“Mais forte do que o destino é a
cegueira dos que não querem ver!”
Antígona, de Sófocles
Dez de dezembro de 2008 marca os 60
anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o
primeiro tratado mundial destinado a promover e defender os princípios
básicos dos direitos humanos, prerrogativa dos indivíduos
de todas as nações. Proclamado em São Francisco
da Califórnia, na assembléia Geral das Nações
Unidas, o documento foi assinado pelo Brasil, logo de sua instituição.
Foi ele o primeiro mecanismo a buscar uma universalização
de conceitos jurídico-sociais a fim de garantir, para a posteridade,
a negociação política capaz de evitar conflitos
de caráter mundial como as duas primeiras guerras, a segunda
em especial.
Segundo vários autores, a concepção “internacional”,
mundializada dos Direitos Humanos, segundo alguns autores, têm
origens nas remotas democracias gregas, expressa nos chamados Direitos
da Cidadania. Assim, os primeiros direitos humanos teriam sido os
direitos civis e políticos, mesmo considerando a relativa limitação
de acesso àqueles que, originariamente, não eram considerados
cidadãos.
O fato é que, com a evolução do pensamento individual
e coletivo, traduzido nas organizações sociais e nas
legislações, permeado pelos esforços de mentes
despertas que idealizaram e construíram movimentos reivindicatórios,
em todas as Sociedades, foi possível engendrar um documento
com amplitude planetária visando diminuir as diferenças
sociais e dotar povos e nações de adequados instrumentos
de promoção e defesa dos chamados direitos fundamentais
da pessoa humana, sem que isso representasse a erradicação
de modelos governamentais despóticos, reducionistas e ditatoriais,
em dados momentos e lugares do Planeta.
Isto porque, conforme recente diagnose da Anistia Internacional, 60
anos depois de a Declaração Universal dos Direitos Humanos
ter sido adotada pelas Nações Unidas, muitas pessoas
ainda são torturadas ou maltratadas em, pelo menos, 81 dos
países do Globo; submetidas a julgamentos injustos em 54 países;
e, não têm direito de livre manifestação
em 77. As marcas do nosso tempo e do nosso mundo, hoje, assim, são:
injustiça, desigualdade e impunidade, infelizmente.
Deste modo, os governos que representam as Sociedades precisam investir
na diminuição das distâncias entre meras promessas
e desempenho efetivo, e os Estados devem deixar a cômoda, inerte
e silente posição de “mero árbitro social”,
tornando-se efetivo promotor e defensor dos direitos sociais, econômicos
e culturais, sem exceção. Reconhecer os direitos inerentes
ao ser humano não é atitude suficiente para garantir
o seu pleno exercício (individual e/ou coletivo), sobretudo
em relação àqueles que estejam em posições
subalternas, alijados dos processos e estruturas sociais.
Para o jusfilósofo italiano Norberto Bobbio “[...] o
processo de democratização que é o caminho da
paz perpétua no sentido kantiano da expressão, não
pode avançar sem uma gradativa ampliação do reconhecimento
e proteção dos direitos do homem”. Esta ampliação
se iniciou, sem dúvida, com a promulgação da
Declaração Universal, a partir da qual a Humanidade
passou a “[...] ter a certeza histórica de que a humanidade
– toda a humanidade – partilha de alguns valores comuns”,
conforme acentua Bobbio.
Sob o viés espírita, a materialização
de instrumentos legais voltados à promoção/garantia
dos direitos fundamentais da pessoa humana atendem ao contido no item
795, de O Livro dos Espíritos: “À proporção
que os homens foram compreendendo melhor a justiça, indispensável
se tornou a modificação delas. Quanto mais se aproximam
da vera justiça, tanto menos instáveis são as
leis humanas, isto é, tanto mais estáveis se vão
tornando, conforme vão sendo feitas para todos e se identificam
com a lei natural”.
Esta “melhor compreensão da justiça” resulta
do aperfeiçoamento individual de inúmeros seres, em
face dos processos reencarnatórios e se reflete diretamente
na teia social, em face dos exemplos, das ações e das
teorias que, a partir das individualidades mais “despertas”
vão sendo construídos. Bobbio, inclusive, corrobora
esta idéia: ”A efetivação de uma maior
proteção dos direitos do homem está ligada ao
desenvolvimento global da civilização humana”.
Vale, ainda, recordar por oportuno a conceituação espiritual
da categoria “justiça”, assim tracejada na obra
pioneira (questão 875): “A justiça consiste em
cada um respeitar os direitos dos demais”, quando, em verdade,
não há qualquer distinção possível
entre os “demais”, já que tal vocábulo designa
todos os Espíritos, sem distinção. Ora, se não
respeito (individual ou socialmente) qualquer indivíduo –
no plano encarnado, sobretudo – ainda não compreendo
em realidade a extensão da Justiça Divina, aplicada
ao plano material, em meus atos.
Por fim, todos devemos aderir à idéia do engajamento
pessoal na promoção e defesa dos Direitos Humanos, especialmente
aqueles que, na condição de operadores jurídicos,
tenham como premissa básica de sua atuação à
defesa incondicional dos direitos e garantias, ocupando-se, primordialmente
com a ampliação do acesso ao Direito e à Justiça.
E que, como espíritas, igualmente nos portemos como seres inconformados
com a injustiça que, próximo ou distante de nós,
ainda exista e subsista.
Neste dia e nos vindouros, que nossa reflexão seja subsidiada
pela ação efetiva nesse sentido!