Allan Kardec, ao fundar a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas,
não pretendia criar um templo onde as pessoas iriam para fazer
orações, assistir a uma preleção, tomar
água fluidificada e passes, aprender e praticar reforma íntima,
como se isso pudesse ser aprendido em centro espírita, (essa
práticas não existiam no tempo de Kardec).
É uma catolicização e ritualização
da doutrina espírita tremenda. Substituíram a missa
pela palestra, a óstia pela água fluidificada, a benção
do padre pelo passe.
Seu objetivo principal era organizar uma sociedade em que os membros
estivessem estimulados a se instruir, dentro de princípios
éticos universais e para que isso se fizesse de maneira metódica
era preciso criar um sistema de estudos e pesquisas ligado naturalmente
à espiritualidade.
Era necessário adotar o método cientifico, agora direcionado
com metodologia própria às pesquisas espíritas.
Kardec, na época, já afastado da vida de ensino, mas
ainda pertencente a um sem número de academias de ciência,
nem por isso se descuidava de dialogar com o meio acadêmico.
Ao criar a Revista Espírita- Jornal de Estudos Psicológicos
primava por estabelecer um canal de comunicação com
os maiores cientistas e Universidades da época e de todas as
áreas, não só da França como de toda a
Europa, Ásia, Oriente Médio e Américas.
Mas, concomitantemente às pesquisas que realizava, como as
descobertas da mediunidade, dos fenômenos psíquicos e
da vida Além-Túmulo, avançava no seu próprio
processo de auto-educação espiritual e moral, tirando
dessas pesquisas conseqüências filosóficas e éticas.
Hoje, no movimento espírita brasileiro, observamos uma discussão
sem sentido se é válido ou não levar o Espiritismo
para a Universidade. Para que discutir o óbvio? Kardec já
não nos deu o exemplo no que diz respeito a isso? Havia dubiedade
de conduta no seu comportamento com relação a esse tema?
Observamos muitos cientistas espíritas brasileiros escreverem
artigos de uma qualidade ímpar, mas para serem publicados em
jornais e revistas de profitentes, onde certamente não serão
lidos por professores e pesquisadores acadêmicos.
Querem convencer ou mostrar a racionalidade e a validade dos postulados
espíritas para os espíritas? Por que não os publicam
em revistas nacionais e internacionais indexadas e para a comunidade
acadêmica?
Revistas de Antropologia, Sociologia, Filosofia, Física entre
outras poderiam receber a contribuição dessa visão
nova e única que só a Doutrina Espírita tem.
Porque é isso que está faltando: Mentes brilhantes que
dialoguem com ardor suas convicções íntimas,
fruto do resultado de pesquisas e raciocínios lógicos,
à maneira como fizeram William Crookes, Charles Richet, Alfred
R. Wallace, Schrenk-Notzing, Friedrich Zöllner, para citar apenas
alguns.
Cada um dentro da sua área pode e deve dar sua contribuição
para essa inserção.
Por outro lado perguntamos, por que não levarmos esse arsenal
de conhecimento para dentro do Centro Espírita, fazendo dele
o que deveria ser, um centro de estudos, ensinos e pesquisas e não
só um templo para oração, assistir palestra,
tomar passe e dar sopas aos “assistidos”?
Por que os cientistas espíritas brasileiros, na sua maioria,
insistem em ser simples fiéis nos centros espíritas?
É possível haver uma dissociação do saber?
Na universidade são cientistas e no Centro Espírita
deixam de ser cientistas e passam a ser fiéis que vão
para assistir palestras e tomar água fluidificada e passe?
Com isso não queremos dizer que devemos descuidar da caridade
material, mas como diz o Espírito Emmanuel a maior caridade
que podemos fazer pelo Espiritismo é divulgá-lo, mas
de uma maneira racional, equilibrada, sem misticismo e sentimentalismo
piegas.
E como não divulgá-lo (discuti-lo, ensiná-lo,
debatê-lo e pesquisá-lo) dentro do maior centro do saber
da atualidade, que é a Universidade?
Será que somos daqueles que nos achamos auto-suficientes e
acreditamos que a Doutrina Espírita só nos basta e poderá
responder todas as nossas dúvidas e anseios? Estará
o Espiritismo isolado ou inserido no mundo?
Infelizmente o que ouvimos e lemos na internet e na mídia impressa
são discursos de bravata de que devemos vivenciar a doutrina,
sobretudo, no campo moral, mas em nossa relação com
aqueles com que compartilhamos em nosso ambiente de trabalho, ou seja,
na Universidade, observamos uma recusa ou medo (consciente ou inconsciente)
de também vivenciarmos o Espiritismo no seu aspecto científico
de pesquisa e ensino. Porque isso implica em nos expormos, em colocar
o nosso cavalo na chuva, o que necessariamente necessita coragem moral,
moral essa que esses mesmos cientistas advogam.
Kardec fazia pesquisas sem nenhum recurso tecnológico, mas
apenas com ajuda de uma meia dúzia de médiuns adolescentes.
Imagine-se o que poderemos fazer com todos os recursos que a Ciência
desenvolveu nesses últimos dois séculos e quando dizemos
recursos não falamos somente de tecnologias complexas, mas
também das descobertas das ciências humanas, psicológicas
e educacionais.
A cobrança que devemos fazer no campo da moralidade é
de foro íntimo. Não tem o Cristo nos ensinado tudo o
que nos diz respeito à prática da caridade ¬–
escreve São Vicente de Paulo em O Evangelho Segundo o Espiritismo
– e acaso estamos cumprindo 100% desses ensinamentos? Não
o fazemos por quê? Preguiça, comodismo, desleixo, incapacidade
de compreensão ou porque a natureza não dá saltos
e estamos em processo educativo e progressivo. Podemos passar do jardim
de infância à universidade?
Façamos o nosso melhor na certeza de que Deus, nosso Pai e
Professor, sabe com que pode contar da nossa participação,
o que não nos cabe é nos escusarmos daquilo que nos
compete, pois Cristo adverte que aquele que se envergonhar dele, ele
também se envergonhará do mesmo diante do Pai.