Carlos Antonio Fragoso Guimarães

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A Formação do Cristianismo Depois de Jesus

 

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(trecho inicial)

Quando, hoje, buscamos referências sobre o início do Cristianismo, muito frequentemente nos debruçamos nos documentos canônicos que constituem o chamado Novo Testamento, ou seja, os Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João, o texto intitulado Atos dos Apóstolos, as Epístolas de Paulo, de Pedro, de João e de Tiago, e o Apocalipse de João. Subsidiariamente, podemos consultar os escritos do judeu romanizado Flavio Josefo, em especial sua obra Guerras Judaicas, e alguns parcos comentários sobre o nascente movimento dos cristãos feitos por escritores romanos muito depois da morte de Cristo. Mas é pouco lembrado, porém, que os textos oficiais do Novo Testamento foram estabelecidos como tais em uma época bastante posterior aos acontecimentos que envolveram a vida de Jesus e o trabalho desempenhado por seus discípulos diretos, pois o cânone oficial só veio a ser estabelecido em 397 d.C. durante o chamado Concílio de Cartago, onde as diretrizes do que seria a Teologia Romana - paradoxalmente extremamente ligada aos processos políticos e administrativos do mesmo Império que havia perseguido tão duramente os cristãos - foram cristalizadas, num desdobramento político que veio se fazendo desde que Constantino oficializou o cristianismo como a Religião do Império - sem que tivesse, contudo, postergado diretamente a religião pagã anterior.

Por esta época estavam sendo erguidos os estatutos da instituição chamada Igreja - na verdade, mais especificamente os da Igreja Romana, incentivada pelo imperador Constantino, e que, por isso, deveria ser a hegemônica por estar ligada diretamente à sede do Império, pois várias eram as tradições cristãs vigentes, como as da Igreja Grega, a Igreja de Alexandria, a Igreja de Antioquia, a Igreja de Éfeso, a Igreja Copta, a Igreja Gnóstica e outras tradições, nem uma delas mais poderosa que as demais, com exceção, talvez, da Igreja de Alexandria, cujas profundidades ou ideias eram divergentes das de Roma e que seriam vistas e condenadas como ameaças ao poder do núcleo romano, sendo, pois, consideradas heresias. Parte destas igrejas orientais permaneceram críticas da teologia construída por Roma, com especial ênfase na primazia quase supra-humana do bispo de Roma, o Papa, o que levou, no século XI, ao cisma definitivo entre a Igreja Romana e as do Oriente, hoje conhecidas como Igrejas Católicas Ortodoxas.

Os textos que se tornaram a base da Bíblia Cristã oficial foram escolhidos, como hoje sabemos, entre vários outros que circulavam sobre a vida de Cristo à época - alguns extremamente fantasiosos, mas outros com aprofundadas informações sobre Jesus e o pensamento dos cristãos da época - e que, a partir de então, em especial com São Jerônimo, foram editados e copiados em um processo que, atualmente sabe-se, não escapou de ser cheio de manipulações e adaptações aos interesses da nascente instituição religiosa, em especial na construção e edição de um texto dirigido a leitores romanos, orgulhosos de sua nacionalidade e da história de seu Império, o que levou a expedientes como o recheio dos textos com enxertos de frases, supressões ou adendos interpretativos que procuravam dar uma visão de mundo que fosse concorde com os interesses da Igreja que se estabelecia como instituição. Um dos exemplos deste tipo de manipulação é o esforço para se minimizar a participação dos romanos na execução de Jesus, jogando a responsabilidade quase que completamente em cima dos judeus (a esta altura já dispersos pelo Império depois da destruição de Jerusalém por Tito no ano 70), esquecendo-se que o Galileu foi vítima de dois processos: um político-religioso, da parte dos judeus, e outro político, por parte dos romanos. Esta temática será desenvolvida mais adiante.

 

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