A conclusão de Gilberto Gil é
sábia, nossa concepção de Deus foi construída
ao longo da história, a partir dos sentidos humanos e dos desdobramentos
filosóficos possíveis a partir de nossa mesma percepção
sensorial e posterior cultura que foi sendo estabelecida. Deus não
é nada parecido com qualquer coisa que possamos imaginar. Talvez
pela nossa incapacidade de entender e conceber Deus, Jesus tenha sido
elevado a Deus pela Igreja Católica pelo simples fato de Jesus
ser um referencial Terra-Terra, mais compreensível do que qualquer
suposição a respeito de Deus.
Stephen Hawking, físico e cosmólogo,
deixa claro que, segundo seu ponto de vista, não há como
afirmar que Deus não existe, porém a ciência fez
esse personagem desnecessário. Em alguns vídeos no youtube.com,
os quais não consegui verificar a veracidade se a citação
é dele mesmo, ele justifica sua descrença em Deus pelo
fato de que antes do Big Bang não existia o tempo e espaço,
assim, não haveria como existir um Deus – ótimo
argumento, aliás.
Porém, o próprio Hawking
em parceria com Mlodinow escreve um artigo para a Scientific American
em 2013 – The (Elusive) Theory of Everything que pode ser contraposto
à teoria de que Deus, se existe, é desnecessário.
Antes de falar do artigo é importante
ressaltar que Hawking procurava desde sempre uma única fórmula
que unificasse a física e o entendimento do mundo real, o que
foi retratado no filme a Teoria de Tudo (2014), baseado em livro da
primeira esposa de Hawking, Jane Beryl Hawking. Então, no citado
artigo, os autores afirmam que há inúmeras boas teorias
sobre o entendimento do mundo, cada qual dando conta da realidade percebida
pelas condições de observação de cada pesquisa.
Essa constatação fez com que a busca pela Teoria de Tudo
seja alterada pela busca de uma família de teorias que deem conta
de explicar o mundo.
Entretanto, Hawking e Mlodinow põem em cheque a realidade, já
que a percepção de mundo varia do observador e de seu
interesse, e é possível que não exista uma realidade
a ser unificada, os modelos científicos podem existir aos milhares
e cada qual dar conta de uma parcela de algo supostamente objetivo,
e nenhuma dessas teorias poderia se sobrepor às outras a partir
do momento que, se testadas, elas se fizessem eficientes. Um ou outro
modelo poderia ser utilizado a partir da melhor conveniência.
Segundo os autores, a tão badalada física quântica
não será a redenção para a Teoria de Tudo.
Nesse campo também há problemas. Citam que em 1970 a teoria
quântica nasceu com a aura de ser aquela que traria a verdade,
colocando a variável da gravidade para os holofotes. Porém
com o tempo, cinco teorias nasceram e ainda pouco conversam entre si.
Atualmente, ou pelo menos em 2013, os estudos quânticos estavam
buscando aproximar o máximo possível as cinco teorias
sob o tema da uma Teoria Fundamental que foi chamada de Teoria -M, o
que na prática é a família de teorias que citamos
acima.
Assim, se entendermos as teorias sobre o mundo e sua realidade a partir
do ponto de vistas dos pesquisadores, e que existem várias teorias
que se fazem fortes o suficientes na explicação do mundo,
e que muitas delas não se conversam, as palavras de Hawking sobre
Deus ser desnecessário enfraquece, ou pelo menos fica limitada
a partir dos próprios métodos de observação
científicos possíveis.
Nesse momento pulamos para Kardec.
No Livro dos Espíritos, Kardec registra nas respostas sobre os
questionamentos sobre Deus uma argumentação que muito
se aproxima do método científico de hoje, pois ele destaca
que é uma tarefa impossível definir Deus, por não
haver metodologia possível para tanto.
Segundo o Livro dos Espíritos, os humanos não tem condição
de captar a essência de Deus, falta mesmo linguagem apropriada
para descrever o que seria Deus. Esse tipo de resposta alinha-se à
impossibilidade de criar um modelo cientifico para observá-lo
e a partir dessa observação criar alguma teoria. Isso,
como bem disse Hawking, não significa que ele não exista.
Mesmo a afirmação que antes do Big Bang não havia
tempo e espaço, portanto não havia como existir um Criador
antes desse clímax, pode ser contestado, pois o modelo usado
limita-se ao Big Bang.
Um conceito importante que foi bem enfatizado no Livro dos Espíritos
é que o nada não existe. O nada não cria nada,
se houve criação havia alguma coisa. O ponto seguinte
dessa lógica é que se o criado reflete algo inteligente,
o criador era provido de inteligência. Por fim, se houve criação,
houve vontade, a vontade é ação e intenção,
atributos de seres inteligentes.
O Livro dos Espíritos aponta que a prova de Deus está
ao se observar tudo aquilo que não é obra dos homens,
a natureza que nos rodeia, a imensidão do espaço, a tranquilidade
dos mares, tudo isso está bem registrado na ciência a partir
das leis que regem a matéria, mas a organização
dessas leis a partir de uma explosão, o Big Bang, ainda não
foi identificada.
Assim, falar com Deus não está ligado aos fracos da Terra,
aqueles que sucumbiram perante o mundo e refugiam-se na religião.
Pelo contrário, é um ato humano e consciente de ligação
às nossas origens e ao Criador. Falar com Deus, por outro lado,
propriamente dito não é um processo fácil para
qualquer um. Por exemplo, limpar a imagem do velhinho onipotente e musculoso
pintado por Michelangelo e tudo que ela representa e sintetiza no imaginário
humano não é uma tarefa simples.
Pensar Deus é uma tarefa de abstração, Kardec lista
seus atributos e dá algumas pistas de como pelo menos se sintonizar
com ele. Para ajudar no treino de conexão com esse Ser sugiro
também deixar-se embalar pela música de Gilberto Gil,
quem provavelmente estava ligado mentalmente com algo além de
nossa compreensão, quando a compôs.
Fonte: https://blogabpe.org/2017/04/01/e-se-eu-quiser-falar-com-deus/
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