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Dâmocles conselheiro da corte de Dionísio, o Velho, tirano
de Siracusa, século IV a.C, célebre ao longo da história,
pelo lendário episódio da Espada de Dâmocles,
que se tornou uma expressão que significa perigo iminente ou
os riscos inerentes a posição de mando. Relatado por
Marcus Tullius Cicero (106 a.C. - 43 a.C.) , em Tusculanae disputationum (1),
libri III, 45 a.C, e por outros clássicos, o acontecimento
é resumido assim:
Era uma vez, um rei tirano chamado
Dionísio, monarca de Siracusa, a cidade mais rica da Sicília.
Vivia num palácio cheio de requintes e de coisas bonitas, atendido
por uma criadagem sempre disposta a fazer-lhe às vontades.
Naturalmente, por ser rico e poderoso, muitos siracusanos invejavam-lhe
a sorte. Dâmocles estava entre eles. Era dos melhores amigos
de Dionísio e dizia-lhe freqüentemente.
- Que sorte a sua! Você
tem tudo que se pode desejar. Só pode ser o homem mais feliz
do mundo!
Dionísio foi ficando cansado de ouvir esse tipo de conversa.
- Ora essa! Você acha mesmo que eu sou mais feliz do que todo
mundo?
O amigo respondeu:
- Mas é claro! Olhe só o seu tesouro e todo o seu
poder! Você não tem absolutamente nada com que se preocupar.
Poderia sua vida ser melhor do que isso?
- Talvez você queira trocar de lugar comigo - disse Dionísio.
- Ora, eu nem sonharia com uma coisa dessas! Mas se eu pudesse ter
sua riqueza e desfrutar de todos esses prazeres e da posicäo
de comando por um dia apenas, não desejaria felicidade maior.
- Pois bem! Troque de lugar comigo por um dia apenas e desfrute
disso tudo.
E então, no dia seguinte, Dâmocles foi levado ao palácio
e todos os criados reais lhe puseram na cabeça as coroas de
ouro. Ele sentou-se à mesa na sala de banquetes e foi-lhe servida
lauta refeição. Nada lhe faltou ao seu bel-prazer. Havia
vinhos requintados, raros perfumes, lindas flores e música
maravilhosa. Recostou-se em almofadas macias. Sentiu-se o homem mais
feliz do mundo.
- Ah, isso é que é
vida! - confessou a Dionísio, que se encontrava sentado à
mesa, na outra extremidade. - Nunca me diverti tanto.
De repente Dâmocles enrijeceu-se
todo. O sorriso fugiu-lhe dos lábios e o rosto empalideceu.
Suas mãos estremeceram. Esqueceu-se da comida, do vinho, da
música. Só quis saber de ir embora dali, para bem longe
do palácio, para onde quer que fosse. Pois havia observado
que pendia bem acima de sua cabeça uma espada, presa ao teto
por um único fio de crina de cavalo. A lâmina brilhava,
apontando diretamente para seus olhos. Ele foi se levantando, pronto
para sair correndo, mas deteve-se tremendo que um movimento brusco
pudesse arrebentar aquele fiozinho fino e fizesse com que a espada
lhe caísse em cima. Ficou paralisado, preso ao assento.
- O que foi, meu amigo? - perguntou
Dionísio - Parece que você perdeu o apetite.
- Essa espada! Essa espada! - disse o outro, num sussurro - Você
não está vendo?
- É claro que estou. Vejo-a todos os dias. Está sempre
pendendo sobre minha cabeça e há sempre a possibilidade
de alguém ou alguma coisa partir o fio. Um dos meus conselheiros
pode ficar enciumado do meu poder e tentar me matar. As pessoas
podem espalhar mentiras a meu respeito, para jogar o povo contra
mim. Pode ser que um reino vizinho envie um exército para
tomar-me o trono. Ou então, posso tomar uma decisão
errônea que leve à minha derrocada. Quem quer ser tirano,
ocupar as primeira posições e controlar a ferro e
fogo tudo e todos precisa estar disposto a aceitar esses riscos.
Eles vêm junto com o poder, percebe?
- É claro que percebo! - disse Dâmocles - Vejo agora
que eu estava enganado e que você tem muitas coisas no que
pensar além de sua riqueza, fama e posição.
Por favor, assuma o seu lugar e deixe-me voltar para a minha modesta
casa.
Até o fim de seus dias, Dâmocles
não voltou a querer trocar de lugar com o rei tirano, nem por
um momento sequer.
Essa lenda grega é muito singular
e se encaixa como uma luva em algumas passagens do Evangelho quando
o Mestre Jesus disse:
´´Sabeis que os
príncipes das nações as dominam e que os grandes
as tratam com império. - Assim não deve ser entre
vós; ao contrário, aquele que quiser tornar-se o maior,
seja vosso servo; - do mesmo modo que o Filho do homem não
veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção
de muitos.``
S. Mateus, capítulo XX, vv. 20 a 28.(2)
E nesta outra também:
´´Quando fordes
convidados, ide colocar-vos no último lugar, a fim de, quando
aquele que vos convidou chegar, vos diga: meu amigo, venha mais
para cima. Isso então será para vós um motivo
de glória, diante de todos os que estiverem convosco à
mesa; - porquanto todo aquele que se eleva será rebaixado
e todo o que se abaixa será elevado.``
S. Lucas, cap XIV, vv. 1 e 7 a 11(3).
O Cristo coloca,
portanto, a humildade como princípio
incondicional da felicidade. Pois esta se encontra no servir
e não no ser servido, nem tão pouco em se sentir o todo
poderoso apenas por ocupar momentaneamente uma posição
de destaque. Pois o verbo ocupar, na esfera carnal, não significa
maior saber intelectual muito menos moral e sim mais obrigações
e deveres e muito amiúde ´débitos` perante a Lei,
pois muitas vezes aqueles que apesar de estarem em uma posição
dita de ´subalterno` ou ´inferior` costuma suplantar mais
frequentemente senão em inteligência pelo menos em moral,
aqueles os quais devem obedecer. A história está repleta
de personagens exemplificando isto em ambos os sentidos.
Saibamos usar os nossos cargos de
chefia, se estivermos investidos deles, com equilíbrio e serenidade.
Delegando funções, repartindo o poder, solicitando colaboração
e assistência, oferecendo liberdade de ação e
respeitando o livre arbítrio de todos. Sem nunca impor os nossos
pontos de vistas e acreditando que somos os donos da verdade. E pensando
sempre que entre aqueles os quais dirigimos pode haver algum ou alguns
que nos são mais desenvolvidos na escala evolutiva. Os que
são ´subordinados` também não ficam isentos,
por sua vez, de cumprirem a risca com os deveres que lhes competem.
Desenvolvendo cada vez mais a arte do respeito e da obediência
para com os seus ´superiores`.
Nós espíritas que temos
a chave, no dizer do iluminado espírito Bezerra de Menezes,
para compreender as palavras de Jesus com mais profundidade e entendimento,
por isso mesmo mais responsáveis seremos perante a Lei caso
queiramos agir como Dâmocles e tentar obter o poder a todo preço,
pois chegará um dia em que o finíssimo fio da crina
de cavalo se partirá e ai de nós se estivermos embaixo
da espada. O interesse com que muitos adeptos e médiuns que
atuam na doutrina se lançam na busca por posições
de destaque e notoriedade em presidências de centros, instituições,
organismos e federações se constitui em verdadeira cegueira
espiritual quando tem como raiz a ambição, o orgulho,
a vaidade e os complexos de inferioridade de que são portadores.
Querem fazer da doutrina um trampolim para sua ascenção
social. Como a compensar a mediocridade da vida que levam., acreditando
na ilusão de que o nosso valor como pessoa é medido
pelo posto que ocupamos.
Equivocam-se, pois aqueles que assim
procedem, pois a Doutrina Espírita não se presta a isso
e o combate com veemência. Os grupos espíritas também
não são uma empresa de direito privado com fins lucrativos
ou reinado onde passamos o ´negócio` para a parentela
consanguínea e os apadrinhados e nem tão pouco existem
cargos vitalícios. Deveria haver um revezamento de tempos em
tempos nas posições e nos postos afim de evitar o despotismo
e também para que outros possam opinar e mostrar a sua capacidade
de trabalho, desenvolver e/ou aprimorar qualidades. Allan Kardec,
o bom senso encarnado na feliz frase de Camille Flammarion(4)
é de uma precisão sem par com relacão a isso
no Livro Obras Póstumas(5). É
de se estranhar que uma pessoa permaneça na presidência
de uma instituição por um período de tempo superior
a 5 anos. Pois ao permanecer longos períodos em um determinado
posto se cria uma vacuidade de liderança, pois quando esse
líder desaparecer, o que certamente acontecerá uma vez
que todos somos desencarnaveis, quem o subistituirá? E se existe
uma pessoa ou pessoas capazes de substituí-lo é de se
perguntar porque não há o compartilhamento dessa liderança
desde já? Razão porque o mestre Kardec(5)
propôs as regras para o estabelecimento do comitê central
que serve perfeitamente para qualquer tamanho de organização.
Pois como diz o ditado popular duas ou mais cabeças sempre
pensam melhor do que uma.
André Luiz na obra Nosso Lar(6)
nos relata que em um período de 10 anos passaram 4 espíritos
pela direção do Ministério da União Divina,
sendo este a mais alta estância daquela colônia espiritual.
O que equilave 2,5 anos na função. E observem que estamos
falando de espíritos que foram delegados pelo Alto por suas
inumeráveis qualidades intelectuais e morais. E é ainda
o nosso querido André Luiz no mesmo livro(6)
que nos relata que a direção dos ministérios,
departamentos e das colônias espirituais estão a cargo
dos mais capacitados não só em saber, mas sobretudo
em moral.
As instituições espíritas
deveriam, pois, escolher seus dirigentes não só pelos
seus conhecimentos doutrinários e administrativos, mais mas
também de acordo com ensinamentos kardecianos, e acima de tudo
entre aqueles que mais amam o seu irmão, que mais secam lágrimas
e que mais balsamizam as dores do corpo e da alma. E isto tudo pelo
simples fato de que a Doutrina Espírita tem como estandarte
e pedra angular dos seus postulados as bandeiras da Liberdade e da
Faternidade, e mais ainda da Caridade e da Humildade.
Não percamos, pois, o nosso
já escasso e precioso tempo na disputa por posições
de mando, poderes temporais, chefias, governos e suas correspondências.
Dizendo aqui mando e sou obedecido e poderia dizer, muito frequentemente,
e sou detestado parafraseando o espírito Lázaro em uma
mensagem psicografada contida no Evangelho Segundo o Espiritismo(7).
Temos muito por trabalhar no burilamento do nosso próprio Eu.
Busquemos os últimos lugares como servos humildes fazendo com
que a nossa mão esquerda não saiba o que faz a mão
direita, pois o Pai saberá nos dar um lugar mais elevado no
Plano Espiritual se o merecermos. E Jesus nos adverte nesta frase:
Pois que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua
alma? Ou que dará o homem em recompensa da sua alma?
S.Mateus Cap XVI vv 26 .
Sejamos, portanto, sábios e
sigamos os conselhos do Mestre de Amor e Humildade ao invés
de Dâmocles, pois, Ele, Jesus Cristo, que por ter-se feito o
menor foi, é e continuará a ser o Maior de todos, guiando-nos
com seu imenso Amor em direção a Luz do Pai.
Um abraço fraterno a todos.