Como Mateus a coloca depois do episódio
do “pedido de um sinal celeste”, e Lucas a situa antes,
preferimos não estabelecer nenhuma ligação lógica
entre esse fato e o ensino aqui dado, deixando-o como lição
autônoma.
Na interpretação vulgar, entendemos
a advertência como relativa às obsessões, devendo
ter sido dada em conexão com algumas das libertações
de obsessores, executada por Jesus, e talvez a mais recente, a do
cego mudo.
O Mestre firma doutrina a respeito da técnica
obsessiva por parte dos desencarnados. Perfeito conhecedor do assunto,
pode revelar-nos com segurança há dois mil anos, uma
coisa que o ocidente só ficou sabendo, por experiência
direta, há um século, com os estudos do Espiritismo
de Allan Kardec e seus seguidores.
O obsessor – espírito não purificado
( a kátharton) e, por conseguinte, não esclarecido (mas
não se use o termo contundente e descaridoso “imundo”:
afinal é um “espírito” filho de Deus, como
nós!) – liga-se a uma criatura por quem sente ódio
e sede de vingança. Ora, o ódio é o desequilíbrio
de um amor, frustrado por qualquer motivo: e quanto maior o amor,
mais fundo o ódio. Uma vez ligado fluidicamente à criatura
– ou, na linguagem evangélica. “tendo entrado nele”
– o obsessor passa a usufruir de todas as sensações
e emoções da vítima, ao mesmo tempo que lhe injeta
todas as suas próprias sensações, emoções
e pensamentos, estabelecendo-se, assim, tenebroso, intercâmbio
de vibrações barônticas, muito desagradáveis
para o encarnado, embora aprazíveis para o perseguidor.
Ocorre que, quando, por ação
externa, é ele desligado de sua vítima, se vê
coagido a permanecer pervagando no plano astral que, mutável
como é , apresenta a cada entidade o aspecto condizente com
sua evolução. Em se tratando, pois de entidades não
evoluídas, a ambiência astral manifesta-se como a exteriorização
da imaginação de cada um: região ainda inóspita,
árida (“sem água” = anhydrôn), cansativa
porque sem postos fixos de referencia, já que é instável,
onde o “espírito” não encontra repouso,
porque sua desorganização mental faz que aí os
sítios se modifiquem a cada alteração do pensamento.
O repouso (ou paz) só poderia provir de seu próprio
âmago, de seu coração: e justamente aí
reside a insatisfação frustrada e a rebeldia inconformada,
que se projetam no intelecto, o qual, ao pensar, plasma os ambientes
pavorosos em seu redor.
Quando, porém, se vê desligado da vítima
e aliviado das pressões fluídicas que o expulsaram daquele
posto avançado da luta em que vivia empenhado, se sente descontrolado
e confuso e tenta voltar. Ao chegar. novamente atraído pela
sintonia vibratória – alguns obsidiados registram sensações
desagradáveis pela ausência do peso do perseguidor a
que estavam habituadas, e esse “vazio” faz que subconscientemente
de novo o atraiam para junto de si – percebe que há dificuldade
em influenciar a antiga vítima: a “casa” está
“desocupada, varrida e arrumada”. Significa isso que a
personagem visada já se corrigiu de alguns defeitos colocou
em ordem suas emoções, reequilibrando sua aura e se
libertou das falsas imagens sugeridas pelo perseguidor espiritual.
Talvez, até, tente injetar-lhe novos quadros astrais inferiores,
sem encontrar ressonância: perdeu: a antiga ascendência.
Regressa, então, descorçoado, mas não
desanima de seus objetivos. Consegue, nas rodas de entidades semelhantes
a si, outros sete “piores que ele”. A decepção
com a evolução de quem ele considera seu inimigo, faz
nele crescer proporcionalmente a raiva e o desejo insano de derrubá-lo
do ponto atingido, e não aceita obstáculos a seu ódio
implacável. Ao lado dos sete novos “amigos”, e
já a eles subjugado porque devedor de um obséquio que
será cobrado até o último centavo e mais os “juros”
– embora eles só aceitem a empreitada quando vêem
possibilidades de auferir boas vantagens de baixo teor – o ataque
é renovado. E a condição última torna-se
pior que a anterior.
Jesus termina prevendo e predizendo que assim aconteceria
aquela geração má – ou melhor, “enferma”
(ponerá) – que não está assimilando a profundidade
de Seu ensino.
A lição desdobra-se em profundidade
maior que a aparente. A escala de valores, como sempre, aplica-se
a diversos graus, segundo a interpretação que pode ser
dada.
Em primeira plano aparece, sem dúvida, a lição
literal, que vimos acima. Trata-se do que realmente ocorre nos casos
de obsessão e possessão, por parte de espíritos
desencarnados. O texto é claro: é o exemplo da vida
diária. Fatos corriqueiros.
Há outra interpretação:
após a “conversão” de uma criatura, do materialismo
ou da descrença, à espiritualidade, verificamos que
foi dela expulso um “espírito atrasado”: o da dúvida.
Mas logo depois, com a “casa vazia, limpa e arrumada”,
surgem outros sete espíritos piores, que são: a vaidade
de ter alcançado aquela compreensão; o convencimento
de sua capacidade pessoal em melhorar; o orgulho de haver galgado
um passo a mais na evolução: a auto-satisfação
da crença de que realmente é um eleito; a pretensa superioridade
que o faz acreditar-se melhor que “os outros”; a arrogância
que descaridosamente despreza os outros pecadores; e o pior de todos,
a invigilância que se supõe infalível em suas
opiniões, em seus julgamentos, em suras condenações.
Esses sete espíritos piores
– muito piores – que o materialismo e a descrença,
passam a morar naquele indivíduo, cujo estado se tornou muito
mais grave do que antes. Huberto Rohden tem uma frase que descreve
bem esse caso tão típico e, infelizmente, tão
comum nos espiritualistas de qualquer religião. “Livre-me
Deus de minhas virtudes, que de meus vícios eu me livrarei”.
No entanto, a última frase
profética de Jesus, relatada por Mateus, e que amplia o conceito
do individuo para a coletividade, abre-nos o horizonte para uma terceira
interpretação. Diz “e assim acontecerá
a esta geração”.
Essa profecia é facilmente
verificável, agora, após vinte séculos, em sua
realização comprovada.
Aqueles homens que ingressaram no
cristianismo, embora o cristianismo não tivesse ingressado
neles, e que, portanto, não perceberam o âmago, a base,
a profundidade do ensino de Cristo, foram exatamente os que se apoderaram
do poder, imbuídos da convicção de se haverem
libertado do “espírito” do paganismo e do judaísmo.
Expulso aquele espírito, todavia, outros sete piores vieram
neles habitar. Convenceram-se de que eram os melhores, quiçá
os únicos que realmente compreendiam e interpretaram a verdadeira
religião cristã, numa vaidade sem limitações;
incharam de convencimento a ponto de se intitularem, eles mesmos,
os legítimos e indiscutíveis representantes de Deus
na Terra, herdeiros dos “Apóstolos”, fundamentando-se,
para isso, no lugar geográfico em que se encontravam, e não
no espírito que possuíam; encheram-se de orgulho, certos
de que eram “donos de Deus” e chegaram ao cúmulo
de se julgarem por Ele obedecidos, podendo determinar “por decreto”,
aqueles que deviam habitar o céu (e mesmo, durante certa época
o fizeram, até o lugar do céu que deveriam ocupar...);
dormiram sobre os louros das conquistas de seus postos, com a auto-satisfação
de que eram “escolhidos”, os “eleitos de Deus”,
os “privilegiados” do planeta; felicitaram-se com a pretensa
superioridade de que, quem os não seguisse, estaria condenado,
e desprezaram, perseguiram, e espezinharam outros povos, destruindo
documentos e monumentos que – por não provirem deles
– eram julgados “diabólicos”; cresceram em
sua arrogância desmesurada, torturando, queimando, e assassinando,
em “nome de Deus” e como delegados Seus, todos aqueles
que se lhes não queriam submeter; e finalmente caíram
na pior das invigilâncias, solenemente decretando-se a si mesmos
como sendo infalíveis, pois o que diziam era o próprio
Deus que falava por sua boca. A profecia de Jesus cumpria-se ad litteram
: “nem um iota” . . .
No capitulo 17 do Apocalipse há
outros pormenores proféticos a respeito da “Babilônia
a grande” (v . 5),. “instalada sobre sete colinas”
(v . 9) e que está “embriagada (satisfeita, feliz em
sua irresponsabilidade) com o sangue dos mártires (testemunhas)
de Jesus”, tanto que o vidente “ficou estupefacto ao vê-la”
(v. 6).