Alexandre
Cumino
> Ramatis e a Umbanda

Ramatis é o nome da entidade,
de origem oriental, que psicografava por Hercílio Maes, tinha
uma proposta espírita/kardecista, no entanto por abordar questões
como a Magia (Magia de Redenção), a Vida no Planeta
Marte, a Vida de Jesus (O Sublime Peregrino) e a Umbanda tornou-se
um autor polêmico no meio espírita, aceito apenas por
adeptos menos ortodoxos.
É o mesmo caso da obra de Rochester, na pena da médium
russa Wera Krijanowskaia, final do séc. XIX, que enfrenta a
mesma polêmica por adentrar o mundo do fantástico e da
magia.
No Livro dos Espíritos Kardec é
claro no que se refere a magia como vemos abaixo:
551. Pode um homem mau, com
o auxilio de um mau Espírito que lhe seja dedicado, fazer
mal ao seu próximo?
“Não; Deus não o permitiria.”
553. Que efeito podem produzir as fórmulas e prática
mediante as quais pessoas há que pretendem dispor do concurso
dos Espíritos?
“O efeito de torná-las ridículas, se procedem
de boa-fé. No caso contrário, são tratantes
que merecem castigo. Todas as fórmulas são mera charlatanaria.
Não há palavra sacramental nenhuma, nenhum sinal cabalístico,
nem talismã, que tenha qualquer ação sobre
os Espíritos, porquanto estes só são atraídos
pelo pensamento e não pelas coisas materiais.”
a) – Mas, não é exato que alguns Espíritos
têm ditado, eles próprios, fórmulas cabalísticas?”
Efetivamente, Espíritos há que indicam sinais, palavras
estranhas, ou prescrevem a prática de atos, por meio dos
quais se fazem chamados conjuros. Mas, ficai certos de que são
espíritos que de vós outros escarnecem e zombam da
vossa credulidade.”
Se para o Espiritismo radical estes autores não se enquadram
inteiramente na codificação de Kardec, onde a magia
é colocada de lado, no entanto foram lidos e apreciados por
umbandistas, que sempre buscaram explicações para sua
religião e sua magia á luz do Espiritismo.
Numa outra oportunidade podemos analisar a magia de Ramatis e Rochester,
aqui vamos buscar algumas considerações de Ramatis sobre
a Umbanda na obra Missão do Espiritismo, concluída em
1967, onde tece elucidações sobre o Espiritismo em comparação
com outras religiões e filosofias.
O maior de todos os capítulos é justamente dedicado
a Umbanda, com 69 páginas (Rio
de Janeiro: Ed. Livraria Freitas Bastos, 1996).
Vejamos algumas destas considerações feitas por Ramatis
lembrando que ele escreve à partir de sua época e contexto:
A Umbanda é como um
grande edifício sem controle de condomínio, onde cada
inquilino vive a seu modo e faz o seu entulho! Em conseqüência,
o edifício mostra em sua fachada a desorganização
que ainda lhe vai por dentro! As mais excêntricas cores decoram
as janelas ao gosto pessoal de cada morador; ali existem roupas
a secar, enfeites exóticos, folhagens agressivas, bandeiras,
cortinas, lixo, caixotes, flores, vasos, gatos, cães, papagaios
e gaiolas de pássaros numa desordem ostensiva. Debruçam-se
nas janelas criaturas de toda cor, raça, índole, cultura,
moral, condição social e situação econômica,
enquanto ainda chega gente nova trazendo novo acervo de costumes,
gostos, temperamentos e preocupações, que em breve
tentam impor aos demais.
Malgrado a barrafunda existente, nem por isso é aconselhável
dinamitar o edifício ou embargá-lo, impedindo-o de
servir a tanta gente em busca de um abrigo e consolo para viver
a sua experiência humana. Evidentemente, é bem mais
lógico e sensato firmar as diretrizes que possam organizar
a vivência proveitosa de todos os moradores me comum, através
de leis e regulamentos formulados pela direção central
do edifício, e destinados a manter a disciplina, o bom-gosto
e a harmonia desejáveis! (p.130-132)
É provável que
alguns entendidos do hermetismo egípcio e da escolástica
hindús pretendam provar que a atual doutrina umbandística
provenha diretamente do sentido original e iniciático de
Umbanda, como a “Lei Maior Divina” subentendida nas
velhas iniciações. Mas a verdade é que entre
os africanos, a sonância de tal palavra nada tinha de iniciática
ou significação de legislação cósmica;
porém, abrangia a vulgaridade das práticas mediúnicas
fetichistas, no intercâmbio ritualístico com espíritos
primários e elementais da natureza, assim como toda sorte
de sortilégios, crendices e cultos aos mortos!
(...) Assim, as relações
mediúnicas com espíritos de índios, caboclos,
pretos e congêneres, nas prática ritualísticas
dos terreiros e conhecidas como de Umbanda, só significam
seita, doutrina ou movimento religioso com atividades mediúnicas
de origem africana, num sentido exclusivamente benfeitor e oposto
ao que se presume ser Quimbanda!
Apesar do louvável empenho dos umbandistas em atribuírem
a origem de sua seita a fontes iniciáticas do Egito, da Caldéia
ou da Índia, o certo é que a doutrina de Umbanda,
atualmente praticada no Brasil, deriva fundamentalmente do culto
religioso da raça negra da velha África. Os seus princípios
doutrinários não se vinculam à magia ou escolástica
de qualquer ramo iniciático ou bastardo das religiões
e cultos egípcios, hindus, caldaicos, assírios ou
gregos. Eles são realmente frutos do “folclore”,
dos provérbios, aforismos, das lendas, crenças populares,
canções e tradições do negro africano.
O vínculo do negro persiste implacável, apesar da
penetração do branco e das tentativas dos ocidentais
considerarem a Umbanda uma seita exclusivamente originária
de antigas confrarias do Oriente.(p.136)
Indubitavelmente, a Umbanda,
como seita, ainda não passa de uma aspiração
religiosa algo entontecida, mas buscando sinceramente uma forma
de elevada representação no mundo. Não apresenta
uma unidade doutrinária e ritualística conveniente,
porque todo “terreiro” adota um modo particular de operar
e cada chefe ou diretor ainda se preocupa em monopolizar os ensinamentos
pelo crivo de convicção ou preferência pessoal.
Mas o que parece um mal indesejável, é conseqüência
natural da própria multiplicidade de formas, labores e concepções
que se acumulam prodigamente no alicerce fundamental da Umbanda!
Aqueles que censuram essa instabilidade muito própria da
riqueza e variedade de elementos formativos umbandísticos,
são maus críticos, que devido à facilidade
de colherem frutos sazonados em numa laranjeira crescida, não
admitem a dificuldade do vizinho ainda no processo de semeadura!(p.130)
(...) Apesar dessa aparência
doutrinária heterogênea, existe uma estrutura básica
e fundamental que sustenta a integridade da Umbanda, assim como
um edifício sob a mais flagrante anarquia dos seus moradores
mantém-se indestrutível pela garantia do arcabouço
de aço!
Da mesma forma, o edifício da Umbanda, na Terra, continua
indeformável em suas “linhas mestras”...(p.131)
(...) Os mentores da Umbanda, no
momento, preocupam-se em eliminar as práticas obsoletas,
ridículas, dispersivas e até censuráveis, que
ainda exercem os umbandistas alheios aos fundamentos e objetivo
espiritual da doutrina. Sem dúvida, uns adotam excrecências
inúteis e abusivas no rito e características doutrinárias
de Umbanda, por ignorância, alguns por ingenuidade e outros
até por vaidade ou interesse de impressionar o público!
Inúmeras prática que, de inicio, serviram para dar
o colorido doutrinário, já podem ser abolidas em favor
do progresso e higienização dos “terreiros”!(p.132)
Esta é a palavra de Ramatis, direta e franca sob o seu ponto
de vista, escrito na década de 60, ainda hoje encontramos muito
o que ele critica na postura do umbandista e faço crer que
estamos caminhando para uma melhora no sentido de entender o que é
e como praticar a Umbanda.
Muito provavelmente não vamos caminhar para uma unidade doutrinária
de Umbanda, no entanto é possível caminharmos para uma
conscientização do que é a pratica de Umbanda.
O Consenso da data de 15 de Novembro de 2008 como centenário
da Umbanda já apresenta um grande progresso, pois possibilita
remontar a história material da Umbanda no Brasil, independente
de suas origens culturais, espirituais e míticas.
Já não se fala mais em seita ou movimento umbandista,
a Umbanda é uma religião concreta, nova e brasileira.
Assim como o cristianismo tem vários segmentos cristãos
(Catolicismo, Luteranismo, Metodista, Presbiteriano, Pentecostal etc.)
a Umbanda também tem linhas doutrinárias variadas que
muitas vezes se definem como Umbanda Branca, Umbanda Esotérica,
Umbanda Trançada, Umbanda de Caboclo e outras, no entanto existe
o que Ramatis chamou de estrutura básica e fundamental que
sustenta a integridade da Umbanda que é em si a essência
da Umbanda, onde se alicerçam os estudos Teológicos
de Umbanda como ponto de partida ou paradigma para entender suas várias,
outras, expressões.
A imagem acima
foi retirada do site:
http://www.imagick.org.br/pagmag/turma2/mRamatis.jpg
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