de realizar nosso intento, porém, vamos, primeiramente,
pinçar algumas questões de O Livro dos Espíritos,
que nos ajudarão a montar nosso paralelo.
172. As nossas diversas existências
corporais se verificam todas na Terra?
Não; vivemo-las em diferentes mundos. As que aqui passamos
não são as primeiras, nem as últimas; são,
porém, das mais materiais e das mais distantes da perfeição.
177. Para chegar à perfeição e à suprema
felicidade, destino final de todos os homens, tem o Espírito
que passar pela fieira de todos os mundos existentes no Universo?
Não, porquanto muitos são
os mundos correspondentes a cada grau da respectiva escala e o Espírito,
saindo de um deles, nenhuma coisa nova aprenderia nos outros do mesmo
grau. a) Como se explica então a pluralidade de suas existências
em um mesmo globo?
De cada vez poderá ocupar
posição diferente das anteriores e nessas diversas posições
se lhe deparam outras tantas ocasiões de adquirir experiência.
Vamos, então, ao nosso paralelo.
Todos sabemos que, até a criança chegar à Universidade
há um longo caminho a percorrer e que, ao longo desse caminho,
ela pode passar por diferentes instituições.
O Universo pode ser visto, dessa forma, como uma imensa rede escolar
dirigida por Deus através de suas leis sábias e imutáveis.
O dono dessa rede é infinitamente tolerante, justo e amoroso
e não aceita nenhum outro resultado que não a formatura
com louvor de todos os alunos que nela ingressam, dando a eles infinitas
chances de recomeço. Se um deles fracassar em uma série
por displicência, ele poderá repetir o ano quantas vezes
for necessário, cada vez com alguns professores novos e outros
antigos, com alguns colegas novos e outros repetentes com ele. Se
algum não se adaptar ao método de uma escola, lhe será
permitido mudar de escola, para alguma onde se aplique metodologia
diferente daquela praticada na escola onde ele não conseguia
aprender, podendo mudar de escola de novo e mais uma vez, até
que se adapte e consiga progredir. Por mais que um aluno repita o
ano e mude de escola, o dono da rede nunca desiste de vê-lo
formado e sempre lhe oferece uma nova chance de recomeço.
As principais diferenças entre esse modelo e as instituições
humanas são o fato de nenhum aluno ser jamais expulso da rede
escolar de Deus e a certeza de que todos, sem exceção,
serão levados da creche à pós-graduação,
do estágio de simples e ignorantes ao da angelitude.
A ESCALA ESPÍRITA E A REENCARNAÇÃO
Em O Livro dos Espíritos, Parte II,
Capítulo 1, Allan Kardec apresenta a Escala Espírita,
uma classificação geral para termos uma idéia
dos estágios pelos quais passa um Espírito em evolução.
No Capítulo III de O
Evangelho Segundo o Espiritismo, Kardec classifica os
mundos habitados da seguinte forma:
Em um exercício de comparação, com base na Escala
Espírita e na Classificação dos Mundos, podemos
imaginar o seguinte enquadramento para a reencarnação
dos Espíritos, durante o estágio no Reino Hominal.

Em nosso enquadramento mostramos que Espíritos de ordem mais
elevada reencarnam em mundos menos evoluídos que os que lhes
correspondem. Tais Espíritos são os gênios das
ciências, das artes e das demais áreas do saber humano,
além dos ditos santos das diversas tradições
religiosas.
Chamamos particular atenção para os nundos primitivos,
destinados às primeiras encarnações das almas
que ingressaram no reino hominal, tornando-se Espíritos, após
a conquista da consciência moral. Nesses mundos, em nosso entendimento,
Espíritos neutros podem reencarnar para desenvolver a tendência
pelo bem. Dotados de mais conhecimento que os simples e ignorantes
eles poderão ensinar àqueles o que sabem, tornando-se
líderes de comunidades, seus sacerdotes ou conselheiros.
A EVOLUÇÃO DO PRINCÍPIO
INTELIGENTE
Até agora, por simplicidade, falamos da necessidade da reencarnação
pensando somente na fase em que estagiamos no reino hominal. A realidade,
no entanto, não se limita desse modo.
Tudo na Criação está em contínua evolução.
Evolui o Universo em sua expansão incessante, evoluem os astros,
evoluem os seres animados e os inanimados.
Diz Santo Agostinho em O
Evangelho Segundo o Espiritismo - Cap III, item 19:
"... Ao mesmo tempo em que
todos os seres vivos progridem moralmente, progridem materialmente
os mundos em que eles habitam. Quem pudesse acompanhar um mundo em
suas diferentes fases, desde o instante em que se aglomeraram os primeiros
átomos destinados e constituí-lo, vê-lo-ia a percorrer
uma escala incessantemente progressiva, mas de degraus imperceptíveis
para cada geração, e a oferecer aos seus habitantes
uma morada cada vez mais agradável, à medida que eles
próprios avançam na senda do progresso. Marcham assim,
paralelamente, o progresso do homem, o dos animais, seus auxiliares,
o dos vegetais e o da habitação, porquanto nada na Natureza
permanece estacionário. Quão grandiosa é essa
idéia e digna da majestade do Criador! Quanto, ao contrário,
é mesquinha e indigna do seu poder a que concentra a sua solicitude
e a sua providência no imperceptível grão de areia,
que é a Terra, e restringe a Humanidade aos poucos homens que
a habitam!..."
Criado simples e ignorante, mas destinado
à Angelitude, o princípio inteligente evolui em sua
longa jornada, estagiando nos diversos reinos, habitando em diversas
moradas, tornando-se mais e mais complexo, individualizando-se, conquistando
a consciência, o livre arbítrio, adquirindo sabedoria
e bondade até o potencial máximo de que foi dotado,
tornando-se, finalmente, Espírito Puro.
Quando falamos em Necessidade da Reencarnação, não
podemos nos esquecer, portanto, que nossa jornada se iniciou muito
antes de ingressarmos no reino hominal. Tudo na natureza nasce, morre
e renasce. A reencarnação é uma lei divina e
é através dela que o princípio inteligente evolui
das formas mais simples da criação às mais complexas.
Não dispomos de tempo neste estudo para explorar os mecanismos
da evolução em tempos anteriores ao ingresso no reino
hominal. Sabemos, no entanto, que os animais, plantas e minerais são
todos tão mais evoluídos e sutis quando evoluídos
e sutis são os mundos em que eles habitam. Não é
difícil, portanto, concluirmos que todos os seres vivos e inanimados
necessitam, de certa forma, reencarnar e o fazem do mesmo modo que
o homem, migrando de um mundo para outro e permanecendo maior ou menor
tempo em cada um, conforme sua necessidade de aprendizado e estágio
evolutivo.
Assim, por exemplo, ninguém deve esperar que aquele cãozinho,
inteligente e sensível, que nos faz companhia, venha a ter
uma de suas próximas reencarnações aqui na Terra
como ser humano. Não, ele não terá. Primeiro,
sua alma terá de estagiar em diversos outros mundos, adquirindo
raciocínio mais elaborado e desenvolvendo suas emoções,
até que sua consciência desperte em plenitude e ele possa,
dotado de livre arbítrio e responsabilidade, interagir de igual
para igual com outros seres do reino hominal. O ápice de sua
evolução como membro do reino animal se dará,
portanto, provavelmente, em um mundo ditoso e não em nosso
planeta de provas e expiações. Do mesmo modo, seu ingresso
no reino hominal se dará em um mundo primitivo, tampouco ocorrendo
em nosso orbe.
Se aquela alma, hoje no estágio de um cãozinho, um dia
alcançará seu hoje dono na jornada evolutiva, isso não
nos é possível saber. Cada ser evolui de forma diferente
do outro, uns acertando mais e outros menos, uns mais rápido
e, outros, mais devagar. Aquele que hoje aprende comigo poderá,
amanhã, ser meu professor.
CONCLUSÃO
Fomos criados simples e ignorantes, mas destinados à perfeição.
A Lei da Evolução rege todos os seres e todas as coisas.
Para que o princípio inteligente possa evoluir, ele necessita
ingressar na matéria e interagir com ela. O percurso evolutivo,
do átomo ao arcanjo, é imenso, impossível de
ser percorrido em uma única existência.
Estamos, talvez, a meio caminho na senda evolutiva. Se, por um lado,
nos sabemos ainda longe da perfeição, muito longe também
estamos dos seres mais simples que habitam nosso planeta. Conquistas
importantes já fizemos e, tendo-as feito, é mister que
saibamos fazer delas o melhor uso. Possuímos consciência
moral e raciocínio maduro, sendo, também, dotados de
livre-arbítrio.
Empenhemo-nos, portanto, tanto quanto nos seja possível, na
reforma íntima. Busquemos, a cada dia, sermos uma pessoa melhor
que no dia anterior. Ao final de cada dia, ao término de cada
ação, ao concluirmos cada comentário, saibamos
nos calar e refletir sobre o que dissemos, sobre o que pensamos, sobre
o que fizemos. Analisando continuamente nossos pensamentos, palavras
e obras, disciplinaremos nossa conduta para torná-la uma conduta
verdadeiramente espírita, uma conduta verdadeiramente cristã.
A evolução não é uma corrida de obstáculos,
sequer uma corrida é. No entanto, que a constação
de que temos a eternidade para evoluir não sirva para nos amolecer
o ânimo, mas, antes, como estímulo para acelerarmos a
marcha, de modo a podermos ajudar aqueles que ficaram para trás,
praticando, desse modo, a verdadeira caridade cristã.