Renato
Costa
> Do Materialismo Radical ao Espiritualismo Fanático
Parte
I
A Ilusão dos Sentidos e o Mundo "Real"
A Parábola da
Caverna
A Ilusão dos Sentidos é um conceito
tão antigo quanto a visita dos primeiros mensageiros divinos
ao nosso orbe terrestre, estando presente nos mais antigos ensinamentos
religiosos, os milenares Vedas, para os quais “maya”
é a ilusão de se tomar aquilo que nossos sentidos
percebem como se a realidade fosse.
No mundo ocidental, Platão colocou de forma magistral a questão
com a Parábola da Caverna, na forma de um diálogo
entre Sócrates e Glauco no livro VII da sua célebre
obra intitulada A República.
De uma forma resumida, o mundo material é retratado como
uma caverna escura onde nós, os humanos, somos representados
por prisioneiros imobilizados desde que nasceram em uma posição
tal que só lhes seja permitido olhar para uma parede. Por
trás e acima desses prisioneiros, um fogo queima a uma certa
distância. Entre as costas deles e o foco de luz existe um
caminho elevado com um muro baixo. Por sobre esse caminho e por
trás do muro passam pessoas carregando vasos, estátuas
e figuras de animais feitos de madeira e outros materiais, deixando
que apenas os objetos que carregam se sobressaiam por sobre o muro.
Algumas pessoas falam e outras não.
Os prisioneiros, podendo somente olhar para a parede à sua
frente, nada vêem além de suas próprias sombras,
das sombras dos outros prisioneiros e das sombras dos animais e
objetos carregados pelas pessoas que passam pelo caminho por trás
do muro. Como não poderia deixar de ser, o constrangimento
total dos movimentos a que estão submetidos faz com que se
identifiquem a si mesmos e uns aos outros como se suas sombras fossem
eles, isto é, suas sombras passam a ser a sua realidade individual.
Se lhes for permitido conversar entre si eles atribuirão
às sombras as vozes que ouvirem, tanto às de cada
um deles mesmo, quanto às de seus colegas. Atribuirão,
ainda, à sombra dos animais projetados as vozes das pessoas
ocultas que estiverem carregando os animais reais.
Platão supõe, então, que um dos prisioneiros
seja um dia solto e que lhe seja possível o movimento. Ao
olhar para trás pela primeira vez, seu olhar se depara com
forte claridade que se lhe afigura insuportável, impedindo
que veja com nitidez os objetos reais que passam por trás
do muro. Se uma pessoa acostumada à liberdade lhe explicar
que o que ele vê agora é que é a verdadeira
realidade, é natural que ele fique perplexo e duvide. É
igualmente natural que ele continue pensando que o que ele via antes
é mais real do que o que agora se lhe mostra.
Se lhe ocorrer olhar diretamente para a chama, seu olhar será
tão ofuscado que ele se voltará imediatamente para
a velha parede, onde a sua realidade anterior se lhe revelará
familiar e confortável. Se lhe for, então, feito sair
da caverna e mandado que olhe diretamente para o sol, sua cegueira
será total e ele não enxergará mais nada por
um longo período.
Prossegue Platão com a sua parábola, contanto como
o ex-prisioneiro vai lentamente se adaptando à claridade
e sofrendo as decorrentes transformações em seus modelos
mentais. É uma parábola interessantíssima e
que retrata com singular clareza o difícil caminho da iluminação,
do progresso espiritual.
A colocação da parábola da caverna no início
deste estudo é importante porque mostra que o que intitulamos
realidade nada mais é do que aquilo a que nossos sentidos
estão acostumados a perceber e que, por isso, se transforma
em nossos modelos mentais, a partir dos quais passamos a interpretar
tudo o quanto nos é dado observar. A verdadeira realidade,
por outro lado, extrapola em tanto a capacidade de nossos sentidos
que nossa aceitação dela é hesitante e imensamente
demorada.
Os Limites dos Nossos Sentidos
Cada ser existente no Planeta tem seus sentidos adaptados às
suas necessidades de sobrevivência no meio onde vive. O ser
humano consegue ouvir sons na faixa de 20 a 20.000 Hz e logra enxergar
na forma de luz a emissão ou a reflexão de radiação
eletromagnética entre os comprimentos de onda de 7,5 x 10-7
m (vermelho) e 4 x 107 m (violeta). Seu olfato consegue identificar
cerca de 10.000 odores distintos, podendo captar uma partícula
de substância odorífera em vários milhões
de partes de ar. Sua adaptação ao meio é notável.
No entanto, ele não possui a visão telescópica
das aves de rapina, nem a visão ultra-sônica dos morcegos
e dos golfinhos. Seu campo de visão é de cerca de
180o, em contraposição à visão de 360o
dos animais que têm olhos laterais, como os cavalos. Ao contrário
dos cavalos, entretanto, sua visão frontal é dotada
de efeito estereoscópico, dando-lhe senso de distância
e profundidade. Também diferentemente da daqueles animais,
sua visão é colorida e não em preto e branco.
O homem não é dotado da sensibilidade auditiva e olfativa
da raça canina e dos demais predadores. A vantagem competitiva
que lhe possibilitou o inquestionável domínio do Planeta
lhe foi dada pela sua maior capacidade mental.
Se todos os animais pudessem falar e se pusessem a discutir a realidade
do mundo material, teríamos uma interminável e infrutífera
disputa filosófica. O cavalo, só para citar um exemplo,
acusaria os humanos de charlatães ou sonhadores, afirmando,
com convicção (materialista) que as cores não
existem. Mais estranhamente, ainda, teria formulado uma teoria do
movimento totalmente diferente da nossa, de uma complexidade enorme,
devido à sua extrema limitação sensória
de percepção de profundidade. Qualquer singela explicação
do movimento que ouvisse de um humano, baseada na simples observação
do deslocamento por sua visão estereoscópica, pareceria
ao sábio eqüino uma invencionice infantil e indigna
de crédito. Disputas intermináveis se sucederiam sem
que uma das partes lograsse convencer a outra da sua realidade.
E, no entanto, para um observador externo, que lhes compreendesse
a todos as limitações dos sentidos, estariam todos
com razão, pelo menos com tanta razão quanto seus
sentidos lhes permitissem perceber.
Os limites impostos aos sentidos são os mais convenientes
e necessários à sobrevivência de cada espécie
viva. Se fossemos, os humanos, dotados de visão “de
raio-X”, toda a beleza estética que o indivíduo
hoje pode apreciar no elemento do sexo oposto simplesmente desapareceria,
posto que no objeto de sua observação não mais
veria que um esqueleto móvel com suas lordoses, sifoses,
escolioses e tantas outras imperfeições que a abençoada
ilusão de nossos sentidos logra esconder. Penetrando ainda
mais na intimidade da matéria, se nos supuséssemos
dotados de microscópica visão, veríamos em
nossos companheiros encarnados meros amontoados de células
em movimento. Ou, pior ainda, se aumentada a precisão, uma
colméia de intensa atividade formada de elétrons em
alucinada vibração, uma verdadeira “energia
condensada” a se mover em bloco em nossa direção
cada vez que um outro ser de nós se aproximasse.
É por essa razão que a providência Divina fez
nossos sentidos serem como são. Deixemos a palavra com Huston
Smith, o emérito professor de Religião Comparada,
em sua obra Forgotten Truth (A Verdade
Esquecida):
“Para qualquer
direção que nos voltemos, nossos sentidos nos retornam
ficções. Não é que eles não nos
informem da aparência (real) da natureza, eles são
precisamente projetados para não nos informar. Se eles nos
tivessem mostrado as coisas como realmente são, não
teríamos sobrevivido. Se percebêssemos átomos
ou quanta em lugar de carros, seríamos atropelados. Se nossos
ancestrais tivessem visto elétrons em lugar de ursos, teriam
sido devorados.”
O Meio em Que Vivemos
O século XX viu agravar a estados nunca antes alcançados
a alienação do ser humano em relação
à natureza. Em uma cidade grande como o Rio de Janeiro, quase
tudo o que nos cerca no dia a dia foi feito ou modificado pelo homem
com sua tecnologia.
Dessa forma, o contato místico que o homem sempre teve com
Deus através da natureza foi quase completamente perdido.
O homem não dorme mais quando o sol se põe, nem acorda
ao despontar da aurora. Sua vida é regida pela energia elétrica
e por despertadores. Ele não colhe seu alimento da terra
amiga nem obtém proteína animal caçando e pescando
como seus antepassados.
Simplesmente vai ao supermercado e lá encontra tudo que precisa,
cortado e embalado. Chova ou faça sol, ele tem água
para beber. Se ficar doente, não pede a Deus que o cure,
vai ao médico. Tudo à sua volta o faz crer que o mundo
foi feito pelos homens e não por uma inteligência superior,
como era evidente para os antigos. Se existe uma montanha, sempre
haverá um carro ou um teleférico para levar-nos a
seu topo.
Toda essa aparente onipotência da tecnologia nos esmaga os
sentidos a tal ponto que somente nos lembramos de Deus quando ela
falha de forma espetacular. É nas desgraças que a
espiritualidade desperta. Aí, então, nos curvamos
ao misterioso poder que nos criou e oramos.
Parte II
A Opção Materialista
A Doutrina Materialista
Em Obras Póstumas, a Doutrina Materialista
é a primeira citada entre "As Cinco Alternativas da
Humanidade".
Allan Kardec sintetiza essa doutrina do seguinte modo:
"A inteligência
do homem é uma propriedade da matéria; nasce e morre
com o organismo. O homem nada é antes, nem depois da vida
corporal."
Léon Denis, em Depois da Morte, falando sobre o
Materialismo, comenta o que essa Doutrina pensa da alma: "O
que chamamos alma, o conjunto de nossas faculdades intelectuais,
a consciência, mais não é do que uma função
do organismo, e esvai-se com a morte." Citando Karl Vogt,
pensador materialista alemão da época, ele prossegue
explicando o entendimento dos materialistas: "O pensamento
é uma secreção do cérebro. As leis da
Natureza são inflexíveis, não conhecem moral,
nem benevolência."
Como se pode observar na farta mídia hoje disponível,
o materialismo, enquanto doutrina, não tem mais a importância
que tinha ao tempo dos inícios do movimento espírita.
Na televisão, por exemplo, são vários os programas
espirituais de diversas crenças, não havendo, em contrapartida,
um só que pregue o materialismo.
A Doutrina Materialista, nascida no mundo ocidental, visava influenciar
a elite intelectual e o conseguiu. Jamais, por outro lado, logrou
convencer as massas iletradas, que, carecendo de amparo outro que
não a sua fé, jamais a esta abandonaram. Por ironia,
o próprio sucesso do Materialismo junto às elites
intelectuais fez com que ele perdesse seu apelo e se tornasse desnecessário
enquanto Doutrina.
A situação a que se chega neste final de século
XX é de uma nítida maioria de pensadores e estudiosos
que podemos chamar de materialistas “por falta de motivação”
classificação dada por Kardec, como veremos mais adiante.
Sem assumirem explicitamente o Materialismo como postura filosófica,
pois sequer dão-se conta de que o seguem, desenvolvem suas
pesquisas e apresentam seus resultados sem levar em consideração
nada além da matéria. A despeito disso, entretanto,
produzem, muitas vezes, obras interessantes e úteis para
a humanidade.
O enfoque materialista no estudo do comportamento humano resultou,
por exemplo, na interessante obra The Origins of Virtue,
de Matt Ridley, um D. Phil. em zoologia, inglês e ex-editor
americano da revista The Economist. Nessa
ricamente fundamentada e bem escrita obra, o competente autor monta
uma convincente hipótese - materialista - para a convivência
pacífica das tendências de interesse próprio
e de ajuda mútua na sociedade humana.
O materialismo na sociedade deste século é mais responsável
pelo atraso em inúmeras áreas da ciência do
que pelo pouco adiantamento moral, como se afigurava para o Codificador
no século XIX. Analisando as conseqüências do
materialismo, dizia Kardec:
"Sendo o homem apenas
matéria, os gozos materiais são as únicas coisas
reais e desejáveis; as afeições morais carecem
de futuro; os laços morais a morte os quebra sem remissão
e para as misérias da vida não há compensação;
o suicídio vem a ser o fim racional e lógico da existência,
quando não se pode esperar atenuação para os
sofrimentos; inútil qualquer constrangimento para vencer
os maus pendores; viver cada um para si o melhor possível,
enquanto aqui estiver; estupidez vexar-se e sacrificar o repouso,
o bem-estar por causa de outros, isto é, por causa de seres
que, a seu turno, serão aniquilados e que ninguém
tornará a ver; deveres sociais sem fundamento, o bem e o
mal meras convenções; por freio social unicamente
a força material da lei civil."
Talvez por razões naturais, como as detectadas por Ridley,
tudo indica que a Humanidade tem evoluído moralmente de forma
constante. Cada vez surgem mais associações humanitárias
e ecológicas. As fronteiras vão-se abrindo pelo entendimento.
A barbárie na guerra é condenada em fóruns
mundiais. A tortura e o genocídio são execrados por
todos os governos. E tudo isso, apesar do materialismo generalizado
de um mundo ocidental dominante.
As Categorias de Materialistas
Com base no que vimos até agora, podemos dizer que materialista
é alguém que vive submerso em "maya", isto
é, que crê ser real, verdadeiro, apenas aquilo que
seus sentidos logram observar.
Allan Kardec, no Capítulo III de O Livro dos
Médiuns, sempre inspirado pela falange do Espírito
da Verdade, classifica os materialistas em diversas categorias,
numa classificação válida até hoje.
Os materialistas por sistema são aqueles
que seguem uma doutrina materialista, concebida em contraposição
às doutrinas espiritualistas. Kardec, provavelmente baseado
em sua própria experiência, nos alerta quanto à
ineficácia de se tentar convencer aos extremados, obstinados
em sua posição materialista intransigente. De fato,
a postura que os radicais de qualquer natureza assumem é
de tal forma incompatível com a livre troca de idéias
que mais vale deixá-los argumentando sozinhos. Para a felicidade
humana, as doutrinas materialistas, que tiveram seu apogeu justo
na segunda metade do século XIX que viu nascer o Espiritismo,
começaram a perder fôlego com os avanços da
própria ciência que lhes havia fornecido os argumentos
iniciais. Conforme já comentamos, os materialistas por sistema,
neste final de século, são, sem sombra de dúvida,
uma classe em extinção.
Seguem-se os materialistas por falta de motivação.
Esta classe, que era muito numerosa na segunda metade do século
passado, continua a sê-lo até hoje. Têm inerente
em si o desejo de crer em algo além da matéria, não
tendo encontrado, porém, uma resposta satisfatória
aos seus desejos íntimos adormecidos. Uns por terem nascido
ou sido criados em comunidades materialistas, não tendo jamais
ouvido falar das coisas espirituais. Outros, por terem julgado inconsistentes
os ensinamentos que lhes foram ministrados. Afirma Kardec que tal
classe de materialistas recebe de boa vontade ensinamentos que lhes
pareçam racionais, como certamente há de lhes parecer
a Doutrina Espírita, por "estarem mais perto de nós
do que, por certo, eles próprios julgam". Comentamos,
mais acima, que muitos estudiosos e pesquisadores se enquadram nesta
classe. A previsão de Kardec de que eles receberiam de boa
vontade ensinamentos que lhes parecessem racionais é comprovada
pela adesão que se verifica em todo mundo ocidental de membros
da comunidade científica aos ensinamentos espiritualistas
neste final de século.
Os incrédulos por má-vontade constituem
uma categoria singular. Não são realmente materialistas.
Ocorre que a aceitação da realidade espiritual lhes
é perturbadora naquilo em que ela lhes promete cobrar o resultado
de suas ações. É uma categoria que realmente
existe até hoje. Se perguntados se crêem em Deus e
na vida espiritual, respondem contrariados. O assunto os incomoda
e constrange porque os chama a uma responsabilidade que se recusam
a aceitar. Estão, no fundo, fugindo de si mesmos. Kardec
conclui que só se pode lamentá-los. Sem querer discordar
do grande mestre lionês, entendo que eles precisam muito de
nossa oração.
Kardec cita, a seguir, "apenas por não deixar de
mencioná-la", a categoria dos incrédulos
por interesse ou de má-fé. No tempo de Kardec,
em que não havia outra chama de espiritualismo acesa na Europa,
esta classe que condenava o Espiritismo "por motivos de interesse
pessoal" era provavelmente constituída de católicos,
fervorosos ou não, que viam na oposição à
Doutrina Espírita uma oportunidade de auferirem alguma vantagem,
quer mostrando sua "erudição" científica,
quer agradando a esta ou àquela pessoa influente em suas
vidas. Pobres almas. Neste fim de século, a espiritualidade
está em tamanha expansão por todo o mundo que esta
classe também está prestes a desaparecer.
Há os incrédulos por pusilanimidade,
que é como Kardec classifica os que só aceitarão
quando virem que os outros aceitaram e que não lhes fez mal.
Penso que também se incluem nesta classe os que crêem,
mas têm medo de dizê-lo por viverem em um meio onde
ninguém fala de religião ou de espiritualidade. Julgando
serem todos à sua volta materialistas, preferem fazer com
que pensem que também o são. Se o vizinho disser a
um deles que é espírita, somente a este revelará
o que pensa e a mais ninguém. E só terá a coragem
de assumir em público sua crença após a maioria
dos que lhe cercam o tiver feito. Como lhe falta coragem, não
quer ter para si a tarefa de defender suas idéias. Tendo
as mesmas idéias que a maioria, sabe que jamais lhe será
cobrado defendê-las. Essa constatação nos permite
concluir que o espírito pusilânime que é incrédulo
em uma comunidade de incrédulos, também escolherá
ser um crente em uma comunidade de crentes. Daí termos a
certeza que esta espécie será tanto mais reduzida
quanto mais espiritualizada estiver a Humanidade.
Os incrédulos por escrúpulos religiosos,
para Kardec, o são por ignorância do que seja o Espiritismo.
Se evidamente esclarecidos quanto às bases da Doutrina, verão
que esta repousa sobre princípios fundamentais da sua religião
e que respeita todas as crenças, o que eventualmente fará
com que se desarme e se disponha a conhecê-la melhor. É
importante ressaltar que apenas as religiões que derivaram
do judaísmo discordam dos pontos fundamentais do Espiritismo.
A grande influência que o pensamento religioso oriental está
tendo, particularmente nos E.U.A., está rompendo os escrúpulos
religiosos contra o Espiritismo e facilitando sua aceitação.
Sempre sistemático, Kardec arrola, a seguir, sem maiores
comentários, os "incrédulos por orgulho,
por espírito de contradição, por negligência,
por leviandade, etc…, etc." Essa categoria poderia
ser intitulada de incrédulos diversos.
Os incrédulos por decepções
são lembrados como aqueles que "passaram de uma
confiança exagerada à incredulidade, porque sofreram
desenganos". Kardec inclui nesta categoria aqueles que
não estudaram a sério a Doutrina e que são,
portanto, facilmente ludibriados por encarnados ou desencarnados
levianos ou de má-fé, que lhes causam frustrações
tão grandes em suas ingênuas expectativas que os levam
da crença à descrença de um golpe só.
Apesar de não terem sido explicitamente citados pelo Codificador
como integrantes desta classe, entendo que também a ela pertençam
aqueles cuja crença, por demais ingênua, não
lhes permite a aceitação de revezes e provações
na vida. Frente à morte de um filho muito amado, por exemplo,
se revoltam contra sua crença e contra tudo o que ela representa.
A classe mais numerosa de todas, segundo Kardec, e que não
pode ser incluída entre as dos opositores propriamente ditos,
é a dos incertos. Diz ele que estes são
espiritualistas por princípio, tendo uma "vaga intuição
das idéias espíritas, uma aspiração
a qualquer coisa que não podem definir". Aceitarão
o Espiritismo de bom grado, por lhes trazer aquilo que internamente
almejam. O tempo se encarregou de mostrar que tal classe não
era muito numerosa na Europa do século XIX, contrariando
de forma surpreendente a percepção de Kardec. No entanto,
o mesmo tempo também soube mostrar que ele não se
enganara em relação a um outro povo, cuja cultura
religiosa, adubada pelas crenças espiritualistas vindas do
continente africano, estava pronto para receber a semente edificante
mais uma vez trazida ao mundo pelos abnegados semeadores da luz
Divina.
Parte III
A Opção Espiritualista
A Doutrina Secreta torna-se a Ciência Sagrada
Em Obras Póstumas, a Doutrina Espírita
é a quinta e última citada entre "As Cinco Alternativas
da Humanidade". Estranhamente, ao estudarmos a descrição
que Kardec faz das demais alternativas, veremos que não se
enquadram em nenhuma delas religiões importantíssimas
e milenares como o Hinduísmo, o Taoísmo e o Budismo,
Mahayana, Theravada, Tibetano e Zen. Essas nobres religiões,
seguidas por cerca da metade da Humanidade, no entanto, se enquadram
com perfeição na descrição feita por
Kardec da Doutrina Espírita.
Ora, sabemos que Espiritismo e Doutrina Espírita são
termos cunhados por Kardec que, na introdução mesma
do Livro dos Espíritos, esclarece
que "para se designarem coisas novas são necessários
nomes novos".
Teria o Codificador, tão metódico e seguro de suas
anotações, confiante na falange de escol que o assessorava,
simplesmente esquecido de criar uma classe onde coubessem os milhões
de fiéis das religiões orientais? Ou seria o caso
de ter ele consciência de que o Espiritismo representava “coisa
nova” na Europa do século XIX como uma releitura, adequada
àquela civilização mecanicista, da milenar
sabedoria oculta ou esquecida no Ocidente?
Para nos ajudar a decidir qual teria sido o entendimento do mestre
de Lion, nos reportamos a dois dos seus mais próximos e fiéis
seguidores.
Gabriel Delanne, no Capítulo I de O Fenômeno
Espírita, afirma de forma inequívoca:
"O Espiritismo é tão velho quanto o mundo".
Ora, o notável estudioso e seguidor de Kardec não
poderia fazer tal afirmação se ela não estivesse
abalizada no entendimento do Codificador. O que havia e há
de novo na Doutrina dos Espíritos é, antes de tudo,
a forma não velada, didática, sistemática e
rigorosa tão necessária ao entendimento dos ocidentais.
Que nome teria esse Espiritismo "tão velho como
o mundo" antes de Kardec ter cunhado o nome que deu à
Doutrina dos Espíritos?
Léon Denis, na parte primeira de Depois da Morte,
nos fala sobre A Doutrina Secreta, termo também utilizado
pela principal fundadora do movimento Teosófico, Helena P.
Blavatsky.
O que tanto Léon Dénis quanto Madame Blavatsky chamaram
de "A Doutrina Secreta” é
a Verdade contida no cerne de todas as religiões desde os
mais remotos tempos. Esse conteúdo da Verdade foi trazido
ao mundo desde a aurora da Humanidade por mensageiros da mais elevada
envergadura, dentre os quais Rama, Krishna, Lao-Tzu, Confúcio,
Buda e o nosso Mestre, Modelo e Irmão Maior, Jesus, figuram
entre aqueles que a história logrou registrar. A certeza
de que a vinda de tais mensageiros ao Planeta é muito mais
antiga vem da leitura das mais remotas tradições religiosas
que, há seis mil anos atrás falavam dos veneráveis
mestres de muitas eras já passadas.
Léon Denis, na obra mencionada, assim explica a Doutrina
Secreta:
"Um primeiro exame, uma comparação superficial
das crenças e das superstições do passado,
conduz, inevitavelmente, à dúvida. Mas, levantando-se
o véu exterior e brilhante que ocultava às massas
os grandes mistérios, penetrando-se nos santuários
das idéias religiosas, achamo-nos em presença de um
fato de alcance considerável. As formas materiais, as cerimônias
extravagantes dos cultos tinham por fim chocar a imaginação
do povo. Por trás desses véus, as religiões
antigas apareciam sob aspecto diverso, revestiam caráter
grave e elevado, simultaneamente científico e filosófico.
Seu ensino era duplo: exterior e público de um lado, interior
e secreto de outro, e, neste último caso, reservado unicamente
aos iniciados. Conseguiu-se, não há muito, reconstituir-se
esse ensino secreto após pacientes estudos e minuciosas descobertas
epigráficas. Desde então se dissipou a obscuridade
e a confusão que reinavam nas questões religiosas;
com a luz fez-se a harmonia. Adquiriu-se a prova de que todos os
ensinos religiosos do passado se ligam, porque, em sua base, se
encontra uma só e mesma doutrina, transmitida de idade em
idade, a uma série ininterrupta de sábios e pensadores."
A respeito do caráter
secreto de que fala Léon Denis, é digno de atenção
o fato largamente exposto nas passagens evangélicas, de que
o próprio Senhor Jesus foi claro em anunciar que expunha
a Verdade ao povo de forma velada, através de parábolas,
pois não eram eles capazes de entender a Verdade exposta
de forma clara. Por essa razão, dizia Ele, somente a seus
escolhidos, os discípulos, podia falar de maneira não
velada. Ora, quem foram, pois, os discípulos senão
"iniciados"?
Não seria, finalmente, o mito de Adão e Eva uma alegoria
para explicar que a revelação da Verdade de forma
clara ao povo ignorante teria levado o mesmo a graves equívocos
e desvios em sua rota espiritual? Não estaria na experiência
de uma Era remota a origem da cautela que os grandes mensageiros
tinham em desvelar a Verdade apenas aos que estivessem espiritualmente
preparados para compreendê-la e aplicá-la em proveito
do progresso espiritual próprio e de seus semelhantes?
O Espiritismo veio cumprir no século XIX, a promessa do Mestre
de que voltaria como Espírito da Verdade para revelar aos
homens aquilo que Ele não pudera fazê-lo.
O que fora revelado aos iniciados, uma elite escolhida, como Doutrina
Secreta, passava a ser inteligível para uma elite natural,
formada por quem quer se dispusesse à auto-instrução
e à busca do conhecimento.
Transformara-se, então, a Doutrina Secreta na Ciência
Sagrada, termo com que o iogue Swami Sri Yukteswar intitulava esse
princípio único que originou todas as religiões.
As Categorias de Crentes
Kardec, no Capítulo III de O Livro dos Médiuns,
intitulado "Do Método", descreve as categorias
dos crentes, isto é, daqueles que acreditam nos espíritos
e nas suas manifestações.
A primeira classe é a dos espíritas sem o saberem.
Kardec os define como "uma variedade, ou um matiz da classe
precedente". A classe precedente de que fala o Codificador
é a dos incertos, a última classe materialista mencionada.
Sem jamais terem ouvido falar da Doutrina Espírita ou do
Espiritualismo, eles revelam, através de suas falas ou escritos,
estarem de acordo com o conteúdo moral da Doutrina de forma
tal que quem os escuta os toma por espíritas. A nós
parece tratarem-se de espíritos que em encarnações
anteriores seguiram alguma religião ou crença espiritualista,
trazendo em sua intuição os ensinamentos passados.
As quatro categorias seguintes de crentes pertencem à classe
dos que se convenceram por um estudo direto.
Os espíritas experimentadores são
os curiosos da Ciência Sagrada. Experimentam e pesquisam tendo
a experimentação e a pesquisa como fim último.
Uma primeira impressão é de que constituam uma aberração,
um desperdício de tempo e de esforço. Se nos dispusermos
a analisá-los com benevolência, no entanto, concluiremos
que eles fazem mais mal a eles mesmos que aos outros, posto que
outros, mais conscientes que eles, poderão fazer bom uso
dos resultados por eles encontrados.
Os espíritas imperfeitos formam uma classe
interessante. O que Kardec chama de espíritas imperfeitos
são aqueles que conhecem e admiram a moral espírita
mas não a praticam, por não terem disposição
nem força de vontade para operar a necessária reforma
íntima. Infelizmente há crentes imperfeitos em todas
as religiões. Pode-se mesmo dizer que essa classe constitui
a maioria em todas elas. Na verdade, essa classe constitui uma mínima
evolução da dos incrédulos por má vontade.
Aqueles se recusavam até mesmo a estudar e discutir o assunto.
Estes já o lêem, compreendem, aceitam e discutem, mas
ainda param por aí.
Kardec chama de verdadeiros espíritas ou
de espíritas cristãos aqueles que
conhecem a moral espírita e a praticam. Conscientes do verdadeiro
objetivo da vida, aproveitam as oportunidades que se lhes são
oferecidas para granjear créditos na sua decidida marcha
em direção à casa Paterna. Para um espírita
cristão, tudo o que lhe advém, seja a provação
mais dolorida ou a mais triunfal consagração, nada
mais é do que um teste a mais a que está sendo submetido
para demonstrar sua decisão inabalável de promover
a reforma íntima necessária para encontrar o Cristo
que lhe habita a intimidade. Para dar maior abrangência ao
conceito, de acordo com a visão de que Espiritismo "é
tão antigo quanto o mundo", entendemos ser preferível
a designação de verdadeiros espíritas. Sejam
eles hinduístas, budistas, taoístas, teosofistas ou
vinculados a qualquer outra religião ou crença espiritualista,
e não cristãos, no entendimento restrito, ainda assim
serão verdadeiros espíritas se praticarem os preceitos
morais da Ciência Sagrada objetivando encontrar seu Cristo
interno, qualquer que seja o nome que Lhe dêem.
A classe extrema dos crentes é a que Kardec intitula de espíritas
exaltados. Diz ele, com muito acerto, que "em
tudo, o exagero é prejudicial". Espírita
exaltado é aquele que em tudo vê a ação
dos espíritos. Em contraste absoluto com o materialista radical,
ele é o espiritualista radical. Carecem ambos, igualmente,
de bom senso. Da mesma forma que o materialista radical é
pernicioso ao materialismo, por expor de forma grosseira seu preconceito
científico, o espiritualista radical ou espírita exaltado,
por não utilizar o crivo da razão para se assegurar
da veracidade do que vê, do que lê ou do que escuta
dizer, submete a si mesmo e ao espiritismo ao ridículo. Nossa
opinião é de que todo espírita exaltado é
um incrédulo por decepção em potencial.
Parte
IV
De que Lado Está a Ciência?
O Contexto Histórico do Século
XIX
Todo estudioso da Codificação é portador de
profunda certeza quanto à Verdade revelada nas respostas
que os Nobres Espíritos deram às perguntas existenciais
e práticas que lhes foram colocadas por Kardec e seus cultos
e dedicados colaboradores.
Entretanto, da mesma forma que ocorre a quem lê os Evangelhos
ou os livros sagrados de qualquer religião, há que
se manter atento para o contexto histórico-social em que
os temas são abordados para que se tire a correta conclusão
dos ensinamentos, sempre verdadeiros, que são
transmitidos pelos sábios que os codificaram.
Para colocar de maneira mais clara a questão, analisemos
as Perguntas 147 e 148 de O Livro dos Espíritos.
Pergunta 147:
"Por que é que os anatomistas, os fisiologistas e, em
geral, os que aprofundam a ciência da Natureza, são,
com tanta freqüência, levados ao materialismo ?"
Resposta dos Espíritos:
"O fisiologista refere tudo ao que vê, orgulho dos homens,
que julgam saber tudo e não admitem haja coisa alguma que
lhes esteja oculta ao entendimento. A própria ciência
que cultivam os enche de presunção. Pensam que a Natureza
nada lhes pode conservar oculto."
Pergunta 148:
"Não é de lastimar que o materialismo seja uma
conseqüência dos estudos que deveriam, contrariamente,
mostrar ao homem a superioridade da inteligência que governa
o mundo? Deve-se daí concluir que são perigosos?"
Resposta dos Espíritos:
"Não é exato que o materialismo seja uma conseqüência
desses estudos. O homem é que deles tira uma conseqüência
falsa, pela razão de lhe ser dado abusar de tudo, mesmo das
melhores coisas. Acresce que o nada os amedronta mais do que eles
quereriam que lhes parecesse, e os espíritos fortes, quase
sempre são antes fanfarrões do que bravos. Na sua
maioria só são materialistas porque não têm
com que encher o vazio do abismo que diante deles se abre. Mostrai-lhes
uma âncora de salvação e a ela se agarrarão
pressurosamente."
Da maneira que a pergunta 147 foi colocada, totalmente imersa no
contexto histórico do século XIX, a resposta dos Espíritos
não poderia deixar de ser igualmente imersa nesse contexto.
Os fisiologistas, naquela segunda metade do século XIX eram
materialistas. Estava a humanidade no auge do pensamento mecanicista
nas ciências físicas e sociais. O pensamento mecanicista,
materialista, que então tomou força, tinha basicamente
dois motivos. Por um lado, a ciência iniciava então
uma fase de progresso acelerado em diversos campos de investigação
da natureza, fase que perdura até hoje. A conquista rápida
de novos conhecimentos e o sucesso das tecnologias baseadas nesses
conhecimentos despertaram na comunidade científica uma sensação
de suficiência, que propagavam com desinibição.
Por outro lado, a Igreja não havia reagido com a presteza
necessária aos progressos da Ciência, fornecendo-lhes
o necessário conteúdo ético e moral, presa
que estava aos dogmas que havia instituído no passado, tomando-os
por exclusivo alicerce doutrinário e dos quais não
podia mais abdicar. O longo domínio que a Igreja viera exercendo
no campo das idéias passou a ser posto em cheque por pensadores
que viam nas conquistas da Ciência o argumento que lhes faltava
para sacudir o jugo filosófico a que se viam e à Humanidade
toda submetidos.
Vivendo dentro de tal contexto histórico, Kardec e os ilustres
estudiosos que o assessoraram não estariam em condição
de aceitar de forma racional, como faziam questão de fazer,
uma resposta dos Espíritos que negasse a influência
da ciência como combustível de um materialismo doutrinário
que se apresentava crescente e desafiador. Mesmo assim, as respostas
que os Espíritos superiores deram demonstram o cuidado com
que trataram a questão, o que bem se vê na resposta
à pergunta seguinte.
Contrariamente à de número 147, a pergunta 148 foi
proposta fora de contexto histórico, o que deu ensejo a uma
resposta clara e definitiva por parte dos nobres espíritos,
o que a anterior não tinha permitido: "Não
é exato que o materialismo seja uma conseqüência
desses estudos."
De fato, já no final do século XIX, a Ciência
começou a mostrar que havia algo além da matéria.
A Ciência no
Século XX encontra Deus e o Percebe
Por fina ironia da História, foi no mesmo século XIX,
que viu florescer o materialismo, que Maxwell, notável físico
inglês, concebeu a teoria eletromagnética, a primeira
teoria física importante a não tratar em momento algum
de matéria, mas somente de ondas, campos e forças.
A teoria eletromagnética de Maxwell, apesar de modelar entidades
percebidas pelos sentidos apenas pelos seus efeitos e não
pela sua aparência, revelou-se uma modelagem matemática
tão boa do mundo real que seu uso deu ensejo ao desenvolvimento
a uma infinidade de tecnologias sem as quais não saberíamos
como seria o mundo moderno.
Não muito mais tarde, na primeira
metade do século XX, a pesquisa científica acabou
encontrando Deus. Estudando a intimidade dos átomos, grandes
sábios, hoje considerados pais da Física Quântica,
como Heisenberg, Schrödinger e Bohr, perceberam que o que havia
de essencial no âmago da matéria que pesquisavam não
era matéria. O que eles perceberam foi a existência
de uma inteligência transcendente que criara a natureza, suas
leis e que as fazia respeitar na mais escondida intimidade da sua
criação.
Fritjof Capra, ele mesmo um físico nuclear, conta, em O Tao
da Física, como aqueles pioneiros perceberam que a milenar
sabedoria mística oriental houvera previsto pela intuição
tanta coisa que a pesquisa científica e a modelagem matemática
os permitira descobrir. Niels Bohr ficou tão fascinado por
encontrar paralelos entre as conceituações da física
quântica e as da milenar sabedoria oriental que, ao ser honrado
com titulo da nobreza pelo seu meritório trabalho científico,
escolheu para ornar seu brasão de armas o T'aichi T'u, o
hoje conhecido símbolo representativo do caráter dinâmico
do yin e do yang, encimando-o pelos dizeres em latim "Contraria
sunt Complementa", isto é, "Os contrários
se Complementam".
Albert Einstein, gênio da Ciência, tido como o mais
poderoso intelecto do século XX, ao propor a Teoria da Relatividade,
concebeu, também, a conversibilidade matéria-energia
expressa pela célebre equação e = mc2. Em uma
ocasião, falando sobre Deus, forneceu, como Kardec o fizera
cerca de um século antes, argumentos definitivos sobre a
total compatibilidade entre Ciência e Religião. Citando
dois trechos de uma entrevista que deu, poderemos ter deles uma
boa idéia.
"Não há oposição entre Ciência
e Religião. Apenas há cientistas atrasados, que professam
idéias que datam de 1880."
"Saber que realmente existe aquilo que é impenetrável
para nós, e que se manifesta como a mais alta das sabedorias
e a mais radiosa das belezas, que as nossas faculdades embotadas
só podem entender em suas formas mais primitivas, esse conhecimento,
esse sentimento está no centro mesmo da verdadeira religiosidade.
A experiência cósmica religiosa é a mais forte
e a mais nobre fonte de pesquisa científica.
Minha religião consiste em humilde admiração
do espírito superior e ilimitado que se revela nos menores
detalhes que podemos perceber em nossos espíritos frágeis
e incertos. Essa convicção, profundamente emocional,
na presença de um poder racionalmente superior, que se revela
no incompreensível universo, é a idéia que
faço de Deus."
Na área das ciências da mente, Jung foi buscar inspiração
e conhecimento prático na milenar sabedoria espiritual chinesa
e tibetana para alicerçar suas conclusões sobre a
natureza do inconsciente e de sua interação com o
consciente.
Julgamos suficientes os exemplos de Einstein, dos pais da Física
Quântica e do eminente psicólogo e psiquiatra Jung
para nos dar absoluta certeza de que o atual estágio de progresso
da Ciência em nada favorece a crença na opção
materialista. Sem dúvida alguma há cientistas materialistas,
assim como também os há espiritualistas. Hoje, no
entanto, a grande maioria dos cientistas materialistas o é
não devido ao embasamento que lhes fornece a Ciência
para tanto e sim à própria natureza especializante
que o estudo das Ciências, tanto as Físicas quanto
as Sociais, adquiriu neste século. O entendimento da espiritualidade
requer mentes abertas, largueza de raciocínio e de observação,
o que, infelizmente, não se encontra no perfil dominante
do cientista na atualidade.
A Ciência do Século
XX Começa a Provar a Existência de Deus, mesmo sem
o Saber
Quando abordamos a Doutrina Materialista, falamos de Matt Ridley
e do seu excelente The Origins of Virtue.
Nessa obra, Ridley harmoniza de forma brilhante recentes descobertas
nas áreas de genética, psicologia e antropologia,
aliadas aos resultados acumulados por exaustivas simulações
computacionais para propor que a capacidade de confiança
mútua e a disposição cooperativa são
os fatores que tornaram a comunidade humana possível, sem
o que ela já ter-se-ia extinto de há muito.
O mais surpreendente nessa conclusão de Ridley é que
ela vai de encontro à posição tradicionalmente
aceita por muitos filósofos e moralistas de que o egoísmo
e o comportamento anti-social inerentes a uma postura competitiva
pela sobrevivência sejam tendências naturais e que as
boas ações entre as pessoas requeiram educação
e sacrifício. A lei natural, conforme demonstra Ridley, diz,
isto sim, que as comunidades que sobrevivem são justo aquelas
cujos membros cooperam entre si.
Terá sido por mera coincidência que todos os grandes
mensageiros bateram na mesma tecla "Ame a teu próximo
como a ti mesmo"? Existe receita mais simples de cooperação
mútua?
Ridley demonstrou de forma científica que é a lei
natural que nos diz que devemos ser cooperativos e não a
moral dos homens. O que ele não disse é quem fez a
lei natural, por não ser tal achado o objetivo de seus estudos.
Quem admite, no entanto, que não possa haver uma lei sem
que alguém a haja criado, não pode senão atribuir
a autoria da lei natural à misteriosa inteligência
superior a que se convencionou chamar de Deus.
Não podemos deixar de mencionar, no contexto do encontro
da Ciência com Deus, a realidade com que a astrofísica
se depara neste final de milênio. Junto com a física
quântica e, ao contrário das demais ciências
humanas, a astrofísica sonda o limiar da matéria.
Enquanto a física quântica se depara com o materialmente
inexplicável no estudo do infinitamente pequeno, a astrofísica
comprova a existência do invisível na pesquisa do infinitamente
grande. Para justificar a força gravitacional existente no
limite das galáxias, os modelos matemáticos disponíveis
requerem que seja aceita a existência de uma quantidade de
massa no universo imensamente maior que a observável. Estima-se
que de 90 a 99% do universo seja invisível aos nossos mais
sofisticados instrumentos de observação. E mais, os
cientistas supõem que, mesmo quando o homem houver inventado
instrumentos capazes de trazer à luz essa “matéria
escura”, ainda então não lhe será possível
observar os pacotes de ondas que dão origem às partículas.
A Ciência astrofísica não só está
comprovando a existência do invisível como, mais que
isso, que o visível deriva do invisível, isto é,
que lhe precede.
Para concluir, vejamos uma outra pesquisa científica, esta
absolutamente materialista, porém fadada a demonstrar de
forma inquestionável, talvez no início do século
XXI, a existência da alma. Estamos falando, naturalmente,
da clonagem, particularmente na de seres humanos.
Muitos governos, motivados por preocupações mais econômicas
e geopolíticas do que morais, têm-se colocado contrários
às experiências de clonagens de seres humanos. A preocupação
com a questão, quando externada por pessoas religiosas, no
entanto, nos tem parecido extremamente incoerente.
A clonagem de seres humanos, longe de ser um desafio a Deus ou algo
do gênero, nada mais será que uma maneira de provar,
de forma irrefutável, a existência da alma. Duas pessoas
geneticamente idênticas, uma sábia e amorosa e a outra
ignorante e perversa. Haverá prova melhor?
Utilizamos essas duas pesquisas para mostrar que o encontro da ciência
com a religião nos parece eminente. As oportunidades de progresso
que a Ciência tem perdido em suas diversas especialidades,
por ignorar a realidade espiritual, dão uma boa dimensão
da alavancagem que esse tão esperado encontro propiciará
ao progresso do conhecimento humano.
Parte V
Conclusão
- Nesses mais de quatro séculos de liderança
do mundo ocidental sobre o Planeta os valores religiosos dogmáticos
foram sendo solapados no seio das comunidades, culminando no século
XIX com o apogeu do materialismo.
A situação em que se encontrava o progresso humano
na segunda metade do século XIX dava a impressão de
que a espiritualidade havia entrado em franco declínio com
o avanço do materialismo como postura filosófica da
humanidade.
Neste final de século XX, no entanto, vê-se uma situação
totalmente diversa. É o materialismo que entra em declínio,
enquanto o espiritualismo em seus diversos matizes avança
sobre corações e mentes no mundo ocidental.
Será a história cíclica, como afirmam o hinduísmo
e as tradições xamanísticas de todos os povos
primitivos? Será a atual espiritualização do
mundo ocidental uma mera reação emocional ao final
do milênio que se avizinha? Será, enfim, mais uma evidência
de que a Humanidade se acha em contínua evolução?
Qualquer que seja o motivo para a atual fase de crescimento da espiritualidade,
uma conseqüência é certa: o efeito avalanche que
tornou, no século XIX, o mundo ocidental predominantemente
materialista se repetirá no século XXI, desta vez
no sentido contrário, tornando-o predominantemente espiritualista.
As razões que nos levam a tal conclusão se encontram
nas classificações de materialistas e espiritualistas.
Quanto aos materialistas e incrédulos, eis o que podemos
esperar:
- os materialistas por sistema ou materialistas
radicas, hoje já quase desaparecidos, terão sua extinção
brevemente concretizada pelos avanços da própria ciência
que lhes forjou a doutrina;
- os incrédulos incertos, os incrédulos
por escrúpulos religiosos e os materialistas por falta de
motivação terão todos farta documentação
espiritual à sua disposição e um número
cada vez maior de pessoas espiritualizadas em todos os meios sociais
e na elite intelectual a servirem de testemunho quanto à
seriedade da proposta espiritualista;
- os incrédulos pusilânimes, camaleões
como sempre, adquirirão a coloração do meio
onde vivem e trabalham. Tornando-se esse meio predominantemente
espiritualista, espiritualistas se farão de pronto;
- os incrédulos por interesse ou má-fé
se verão cada vez mais acuados em guetos intelectuais onde
o livre pensar permaneça proibido;
- os incrédulos por decepções
tenderão a desaparecer, à medida que as noções
espiritualistas passarem a ser ensinadas em todos os lares, nas
instituições de ensino e discutidas na mídia,
dando a eles o esclarecimento necessário para não
se iludirem quanto à razão de suas provações
e desditas;
- quanto aos incrédulos que intitulamos
de diversos, esses sempre existirão, posto que constituirão
a necessária exceção que se contrapõe
a qualquer regra.
O que ocorrerá com as diversas classes de espiritualistas?
- os espíritas (apenas) experimentadores tenderão
a desaparecer, à medida que os necessários experimentos
se incorporarem à ciência e passarem a ser desenvolvidos
em meios acadêmicos predominantemente espiritualistas;
- os espíritas imperfeitos, como Espíritos
imperfeitos que são, continuarão existindo, em sua
lenta mas sempre progressiva caminhada em direção
à luz. Ocorrerá, no entanto, que esta classe aumentará
de forma considerável, tornando-se a classe predominante
da Humanidade, uma vez que para ela convergirão, em um primeiro
momento, a maioria dos efetivos hoje pertencentes às classes
de incrédulos e materialistas. Ressalvas ficarão mormente
por conta dos incrédulos por falta de motivação
dotados "de bom coração". Estes, uma vez
convictos da realidade espiritual, tornar-se-ão naturalmente
verdadeiros espíritas;
- os espíritas exaltados ou radicais,
que no século XX estiveram sujeitos ao freio do materialismo
ainda dominante na ciência, tornar-se-ão cada vez mais
raros, à medida que a própria ciência passar
a incorporar em seu arcabouço conceitual sólidas conclusões
comprobatórias da espiritualidade.
Se, ao cabo da avalanche espiritualista
que se inicia teremos uma Humanidade melhor, é fato de difícil
previsão.
Desde os primórdios da civilização conhecida
até o recente século XVIII a Humanidade era predominantemente
espiritualista. Composta, contudo, de uma enorme maioria de espiritualistas
imperfeitos e de uma reduzida elite de iluminados que tinham acesso
à Doutrina Secreta, seu avanço moral em nada sobrepujava
aquele do materialista século XIX.
Um aspecto, portanto, diferencia a espiritualidade que se espera
para o século XXI da que houve em séculos anteriores.
Desta vez a espiritualidade estará de braços dados
com a ciência. A Doutrina Secreta, convertida em Ciência
Sagrada, estará ao alcance de todos, tanto nos meios de comunicação
quanto nos ambientes acadêmicos.
Será concretizado o grande temor dos Mestres do passado,
não sabendo a Humanidade aproveitar para o bem o conhecimento
espiritual adquirido? Ou será diferente desta vez e a Terra,
nosso querido planeta azul, palco de milenares dramas de provação,
logrará, enfim, cumprir seu destino de mãe amorosa
e justa, conduzindo seus filhos em direção à
luz?
Bibliografia Consultada
1. Platão. The Republic. tradução
para o inglês feita por Benjamin Jowette disponibilizada no
site "Read Plato" no endereço Internet
http://www.geocities.com/Athens/Academy/3963/books/republic.htm.
2. Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos. 77a ed., FEB, Brasil,
1997
3.______, ____. O Livro dos Médiuns. 61a ed., FEB, Brasil,
1995
4.______, ____. Obras Póstumas. 25a ed., FEB, Brasil, 1990
5. Muraro, Rose M. e Cintra, Frei Raimundo. As Mais Belas Orações
de Todos os Tempos, 14a ed., Rosa dos Tempos, Brasil, 1996.
6. Capra, Fritjof. O Tao da Física. 17a ed., Cultrix, Brasil,
1996.
7. _____, ____ . O Ponto de Mutação. 17a ed., Cultrix,
Brasil, 1996.
8. Smith, Huston. Forgotten Truth. Harper-Collins, E.U.A., 1992.
9. Maddox, John. O Que Falta Descobrir. Campos, Brasil, 1999.
10.Denis, Léon. Depois da Morte. 9a ed., FEB, Brasil,?.
11.Delanne, Gabriel. O Fenômeno Espírita. 3a ed., FEB,
Brasil, 1977.
12.Andréa, Jorge. Psicologia Espírita. 1a ed., F.
V. Lorenz, Brasil, 1991.
13.Yukteswar, Swami Sri. The Holy Science. 8a ed., Self-Realization
Fellowship, EUA, 1990.
14.Blavatsky, H. P. The Secret Doctrine. Transcrição
de H. P. Blavatsky And Her Writings no endereço Internet
http://www.theosophical.org/hpb.html.
15.Ridley, Matt. The Origins of Virtue. 1a ed., Viking Penguin,
EUA, 1997.
Nota: A ordem da Bibliografia
adotada corresponde àquela com que a bibliografia foi consultada
no decorrer deste trabalho, não se prendendo quer à
importância das fontes que a qualquer outro critério
de avaliação.
Fonte: Estudo apresentado
na Instituição Espírita Joanna de Angelis em
Junho de 2000
http://www.ieja.org/portugues/p_materialismoeespiritualismo.doc
http://aeradoespirito.sites.uol.com.br/A_ERA_DO_ESPIRITO_-_Portal/ARTIGOS/ArtigosGRs/DO_MAT_RAD_AO_ESP_FAN_RC.html
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