A morte não existe...Bem verdade...mas
tem um negócio aí, um fenômeno natural, uma tal
de transição que merece toda a nossa atenção!
Esse breve artigo procura tratar o que significa, em termos espíritas,
nos prepararmos para uma boa morte. O fato de sermos espíritas
não nos credencia a uma transição tranquila, mas
sim o uso desse conhecimento libertador na promoção do
homem de bem que necessita renascer em nós em cada reencarnação.
Algumas igrejas católicas tem
a sua denominação como “Nossa Senhora da Boa Morte”
ou ainda “Nosso Senhor do Bom Fim”, resgatando a antiga
preocupação do ser humano com morrer bem. Morrer bem,
para a sabedoria popular, indica o morrer dormindo ou de forma imediata,
rechaçando a morte lenta e com sofrimento. Na lógica espírita,
de forma inversa, os ensinos dos espíritos nos dizem que o sofrimento
traz a reflexão que auxilia o processo de desligamento.
A mesma igreja católica do “Bom
fim” tem como um de seus sacramentos Extrema Unção,
ou Unção dos Enfermos, conferido à pessoas que
estão em estado grave de doença, buscando aliviá-lo
e prepará-lo para a transição. Os egípcios
enchiam a tumba de riquezas e alimentos para atender ao morto do outro
lado. No campo da medicina, atualmente, se discute a humanização
do momento do desencarne, com cuidados paliativos a enfermos já
sem possibilidades terapêuticas.
Percebe-se que o fenômeno da morte
é complexo e passar por ele com “sucesso” é
oriundo de vários fatores, que ultrapassam aquele momento fatídico.
Assim como planejamos a nossa reencarnação, com o auxílio
dos amigos espirituais, a nossa vida como encarnados demanda um “Plano
de morte”, o qual nos preparemos para esse momento, transcendendo
as questões de herança, doações de órgãos,
custas ou tipos de jazigo.
Na doutrina espírita, a discussão
do bom desenlace se apresenta na literatura mediúnica, como uma
relação direta com a conduta na vida encarnada, com o
desapego do espírito. Como dito no livro “Obreiros da vida
eterna” (André Luiz pela pena de Chico Xavier), “Morrer
é mais fácil do que nascer”, desmistificando
o temor pela morte, mas revelando também, a mesma obra, que grande
parte de nossos sofrimentos no desencarne são derivados da decepção
pelos avanços não obtidos na encarnação.
A morte, para nós espíritas,
é um fenômeno natural, que não o desejamos, mas
que o compreendemos, e apesar dessa compreensão, não estamos
livres da perturbação natural da transição.
Não temos credenciais de uma boa morte, dado que esta se vincula
ao aspecto moral, como ilustrado no trecho da obra “Voltei”
(Irmão Jacob na pena de Chico Xavier), que narra a volta de operoso
trabalhador espírita: “Quantas vezes; julguei que morrer
constituísse mera libertação, que a alma, ao se
desvencilhar dos laços carnais, voejaria em plena atmosfera usando
as faculdades volitivas! Entretanto, se é fácil alijar
o veículo físico, é muito difícil abandonar
a velha morada do mundo. Posso hoje dizer que os elos morais são
muito mais fortes que os liames da carne e, se o homem não se
preparou, convenientemente, para a renúncia aos hábitos
antigos e comodidades dos sentidos corporais, demorar-se-á preso
ao mesmo campo de luta em que a veste de carne se decompõe e
desaparece."
Seria ilusório acharmos que a
boa morte seria um privilégio nosso, por termos o conhecimento
espírita! A vinculação com a conduta terrena é
límpida no processo de preparação para uma boa
morte! Da mesma forma, a doutrina espírita aponta a inexistência
de santificações no momento da partida e indica sim o
fim de um ciclo reencarnatório, no qual continuamos sendo nós
mesmos, apenas concluintes de uma etapa importante e se ajustando a
uma nova realidade, a vida espiritual.
Sobre essa questão, merece destaque
também as palavras do espírito Emmanuel, na obra “O
Consolador”, também psicografada por Chico Xavier:
“A morte não prodigaliza estados miraculosos para a
nossa consciência. Desencarnar é mudar de plano, como alguém
que se transferisse de uma cidade para outra, aí no mundo, sem
que o fato lhe altere as enfermidades ou as virtudes com a simples modificação
dos aspectos exteriores. Importa observar apenas a ampliação
desses aspectos, comparando-se o plano terrestre com a esfera de ação
dos desencarnados.”
Inimigos continuam inimigos, nós
continuamos com a nossa bagagem de imperfeições e apenas
apeamos do trem, para se preparar para um novo estágio de nossa
existência. Como toda transição, é complicada...Após
a morte, na outra vida, nos encontraremos com nós mesmos, pois
“(...) se queres conhecer o lugar que te espera, depois da
morte, examina o que fazes contigo mesmo nas horas livres.”,
nas palavras também de Emmanuel, na obra “Justiça
Divina”.
Assim, um preparo para a boa morte não
implica em negar esse fenômeno, ou ainda, colocá-lo no
centro de nossas preocupações. Faz-se mister enxergá-lo
como uma ocorrência inexorável da vida, uma transição
de planos que já enfrentamos outras vezes e que está subordinado,
estritamente, a nossa conduta terrena, na construção da
reforma íntima e na superação das diferenças
de nosso passado reencarnatório.
Vivamos a nossa vida, com trabalho e
alegria, amando e sendo amados, sem esquecer que um dia retornaremos
a pátria espiritual, que longe de ser um céu ou um inferno,
é uma nova etapa de existência, na vida que continua. Teremos
a nossa transição, encontraremos os que nos precederam,
e teremos uma boa morte, sorridentes, se tivemos uma boa vida, fazendo
o nosso próximo sorrir.
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Marcus Vinicius de Azevedo Braga -
Residindo atualmente na cidade do Rio de Janeiro,
espírita desde 1990, atua no movimento espírita na evangelização
infantil, sendo também expositor. Vinculado a Casa Espírita
Amazonas Hércules (www.ceah.org.br). É colaborador assíduo
do jornal Correio Espírita (RJ) e da revista eletrônica
O Consolador (Paraná). É autor do livro Alegria de Servir
(2001), publicado pela Federação Espírita Brasileira
(FEB) e do Livro "Você sabe quem viu Jesus nascer"
(2013), editado pela Editora Virtual O Consolador.
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