Gustavo Leopoldo Rodrigues
Daré e Vital Cruvinel Ferreira - apresentação
DECODIFICANDO O LIVRO DOS ESPÍRITOS
RESUMO
Há grande discordância entre os espíritas brasileiros
sobre qual foi a metodologia científica de Allan Kardec. A forma
peculiar com que foi reconstruído O Livro dos Espíritos
na sua segunda edição de 1860 oferece oportunidade impar
de colher informações capazes de trazer luzes sobre esta
temática conflituosa no Espiritismo Brasileiro. Através
de métodos quantitativos e qualitativos de comparação
de textos, identificamos um rico processo de reorganização
do conhecimento, onde o conteúdo é preservado em detrimento
da autoria textual. O método kardequiano apreendido neste trabalho
oferece fundamentos que o aproxima das metodologias de análise
de conteúdo e propõe uma solução pragmática
para explicar a convivência da ciência com a filosofia na
definição kardequiana de Espiritismo.
INTRODUÇÃO
Allan Kardec defendeu a tese do Espiritismo ser resultado da revelação
dos Espíritos e do esforço científico e filosófico
do homem. No prólogo de O Que é
o Espiritismo sentencia “O Espiritismo é, ao mesmo
tempo, ciência experimental e doutrina filosófica”,
e finaliza “O Espiritismo é uma ciência que trata
da natureza, origem e destino dos Espíritos, bem como de suas
relações com o mundo corporal” . Devido a grande
nespecialização por que passou a Ciência nos últimos
150 anos, o conceito de algo que seja ao mesmo tempo Ciência e
Filosofia é confuso e sem parâmetros de analogia no cotidiano
contemporâneo.
Allan Kardec defendeu que a metodologia científica espírita
deveria ser diferente da metodologia das Ciências Naturais de
sua época: “As ciências vulgares se apóiam
nas propriedades da matéria, que se pode experimentar e manipular
à vontade; os fenômenos espíritas repousam na ação
de inteligências que tem vontade própria e que nos provam
a todo instante não se acharem subordinadas ao nosso capricho.
As observações, portanto, não podem ser feitas
da mesma maneira; requerem condições especiais e outro
ponto de partida”. Durante o século XX tivemos grande avanço
das ciências em direção as problemáticas
do espírito humano, com a sistematização científica
da antropologia, da sociologia e da psicologia. Será que nos
dias atuais Kardec elaboraria a mesma assertiva? A metodologia kardequiana
guarda alguma relação com as metodologias das ciências
humanas? Estas afirmativas de Kardec ainda geram conflitos entre os
espíritas atuais devido às formas diferentes com que se
analisa a amplitude metodológica científica atual.
Allan Kardec ainda defendeu um outro complicador para a metodologia
espírita: sua natureza divina. “Por sua natureza, a revelação
espírita possui um duplo caráter: ela participa ao mesmo
tempo da revelação divina e da revelação
científica... Numa palavra, o que caracteriza a revelação
espírita é que sua origem é divina, que a iniciativa
pertence aos Espíritos e que a sua elaboração é
o resultado do trabalho do homem”.
Este argumento distancia-se ainda mais das concepções
dominantes contemporâneas de Ciência independente do fenômeno
místico e divino. Ao mesmo tempo, forneceu argumentos para os
embates entre os espíritas defensores da natureza divina da revelação
espírita e os defensores de sua natureza humano-científica.
No Brasil não houve, até hoje, nenhuma ampla e conclusiva
discussão sobre a epistemologia kardequiana, nem vivência
de sua prática metodológica. A pequena tradição
científica brasileira se reflete no movimento espírita,
com pequenas e isoladas iniciativas científicas ao longo destes
150 anos. Esta pequena vivência científica favoreceu as
características do Espiritismo brasileiro atual, no qual a atividade
científica não está organizada e seus princípios
práticos e teóricos não são consensuais.
Descrever a metodologia científica kardequiana é questão
conflituosa dentro do pensamento espírita contemporâneo.
Mesmo nos textos mais detalhados, as descrições do próprio
Kardec são imprecisas para os padrões atuais de rigor
científico, favorecendo discussões intermináveis.
A ausência de anotações do processo de elaboração
dos livros kardequianos e de seus dados coletados, dificulta compreender
o modus operantis da pesquisa de Kardec. Entre os materiais acessíveis
na atualidade, O Livro dos Espíritos destaca-se por suas peculiaridades:
representa a obra fundamental do pensamento espírita, é
o primeiro livro de Kardec e sofreu mudanças estruturais importantes
entre a primeira edição de 1857 e a segunda edição
de 1860. A nossa hipótese de trabalho foi de que através
da identificação detalhada das diferenças entre
estas duas edições, e a compreensão de como se
operou esta mudança, será possível inferir a metodologia
de construção do conhecimento filosófico- científico
kardequiano.
OBJETIVOS
Analisar as diferenças estruturais e conceituais entre a primeira
e a segunda edição
d’O Livro dos Espíritos. Descrever o método kardequiano
de construção da segunda edição d’O
Livro dos
Espíritos.
METODOLOGIA
Material:
Foram utilizados os seguintes livros:
1) Primeira edição d’O Livro dos Espíritos
(1857): original em francês disponível na internet e tradução
para o português de Canuto Abreu (1957) e de Wladymir Sanchez
(primeira parte “Doutrina Espírita”, de 2004).
2) Segunda edição d’O Livro dos Espíritos
(1860): original em francês disponível na internet e tradução
para o português de Salvador Gentile, José Herculano Pires,
Guillon Ribeiro e Evandro Noleto Bezerra.
3) Revistas Espíritas 1858, 1859, 1860: original em francês
disponível na internet e tradução para o português
de Evandro Noleto Bezerra.
Método:
Foram utilizadas ferramentas quantitativas de análise de texto
e inferências qualitativas na análise do conteúdo.
Algumas análises foram feitas independentemente pelos dois autores
e outras em parceira. O projeto de trabalho não se fundamentou
em nenhum referencial teórico específico, apesar de relacionar-se
com estratégias quantitativas de Análise de Conteúdo,
e seu objeto de estudo aproximar-se dos Estudos do Jornalismo Comparado
e da Análise Literária.
* os trabalhos completos estarão disponíveis
em forma de livro *
BIBLIOGRAFIA
(1) Allan Kardec, O Que é o Espiritismo (1959), prólogo,
tradução de Wallace Leal V. Rodrigues, editora LAKE, 26°
edição, 2001.
(2) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos (1857), Introdução,
tópico VII, tradução de Evandro Noleto Bezerra,
editora FEB, 1° edição, 2007.
(3) Allan Kardec, A Gênese, Capítulo 1, item 13, tradução
de Victor Tollendal Pacheco, editora LAKE, 17° edição,
1994.
(4) Allan Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo (1863), Introdução,
tópico II, tradução de José Herculano Pires,
editora LAKE, 60° edição, 2005.
(5) Allan Kardec, O Primeiro Livro dos Espírito de Allan Kardec
(1857), NOTA após o Prolegômenos, tradução
de Canuto Abreu, Companhia Editora Ismael, 1957.
(6) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos (1857), Aviso Sobre Esta
Nova Edição, tradução de Evandro Noleto
Bezerra, editora FEB, 1° edição, 2007.
(7) Allan Kardec, Obras Póstumas, Minha Primeira Iniciação
no Espiritismo, tradução de Salvador Gentile, editora
IDE, 1993.
(8) Allan Kardec, O Primeiro Livro dos Espírito de Allan Kardec
(1857), Nota XVII, tradução de Canuto Abreu, Companhia
Editora Ismael, 1957.
(9) Washington Luiz Nogueira Fernandes, Allan Kardec e os Mil Núcleos
Espíritas de Todo o Mundo com os Quais se Correspondia em 1864,
A Revista Espírita, Outubro 2004, ou no site www.consejoespirita.com/larevistaespirita/mil.htm.
(10) Allan Kardec, O Primeiro Livro dos Espírito de Allan Kardec
(1857), Epílogo, tradução de Canuto Abreu, Companhia
Editora Ismael, 1957.
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