Recordações
No poético e magnífico manual de vida que o Mestre
nos legou, chamado pela tradição de “O Sermão
da Montanha”, lembramos ter lido que, no elenco das bem-aventuranças,
Jesus nos ensinou:
“Bem aventurados os pobres de espírito,
porque deles é o reino dos céus”
Acreditando estar ouvindo tal afirmação
vinda de Jesus, nosso entendimento atual fica, de imediato, confuso.
Sem aceitar a primeira impressão que ela nos dá, recorremos
ao Aurélio e, no verbete próprio, lemos a seguinte
definição para a expressão “pobre de
espírito”:
Pobre de espírito. Pessoa simplória,
ingênua, parva, tola.
“O que é isso?”, nos perguntamos,
surpresos.? É evidente, para nós, que o Mestre dos
Mestres não estaria a dizer que o Reino dos Céus pertence
aos parvos, aos tolos ou ingênuos. Somos espíritas
e, como tal, nada deve ser aceito por nós como chega aos
nossos sentidos, sem que antes analisemos a informação
percebida usando da razão e do bom-senso. Desse modo, se
a informação que nos chega nos parece absurda, cabe
a nós investigarmos mais aprofundadamente a questão
até que o sentido se faça. Façamo-lo, pois,
sem mais delongas.
O que diz a Codificação
O Capítulo VII de O Evangelho Segundo o
Espiritismo leva o título que demos ao nosso estudo, isto
é, “Bem-aventurados os pobres de espírito”.
Como era de se esperar, dados a lógica impecável
e o bom-senso lapidar do Consolador, ele abre o capítulo
com o tema “O que se deve entender por pobres de espírito”,
iniciando seus comentários com as seguintes sábias
palavras:
“A incredulidade zombou desta máxima:
Bem-aventurados os pobres de espírito, como tem zombado de
muitas outras coisas que não compreende. Por pobres de espírito
Jesus não entende os baldos de inteligência, mas os
humildes, tanto que diz ser para estes o reino dos céus e
não para os orgulhosos”.
e os concluindo com estas, não menos sábias:
“Dizendo que o reino dos céus é
dos simples, quis Jesus significar que a ninguém é
concedida entrada nesse reino, sem a simplicidade de coração
e humildade de espírito; que o ignorante possuidor dessas
qualidades será preferido ao sábio que mais crê
em si do que em Deus. Em todas as circunstâncias, Jesus põe
a humildade na categoria das virtudes que aproximam de Deus e o
orgulho entre os vícios que dele afastam a criatura, e isso
por uma razão muito natural: a de ser a humildade um ato
de submissão a Deus, ao passo que o orgulho é a revolta
contra ele. Mais vale, pois, que o homem, para felicidade do seu
futuro, seja pobre em espírito, conforme o entende o mundo,
e rico em qualidades morais.”
A explicação de Kardec é clara
e faz total sentido, dando às palavras de Jesus o caráter
que se pode esperar delas. Fica, no entanto, a dúvida. Se
Jesus quis se referir aos humildes de espírito e aos simples
de coração, por que ele usou a expressão “pobres
de espírito” e não outra mais adequada?
Mas ... será que Jesus usou mesmo a expressão
“pobres de espírito”?
Para conferir se a expressão usada
pelo Mestre foi mesmo “pobres de espírito”, consultamos
três edições da Bíblia em Português
e uma na sua versão em Francês. Vejamos o
resultado de nossa consulta:
Recorremos, primeiramente, uma edição
feita pela Enciclopédia Barsa de uma das Bíblias católicas
mais utilizadas no Brasil, isto é, a tradução
feita pelo padre Antônio Pereira de Figueiredo no século
XVIII, com base na Vulgata Latina, tradução feita
por Jerônimo no Século V. A outra tradução
mais usada no Brasil é aquela feita pelo Padre Matos Soares,
em 1930, igualmente a partir da Vulgata latina.
Como veremos abaixo, a fala de Jesus aparece transcrita
nas traduções da Vulgata de forma idêntica a
como aparece em O Evangelho Segundo o Espiritismo. Essa constatação
confirma o que era de se esperar, isto é, que a Bíblia
em francês utilizada por Kardec era, também ela, uma
tradução da Vulgata. Dizemos isso porque a comunidade
católica, durante séculos, desde o Concílio
de Trento, em 1546, até algum tempo após 1943, ano
em que o Papa Pio XII liberou oficialmente que novas traduções
fossem feitas a partir dos originais, só tinha à sua
disposição para consulta e estudo a Vulgata ou traduções
da Vulgata para suas línguas nativas. E o que será
que diz a Vulgata?
“Bem aventurados os pobres de espírito:
porque deles é o reino dos céus”
Jesus (Mt: 5.3)
A expressão “pobres de espírito”
foi traduzida para o português como para vários outros
idiomas, tendo como base a tradução do grego existente
na Vulgata latina, feita por Jerônimo,
no final do século IV, quando os manuscritos originais hoje
disponíveis, mais antigos e confiáveis, ainda não
haviam sido encontrados. Divulgada por séculos em toda a
comunidade católica como a única versão aceita
pela Igreja, a Vulgata acabou imprimindo na memória dos milhões
de Espíritos que reencarnaram nas comunidades católicas
ao longo desse imenso período, a lembrança de Jesus
ter dito que o reino dos céus seria herdado pelos pobres
de espírito. Não é por outro motivo que muitos
estudos atuais sobre o tema, mesmo em meios espíritas, costumam
manter a tradução proveniente da Vulgata latina, ignorando
ser ela tida pelos estudiosos da Bíblia como das menos confiáveis.
A segunda Bíblia que consultamos foi uma edição
em português, pela Editora Ave Maria, da tradução
feita pelos Monges de Mardesous.
Esta tradução foi feita para o francês a partir
dos originais em hebraico e grego, tendo já contado com manuscritos
descobertos mais recentemente. Foi publicada somente em 1957. Mais
confiável, pelas razões expostas, que as traduções
feitas a partir da Vulgata, veremos que ela dá um significado
compreensível às palavras de Jesus:
“Bem-aventurados os que têm
um coração de pobre, porque deles é o reino
dos céus!”
Jesus (Mt: 5.3)
Quem tem um coração de pobre são
os humildes. E que os humildes venham a herdar o reino dos céus
faz sentido, apesar de ainda nos parecer uma afirmação
um tanto vaga para ter vindo do Mestre dos mestres. Afinal, um pobre
pode ter o coração humilde externado no seu comportamento
social, mas pode, por outro lado, ser revoltado com sua situação
e, desse modo, não possuir humildade moral.
A terceira Bíblia consultada foi uma edição
digital da chamada edição revisada de Almeida.
A tradução para o português iniciada por João
Ferreira de Almeida no século XVII não seguiu à
Vulgata, pois o autor se havia convertido à fé protestante,
tendo ele e seus sucessores se baseado nos originais em aramaico
e grego disponíveis então. A chamada “edição
revisada de João Ferreira de Almeida”, publicada em
1967, seguiu os melhores manuscritos originais hoje conhecidos,
gozando, assim, de boa consideração pelos estudiosos
atuais. A transcrição dela é a seguinte:
“Bem-aventurados os humildes de
espírito, porque deles é o reino dos céus”
Jesus (Mt: 5.3)
A expressão “humildes de espírito”
nos parece precisa, pois o adjetivo humilde, como vimos, pode ser
entendido como acanhado, tímido, mas, quando ouvimos falar
em “humilde de espírito”, sabemos
que estamos falando de uma qualidade moral e não
de um aspecto comportamental.
A Bíblia de Jerusalém,
preparada a partir dos anos da segunda guerra e que teve sua primeira
versão brasileira publicada em 1981 pela Editora Paulina,
foi por nós consultada em sua versão revisada, editada
em francês em 1973. Diz ela:
“Felizes os pobres em espírito,
pois o reino dos céus a eles pertence”
O pobre em espírito certamente é
humilde pois se sabe necessitando de ajuda para crescer. Mais que
isso, ele sabe que a ajuda que necessita é espiritual pois
é nesse aspecto que está sua pobreza. Resta certo,
portanto, que ele ora a Deus e aos bons Espíritos suplicando
tal ajuda ao mesmo tempo em que se esforça para enriquecer
seu espírito com as virtudes das quais se vê carente.
Vejamos, finalmente, o que nos ensina o Professor Pastorino
em A Sabedoria do Evangelho:
“Uma variedade imensa de traduções
tem sido dada às palavras de Mateus ptôchoi tôi
pnéumati. Vamos analisá-las. O primeiro elemento,
ptóchos, significa, exatamente, ”aquele que caminha
humilde a mendigar". Sua construção normal
com acusativo de relação poderia significar o que
costumam dar as traduções correntes: "mendigos
(pobres, humildes) no (quanto ao) espírito".
Acontece, porém, que aí aparece construído
com dativo, à semelhança de tapeinoús tôi
pnéumati (Salmo 34: 18), "submissos ao Espírito";
ou zéôn tôi pnéumati (At. 18:25), "fervorosos
para com Espírito"; ou hagía kai tôi sôrnati
kaì tôi pnéumati (1 Cor. 7:34), "santos
tanto para o corpo, como para com o espírito".
Após havermos considerando numerosas traduções,
aceitamos a que propôs José de Oiticica,
MENDIGOS DE ESPIRITO, por ser mais conforme ao
original grego, e por ser a mais lógica e racional: pois
realmente são felizes aqueles que mendigam o Espírito;
aqueles que, algemados ainda no cárcere da carne, buscam
espiritualizar-se por todos os meios ao seu alcance, pedem, imploram,
mendigam esse Espírito que neles reside, mas que tão
oculto se acha.”
Humildes de espírito, humildes em
espírito ou mendigos de espírito são
traduções que levam, em nossa opinião, ao mesmo
entendimento, pois aquele que é humilde de espírito
ou em espírito sabe-se no início da jornada e tem
consciência da ajuda que precisa da Espiritualidade, a ela
recorrendo com freqüência em suas preces.
O que Jesus quis nos ensinar, portanto, é
que o reino dos céus, aquele estado que
está no mais íntimo do nosso ser e que nós,
no mais das vezes, desconhecemos, só será
atingido pelos humildes que, com paciência e perseverança
buscam as coisas do espírito, procurando, a cada dia, sem
cessar, ser um pouco melhores que no dia anterior, aceitando as
expiações e provações por que passam
como lições a serem aprendidas, jamais se revoltando
contra a vida ou contra Deus e constantemente orando à Espiritualidade
Maior para que os ajude nessa empreitada.
Como podemos ver, mesmo com a tradução
precária que Kardec tinha nas mãos, o Codificador
soube, inspirado pela falange de Espíritos de escol, liderada
por Jesus, utilizar a razão e o bom-senso para captar a verdadeira
mensagem do Mestre.
Os Dois Caminhos da Humildade
Sabemos, da Codificação, que o Espírito
necessita evoluir em Conhecimento e Bondade para alcançar
a perfeição.
A evolução predominante em uma das
sendas evolutivas, com descaso pela outra, causa distorção,
não sendo dela que estamos falando. Espíritos que
evoluem em conhecimento, negligenciando a bondade, revelam-se como
os grandes líderes das trevas que tanto mal fazem à
humanidade antes de se darem conta de sua distorção
evolutiva e tomarem o caminho do bem. Espíritos que ignoram
a necessidade de conhecimento, julgando que, para evoluírem,
só precisam ser bons, ignoram oportunidades preciosas de
praticar o bem por serem incapazes de identificá-las, devido
à sua falta de conhecimento, até que, frustrados pelo
pouco que logram realizar, aceitam instruir-se, compreendendo que
o conhecimento é necessário para melhor praticar a
bondade para com o próximo.
Por outro lado, é de se esperar que, aquele
que evoluiu notadamente em conhecimento, mas sem deixar de evoluir
em bondade, demonstre a mesma humildade que aquele outro que tenha
evoluído de forma destacada na senda da bondade, tampouco
deixando de evoluir em conhecimento. Vejamos se é assim que
acontece.
A Humildade na Senda do Conhecimento
Sócrates, o grande pensador grego da antiguidade,
nos legou o ensinamento:
“O sábio é aquele
que sabe que nada sabe”.
A humildade é uma característica
de quem estuda muito, pois aquele que estuda pouco e fica
satisfeito, o faz por julgar que tudo sabe, ao passo que quem deseja
realmente entender um campo do saber, jamais para de estudá-lo
por perceber que, quanto mais o estuda, mais se lhe abre a compreensão
do quanto ainda falta estudar.
Isaac Newton é considerado
o Pai da Física Moderna. Incluído pela história
entre os grandes Gênios da Humanidade, quando, uma vez, o
cobriam de elogios pela sua obra, ele afirmou:
“Se pude ver mais longe é
porque me ergui sobre os ombros de gigantes.”
A humildade refletida por essa frase de Newton
está no entendimento de que ninguém, sozinho, descobre
coisa alguma, inventa nada, cria o que quer que seja. Toda conquista
do saber humano é uma obra coletiva, uns partindo de onde
outros pararam e parando onde outros irão começar.
Albert Einstein, inquestionavelmente,
o maior gênio do século XX, era, segundo aqueles que
o conheceram, totalmente imune a louvores, ofensas, sucessos ou
fracassos. Nada disso, que tanto abala a maioria dos homens, tinha
significado algum para o seu estado emocional.
A humildade de Einstein nos ensina que devemos nos
manter imperturbáveis quando em busca do saber, conscientes
de que, sempre que erramos, poderemos, mais tarde, reparar o erro
e ir e frente e que, sempre que nos elogiam ou nos ofendem, isso
em nada irá alterar para melhor ou para pior nossas chances
de obter sucesso se nos dedicarmos a tal.
Em seu exemplar de 12 de dezembro de 2004, o periódico
americano “The New York Times” trouxe a público
uma entrevista com o Professor Stephen Hawking.
Nessa entrevista, uma pergunta feita ao notável físico
inglês merece especial atenção para o proveito
de nosso estudo.
“Como podemos saber se o senhor se qualifica
como um físico genial, como invariavelmente o descrevem?”,
perguntou a entrevistadora.
Ao que o Prof. Hawking respondeu:
“A mídia tem necessidade de super-heróis
na ciência, como em todas as esferas da vida, mas o que
existe, na verdade, é uma faixa contínua
de habilidades, sem qualquer linha divisória clara.”
Aqui, vemos outro aspecto da humildade na senda
do conhecimento. Não existem gênios, pessoas medianas
e indivíduos parvos. A estratificação da raça
humana em classes é necessária para nossa melhor compreensão,
mas não corresponde à realidade. Uma faixa contínua
de habilidades, sim. Com humildade devemos perceber que, se somos
muito bons em uma área do conhecimento, nada sabemos de uma
outra que, por certo, é dominada por outra pessoa. Logo,
nem nós nem a outra pessoa somos gênios, apenas pontos
discretos num imenso mapa de saber onde se espalha toda a humanidade.
A Humildade na Senda da Bondade
Uma vez, orando fervorosamente defronte a um crucifixo
na velha capela abandonada de São Damião, na cidade
de Assis, Francisco ouviu a exortação de Jesus:
“Francisco, não vês que a minha
casa está em ruínas? Restaurá-a para mim!”.
Em sua humildade, aquele grande Espírito
pensou que o Mestre se referia à capela abandonada onde ele
estava a orar e, de pronto, com suas próprias mãos,
começou a restaurá-la. Na verdade, Jesus se referia
à Igreja como instituição, convertida que se
tinha em uma sociedade política e militar, tendo abandonado
por completo os ensinamentos que Ele nos havia trazido. Ao longo
dos anos seguintes, Francisco se engajou de corpo e alma na tarefa
de trazer essa Igreja de volta ao rumo certo. Mas o fez desposando-se
da pobreza, sempre humilde, sabendo ser a cada instante, como Jesus
nos havia ensinado:
“... aquele que dentre vós quiser ser
grande, seja o vosso servidor, e aquele que quiser ser o primeiro
dentre vós, seja o servo de todos”.
A Humildade Conquistada em Um e no Outro
Caminho São Excludentes?
A separação que fizemos entre
a humildade conquistada no caminho do conhecimento e aquela conquistada
no caminho da bondade tem o propósito, exclusivamente,
didático. Ë inconcebível que um Espírito
de grande adiantamento intelectual, que tenha chegado ao estágio
de ser humilde em relação ao seu conhecimento, se
ufane de atos de bondade que porventura pratique. Do mesmo modo,
é impensável que um Espírito seja capaz de
um imenso amor pelo semelhante sem disto se jactar e, ao mesmo tempo,
se envaideça do seu conhecimento em alguma área do
saber.
A corroborar o que acabamos de dizer, veremos, analisando
os homens da ciência citados mais acima, que os três
demonstraram evolução moral e entendimento das questões
espirituais, ingredientes suficientes para os sabermos humildes
na senda da bondade.
Segundo registra a história, Newton, na fase
mais criativa de sua produção científica, teve
sua atenção voltada para as questões espirituais.
Rejeitando os ensinamentos religiosos de então, pesquisou
obras teológicas antigas e a alquimia em busca de uma exegese
bíblica que fizesse sentido para o seu gênio inquiridor.
Tornou-se um unitariano, reedição inglesa do século
XVIII do arianismo, doutrina que negava a Trindade, pregando a unicidade
de Deus, e que havia sido condenada pelo Concílio de Nicéia,
no ano de 325. Como podemos ver, Newton tinha preocupações
de ordem espiritual. Ao longo de sua vida, ele fez o melhor que
pode para conciliar seu conhecimento científico com o entendimento
das coisas espirituais, para tanto indo buscar, na sabedoria antiga,
valores que a religião dita do Cristo há muito havia
abandonado.
Einstein procurou Deus na natureza
que, com tanto amor, ele estudou. Para ele, Deus se expressava na
natureza através de suas leis. Einstein acreditava em Deus
como a alma do Universo, sendo, por isso, julgado ateu por muitos
de seus contemporâneos, acostumados ao deus pessoal que cuida
de cada uma de nossas necessidades pessoais. Quão próximo
é esse entendimento de Einstein daquele expresso pela resposta
à primeira questão de O Livro dos Espíritos!
Uma frase magistral de Einstein precisa ser analisada
neste estudo. Disse ele uma vez: “Deus resiste aos
soberbos mas dá Sua graça aos humildes.”
Quanta sabedoria nessa frase! A experiência pessoal de cada
um de nós já nos deve ter mostrado que, quando nos
ensoberbamos, julgando que o sucesso nos será certo, devido
à nossa capacidade intelectual e dedicação,
ele nos escapa, enquanto que, nas ocasiões em que nos fizemos
humildes e, além de darmos tudo de nós, oramos pela
ajuda divina, o sucesso nos vem sem demora.
Na mesma entrevista citada mais acima, a repórter
do New York Times perguntou a Stephen Hawkin:
Você acredita em Deus?
Ao que Stephen Hawking respondeu:
Eu não acredito em um Deus pessoal.
O Prof. Hawkin, como maioria dos cientistas, sobretudo
os físicos, é um agnóstico. Isso não
impede, no entanto, que quando ele pondera sobre Deus fora da sua
atividade científica, ele o faça utilizando seu raciocínio
e o faz, como se vê, negando a possibilidade de um Deus pessoal
e mostrando, assim, estar em total sintonia com o entendimento espírita
nessa questão. Afinal, como nos ensinaram os Espíritos,
Deus é a Inteligência Suprema, Causa Primária
de Todas as Coisas. Nada pode ser tão diferente de um Deus
pessoal, não é mesmo?
Para quem tem dificuldade em ver o adiantamento
moral do Professor Hawking, basta conhecer sua figura imóvel
e contorcida, sentado em uma cadeira de rodas e falando através
de um sintetizador de voz. Acometido de uma doença neurológica
chamada de esclerose lateral amiotrópica, quando ainda na
faculdade, Hawking conta em suas biografias que
se sentiu feliz por ter escolhido física teórica como
campo de estudo, o que não lhe requereria qualquer esforço
físico. Sempre bem humorado e extremamente produtivo como
pesquisador, Hawking é uma demonstração viva
de que como é possível superar as limitações
do corpo físico e ter uma vida plena, cumprindo a missão
que se traz ao mundo.
Para melhor entendermos o porque de a humildade
intelectual e a humildade moral estarem sempre juntas, é
bom recorrermos a O Livro dos Espíritos.
Na Questão 780, Kardec perguntou aos Espíritos:
780. O progresso moral
acompanha sempre o progresso intelectual?
ao que os Espíritos responderam:
“Decorre deste, mas nem sempre o segue
imediatamente.”
Continuou o Codificador:
a) Como pode o progresso intelectual engendrar
o progresso moral?
Tendo esclarecido os Espíritos:
“Fazendo compreensíveis o bem
e o mal. O homem, desde então, pode escolher. O desenvolvimento
do livre-arbítrio acompanha o da inteligência e aumenta
a responsabilidade dos atos.”
Por último Kardec quis saber:
b) Como é, nesse caso, que, muitas
vezes, sucede serem os povos mais instruídos os mais pervertidos
também?
Tendo os Espíritos respondido:
“O progresso completo constitui o
objetivo. Os povos, porém, como os indivíduos, só
passo a passo o atingem. Enquanto não se lhes haja desenvolvido
o senso moral, pode mesmo acontecer que se sirvam da inteligência
para a prática do mal. O moral e a inteligência são
duas forças que só com o tempo chegam a equilibrar-se.”
Quem se revela humilde na senda do saber já
avançou bastante moralmente para perseguir o progresso na
senda da bondade e o faz com a humildade já conquistada.
A conquista da humildade é, portanto, o ponto
de equilíbrio entre a inteligência e a moral.
Jesus, Humilde em Espírito por
Excelência
Contam os evangelhos canônicos (Mc 10, 17
e Lu 18, 18) que, em dada ocasião, aproximou-se um jovem
de Jesus e perguntou:
“Bom Mestre, o que é preciso que eu
faça para adquirir a vida eterna?”
Ao que o Mestre respondeu:
“Por que me chamais bom? Só Deus é
bom.”
Jesus foi o exemplo maior de humildade. De Si nunca
disse nem mais nem menos do que realmente era.
Quando afirmou, conforme relata João, “Eu
sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas ovelhas”
(Jo 14, 11) ou “Eu sou o bom pastor. Conheço as minhas
ovelhas, e elas me conhecem a mim.” (Jo 14, 14), nada falava
além da verdade que tão bem conhecemos. A quantos
milhões de anos Jesus tem cuidado de nós, jamais abandonando
a uma só de suas amadas ovelhas? Mais do que o sofrimento
no Gólgota, é essa dedicação contínua
por nós que mostra o quanto Jesus tem dado a vida por nós.
E quem tem dúvida de que Jesus, ao longo desse tempo imenso,
conhece a cada um de nós na mais profunda intimidade?
Quando Jesus disse “Eu sou o caminho, e a
verdade, e a vida...” (Jo 14,6), cada atributo desses reflete
a mais pura verdade. Jesus é, de fato, o caminho, sendo por
todos sabido que quem segue os Seus passos chegará mais cedo
à perfeição. É, sem dúvida, a
verdade, uma vez que nada que saiu de Sua boca jamais deixou de
representar a verdade em sua mais pura essência. É,
sem sombra de dúvida, a vida, a verdadeira vida, pois seu
exemplo nos mostra como estar neste mundo sem a ele pertencer, como
aproveitar ao máximo o nosso potencial de “vivos”,
no entender profundo do termo, representando aqueles que despertaram
para o sentido da existência. Tudo o que Jesus disse de si
foi exatamente o que Ele é, sem aumentar nem diminuir nada.
Espírito de imensa envergadura, responsável
maior pelo nosso orbe e pela humanidade terrena, Jesus poderia ter
escolhido nascer em berço de ouro, filho, talvez, do poderoso
imperador romano. No entanto, preferiu nascer em um estábulo,
na simplicidade de uma classe humilde e em uma nação
dominada.
Questionado pelos poderosos da época quanto
ao fato de se misturar com os excluídos, chamados de pecadores
por aqueles que se julgavam sem culpa, o Mestre replicava “Os
sãos não precisam de médicos e, sim, os doentes.”
(Mt 9,12; Mc 2, 17 e Lu 5, 31). Quando queriam, ora endeusá-lo,
ora condená-lo pelos notáveis prodígios que
fazia, Ele apenas respondia que as obras que fazia era o Pai que
fazia através d’Ele, exortando-nos a fazer obras iguais
ou até maiores, como relata João (Jo 14, 12).
Toda a vida de Jesus entre nós foi uma aula
de humildade. Jesus poderia ter sido rei na Terra, mas Ele não
tinha vindo para isso. Poderia ter sido um grande rabino de seu
tempo, o maior de todos, mas não era essa a missão
a que se tinha proposto. Poderia ter sido um mago, respeitado e
temido por todos, mas tal não era a sua natureza.
Quanto mais evoluído um Espírito menos
ele valoriza seu estágio evolutivo diante dos homens, pois,
ao evoluir, todos os sentimentos ligados ao ego vão sendo
abandonados.
Aquele que se Eleva será Rebaixado
Tendo esclarecido o que o Mestre queria dizer por
Pobres de Espírito no sermão das Bem-aventuranças,
Kardec apresenta, na seqüência de O Evangelho Segundo
o Espiritismo, três passagens, que abaixo transcrevemos, realçando
a mensagem que devemos fixar:
Por essa ocasião, os discípulos se
aproximaram de Jesus e lhe perguntaram:
“Quem é o maior no reino dos céus?”
- Jesus, chamando a si um menino, o colocou no meio deles e respondeu:
“Digo-vos, em verdade, que, se não vos converterdes
e tornardes quais crianças, não entrareis no reino
dos céus. - Aquele, portanto, que se humilhar e se tornar
pequeno como esta criança será o maior no reino
dos céus - e aquele que recebe em meu nome a uma criança,
tal como acabo de dizer, é a mim mesmo que recebe.”
(Mateus, XVIII, 1 a 5.)
Então, a mãe dos filhos de Zebedeu se aproximou dele
com seus dois filhos e o adorou, dando a entender que lhe queria
pedir alguma coisa. - Disse-lhe ele: “Que queres?” “Manda,
disse ela, que estes meus dois filhos tenham assento no teu reino,
um à sua direita e o outro à sua esquerda.”
- Mas, Jesus respondeu, “Não sabes o que pedes; podeis
vós ambos beber o cálice que eu vou beber?”
Eles responderam: Podemos.” - Jesus lhes replicou: “É
certo que bebereis o cálice que eu beber; mas, pelo que respeita
a vos sentardes à minha direita ou à minha esquerda,
não me cabe a mim vo-lo conceder; isso será para aqueles
a quem meu Pai o tem preparado.” - Ouvindo isso, os dez outros
apóstolos se encheram de indignação contra
os dois irmãos. - Jesus, chamando-os para perto de si, lhes
disse: “Sabeis que os príncipes das nações
as dominam e que os grandes os tratam com império. - Assim
não deve ser entre vós; ao contrário, aquele
que quiser tornar-se o maior, seja vosso servo; - e, aquele que
quiser ser o primeiro entre vós seja vosso escravo; - do
mesmo modo que o Filho do Homem não veio para ser servido,
mas para servir e dar a vida pela redenção de muitos.”
(Mateus, XX, 20 a 28)
Jesus entrou em dia de sábado na casa de
um dos principais fariseus para aí fazer a sua refeição.
Os que lá estavam o observaram. - Então, notando que
os convidados escolhiam os primeiros lugares, propôs-lhes
uma parábola, dizendo: “Quando fordes convidados para
bodas, não tomeis o primeiro lugar, para que não suceda
que, havendo entre os convidados uma pessoa mais considerada do
que vós, aquele que vos haja convidado venha a dizer-vos:
dai o vosso lugar a este, e vos vejais constrangidos a ocupar, cheios
de vergonha, o último lugar. - Quando fordes convidados,
ide colocar-vos no último lugar, a fim de que, quando aquele
que vos convidou chegar, vos diga: meu amigo, venha mais para cima.
Isso então será para vós um motivo de glória,
diante de todos os que estiverem convosco à mesa; - porquanto
todo aquele que se eleva será rebaixado e todo aquele que
se abaixa será elevado." (Lucas, XIV, 1 e 7 a 11.)
Como o reino dos céus não se encontra
ali ou acolá, mas no mais íntimo de nós, ser
grande no reino dos céus não significa uma posição
de destaque em relação aos outros, um parâmetro
com que possamos nos avaliar melhores ou maiores que alguma outra
pessoa. Ser grande no reino dos céus é uma vitória
íntima que relaciona, entre os inimigos derrotados, o orgulho,
a vaidade, a inveja, o desdém e todos os sentimentos negativos
que nos fazem avaliar os outros com base em nós mesmos e
a nós mesmos com base nos demais.
A busca humilde do reino dos céus exige disciplina
e força de vontade. Assim, a postura que assumimos
diante dos outros deve ser objeto constante de nossa vigilância.
A postura que temos em lugar público, em nosso lar ou no
movimento espírita deve ser a de humilde servidor. Se isso
nos é difícil assumir no íntimo, que, pelo
menos, nos esforcemos para que tal seja nosso comportamento exterior.
De tanto nos disciplinarmos para não externar emoções
negativas, elas aos poucos vão desaparecendo do nosso psiquismo.
Sim, porque a vaidade e o orgulho se alimentam de elogios, agradecimentos
efusivos, comemorações. Quando não externamos
vaidade, quando não deixamos transparecer o prazer que nos
dão os elogios, as outras pessoas, aos poucos, deixam de
nos louvar as qualidades e, em persistindo nossa determinação,
com o tempo, nosso sentimento se vai modificando para melhor.
Podemos estar com o coração inflado
de orgulho pelos nossos feitos, mas, já que nossos sentimentos
se encontram camuflados em um corpo físico, saibamos usar
dessa facilidade para não externarmos nossas emoções.
Mantenhamos o rosto sereno perante elogios que se nos dirijam, evitando
responder com agradecimentos efusivos ou contestações
veementes, que, no fundo, somente realçam o que foi dito
por aquele que nos enalteceu. Se, em qualquer ocasião formos
elogiados, saibamos sorrir discretamente, fazer uma pequena mesura
com a cabeça ou algum outro gesto sutil que demonstre educação,
simpatia, mas não revele concordância com o que foi
dito e deixe claro que a manifestação não nos
perturbou.
Podemos nos considerar importantes pela nossa posição
na sociedade, mas saibamos ser gentis e prestativos para com quem
quer que seja, principalmente, porém, para com aqueles que
a sociedade vê como párias, destituídos, estropiados.
O adiantamento moral de um indivíduo não se revela
em sua indumentária, na sua profissão ou na educação
que possui. Sejamos servos de todos, dos que nos são superiores
na vida social, dos que nos são subordinados e daqueles outros
com que travamos contato ao longo da existência. Servir com
humildade não é baixar a cabeça, estar todo
o tempo a olhar para o chão, sentar sempre no canto mais
escuro e frio de uma sala. Não, servir com humildade é
manter a cabeça erguida, mas sem jamais olhar os outros de
cima para baixo. Servir com humildade é olhar nos olhos de
todos com serenidade, sejam eles os poderosos do mundo ou os mais
humildes rejeitados e, ma medida de nossas possibilidades, tudo
fazermos para ajudá-los em sua senda evolutiva. Servir com
humildade é sentar, sempre que possível, perto de
um irmão ou irmã que precise de nosso apoio, seja
na forma de um ouvido amigo a escutar suas lamentações
e a lhe aconselhar no que for possível, seja na de um companheiro
silencioso, em prece compenetrada enviando vibrações
de amor para lhe acalmar a mente confusa.
Toda vez que prestarmos um serviço fraterno
a quem quer que seja, se, no íntimo, nosso coração
aceitar o agradecimento sincero da boca do beneficiado, que nossas
palavras e a expressão de nosso rosto não traiam essa
nossa fraqueza e saibamos, sabedores da vontade do Pai, retrucar
com simplicidade: “somos nós que agradecemos pela oportunidade
de sermos úteis”. Martelemos esse entendimento em nossa
mente até que ela ali se fixe, pois ele reflete a mais pura
realidade. Cada pessoa que, aparentemente, necessita de nossa ajuda,
está, na realidade, a nos ajudar, pois é ajudando
a quem necessita que resgatamos nossas dívidas para com a
harmonia do Universo.
No movimento espírita não procuremos
um lugar de honra. Quem fica na memória do povo não
é aquele alto dirigente de grande instituição,
mas, antes, o outro, humilde trabalhador da seara de Jesus. Não
estamos falando em tese, estamos? Aprendamos com o passado para
sabermos evitar a repetição de nossos erros. Lembremo-nos
sempre do que Jesus nos ensinou:
“aquele que quiser tornar-se o maior, seja
vosso servo; e,
aquele que quiser ser o primeiro entre vós seja vosso escravo”
Mistérios Ocultos aos Doutos e
aos Prudentes
Disse, então, Jesus estas palavras: "Graças
te rendo, meu Pai, Senhor do céu e da Terra, por haveres
ocultado estas coisas aos doutos e aos prudentes e por as teres
revelado aos simples e aos pequenos." (Mateus, XI, 25.)
Na seqüência de "O Evangelho Segundo
o Espiritismo", Allan Kardec interpreta as palavras de Jesus
na passagem acima transcrita, identificando os doutos e prudentes
da fala do Mestre com os “orgulhosos, envaidecidos do seu
saber mundano, os quais se julgam prudentes porque negam e tratam
a Deus de igual para igual, quando não se recusam a admiti-lo,
porquanto, na antigüidade, douto era sinônimo de sábio”.
Mais adiante, ele, também, associa aos doutos
da fala de Jesus, os incrédulos, que exigem provas das propostas
espíritas do modo que lhes convém, jamais descendo
do pedestal a que se alçam para, humildemente, investigar
os fatos e concluírem por eles mesmos o que não aceitam
quando proveniente do raciocínio alheio. Julgam estarem corretos
pelo fato de assunto de tal importância demandar prudência.
Como se sermos prudentes significasse tudo fazermos segundo nossos
critérios, tomando os mesmos como infalíveis e aplicáveis
a quaisquer problemas.
Sejam, portanto, os que se recusam por completo
a considerar as questões espíritas ou aqueles que
apenas concedem considerá-las segundo seus critérios
de análise, todos podem ser relacionados com os doutos e
prudentes da fala do Mestre. Não é a verdade que se
esconde deles mas antes eles que, não aceitando a verdade
quando a mesma é proclamada por outros, tampouco procuram
investigar o que é afirmado, em postura orgulhosa que lhes
fecha os olhos ao saber.
No mundo atual ainda encontramos as duas espécies
de posturas mencionadas. Entre os primeiros estão, por exemplo,
os que se põem a provocar os espíritas perguntando
o porque de não se demonstrar os fatos mediúnicos
na TV. Por mais que se lhes explique que os Espíritos sérios
não se prestam a espetáculos, convidando-os a investigar
os fenômenos onde o mesmo habitualmente ocorre, fingem que
nada ouvem, repisando cansativamente na mesma tecla. No segundo
grupo vemos certos autoproclamados investigadores da parapsicologia,
que montam experiências segundo suas próprias idéias
com o intuito de provar que os fatos espíritas são
uma fraude. Ora, mesmo em se aceitando que tais experiências
sejam honestas, devemos ponderar quanto ao tipo de Espírito
que se prestará a tais experiências. Serão Espíritos
interessados na evolução humana? Pelas conclusões
a que tais pesquisadores chegam, acreditamos que não. Afinal,
se levarmos ao pé da letra tais conclusões, tudo o
que podemos aceitar como válido é matéria,
algo que a própria ciência já aceita não
corresponder à realidade.
Como pudemos ver em nosso estudo das duas sendas
da humildade, os verdadeiros sábios são humildes.
Então, que sábios são esses a quem a verdade
é ocultada? Uma breve leitura da Escala Espírita nos
fornece a resposta a essa indagação. Na Oitava Classe
da Terceira Ordem (Espíritos Imperfeitos), encontramos:
Espíritos Pseudo-Sábios - Dispõem
de conhecimentos bastante amplos, porém, crêem saber
mais do que realmente sabem. Tendo realizado alguns progressos sob
diversos pontos de vista, a linguagem deles aparenta um cunho de
seriedade, de natureza a iludir com respeito às suas capacidades
e luzes. Mas, em geral, isso não passa de reflexo dos preconceitos
e idéias sistemáticas que nutriam na vida terrena.
É uma mistura de algumas verdades com os erros mais polpudos,
através dos quais penetram a presunção, o orgulho,
o ciúme e a obstinação, de que ainda não
puderam despir-se.