Um esclarecimento: Escrevo esta coluna
de acordo com os comentários sobre ela, principalmente dos
novos leitores de O TEMPO que não param de surgir.
Tertuliano, o grande gênio da teologia do cristianismo primitivo,
Doutor da Igreja, desencarnou em 220, antes, pois, do Concílio
de Niceia (325), que criou o dogma da divinização de
Jesus, abrindo, assim, as portas para a criação de outro,
o do Espírito Santo e, consequentemente, para o da Santíssima
Trindade.
Montano, um ex-sacerdote frígio da deusa romana Cibele, converteu-se
ao cristianismo. Mas em 170, defendeu a doutrina da atuação
perpétua do Espírito Santo ou o Paráclito. A
Igreja condenou essa doutrina. É que ela ainda não tinha
uma ideia decisiva sobre o Espírito Santo e a Santíssima
Trindade. E Tertuliano acabou tornando-se herege, por ter aderido
a essa doutrina de Montano.
Nessa época, pois, já se falava no Espírito Santo
(“penuma hagion”) do Velho Testamento e do Novo, mas não
com o sentido do dogma da Terceira Pessoa da Santíssima Trindade,
que respeitamos, mas que é um assunto polêmico, exatamente
porque não está de acordo com o sentido originário
do Espírito Santo bíblico.
Os tradutores da Bíblia procuraram adaptar o Espírito
Santo ao do dogma trinitário. E um dos recursos mais usados
para isso foi trocar o artigo indefinido “um” pelo artigo
definido “o” (“ho”). Assim, onde na Bíblia
está “um espírito santo”, foi traduzido
para “o Espírito Santo”.
No original é “um” espírito santo, porque
cada alma ou espírito, que está animando o corpo de
cada um de nós, é “um” espírito santo
e não “o” Espírito Santo trinitário.
São Jerônimo, na Vulgata Latina, até preferiu
usar, no lugar de um espírito santo, “um espírito
bom” (“spiritus bonus”). Também alguns tradutores
colocam o artigo definido “o”, mas entre parênteses,
exatamente porque ele não está no original grego. (Para
quem quiser ver mais detalhes sobre esse assunto, há vários
livros, inclusive o meu: “A Face Oculta das Religiões”,
que está sendo lançado também em inglês,
nos Estados Unidos).
O Espírito Santo bíblico é a alma ou o espírito
de cada um de nós. Por isso, dizemos que ele é como
se fosse um substantivo coletivo, pois designa todos os espíritos
humanos, inclusive o de Jesus. Muitos teólogos até dizem
que o chamado Batismo no Espírito Santo é, na verdade,
em Jesus. Sim, porque Jesus é um Espírito Santo verdadeiro.
É o Espírito Santo humano por excelência, pois
abaixo do Espírito Santo de Deus, Ele é o maior, pelo
menos de nosso mundo terreno, do qual Ele é o Criador e Chefe.
“Nele, com Ele e por Ele”, todas as coisas foram feitas.
E eis três exemplos bíblicos de que o Espírito
Santo é realmente cada um de nossos espíritos, ou conjunto
de todos os espíritos humanos, criaturas imortais criadas por
Deus:
“Nosso corpo é santuário
do (de um) Espírito Santo” (1
Coríntios 6: 19);
“Então o povo se lembrou
dos dias antigos do tempo de Moisés, e disse: Onde está
aquele que fez subir do mar o pastor do seu rebanho? Onde está
o que pôs nele o seu Espírito Santo?” (Isaias
63: 11); e
“Envias o teu Espírito,
eles são criados, e assim renovas a face da terra.”
(Salmo 104: 30)
Observe-se que, no último exemplo,
o espírito enviado é mesmo o espírito santo do
indivíduo, e não o Espírito Santo de Deus, que
é o que envia!