A finalidade desta tese foi compreender o papel dos
rituais no processo de luto originado por situações
de catástrofes. Tendo em vista a Teoria do Apego e as contribuições
posteriores dessa abordagem, acrescidas dos estudos sobre o significado
da morte e dos rituais no processo de luto, realizamos uma pesquisa
qualitativa com pessoas que tiveram perdas em um acidente aéreo:
a aeronave, após a decolagem, chocou-se contra algumas residências,
resultando no óbito de todos seus ocupantes e de um morador
da comunidade atingida. Com esse objetivo, pesquisamos como se deu
o processo do luto, se receberam algum tipo de suporte social e como
os parentes enlutados se encontram na atualidade.
Os dados foram agrupados em dois blocos denominados
de fatores de risco e fatores de proteção, sendo que
no primeiro buscamos verificar as reações inerentes
ao luto traumático, as ações de brutalização
dos mortos e dos vivos e a precariedade ou inexistência de rituais
de passagem. No segundo bloco, focamos nos relatos dos enlutados sobre
ações de delicadeza dirigidas aos mortos, a eles próprios
e se houve a realização de rituais de passagem. Vale
lembrar que este estudo aborda um tipo de luto, o qual, apesar de
privado, é também um luto de âmbito público,
por se tratar de perdas causadas por meio de transporte de massa,
e, ainda, por ter obtido ampla cobertura da mídia. Neste sentido,
procuramos observar como o luto se expressou no espaço público,
devido ao seu reavivamento como Novo Luto Público, e no espaço
privado, ponderando, ainda, quais foram as influências culturais
dentro dessa perspectiva.
Partindo do pressuposto de que a cultura nos molda,
contextualizamos os dados a partir da visão antropológica
de supermodernidade, caracterizada pelas figuras de excesso: o tempo,
os não-lugares e o eu. Fizemos duas considerações
importantes: a primeira envolve o princípio que nomeamos de
não-brutalização dos mortos, que significa o
respeito no tratamento aos mortos, a segunda abrange o princípio
da não-brutalização dos vivos, no que diz respeito
ao seu bem estar, definindo-se, para esta última, a palavra
delicadeza.
Nas considerações finais, destacamos
que nos casos de enlutamento por perdas devidas às situações
de catástrofes, os rituais podem atuar como um fator de proteção
para a melhor elaboração do processo do luto traumático,
e, considerando que neste tipo de morte eles devem ocorrer tanto na
esfera pública quanto na privada, constatamos que, se manifestos
apenas em uma dessas duas dimensões, não ganham sentido
de suficiência, nem confirmam, nem reconhecem, tanto para o
enlutado quanto para comunidade, a existência ímpar do
que foi perdido. Neste sentido, não é opcional, mas
necessária, sua manifestação em ambas as dimensões.
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D'Orio, Rosana Teresinha. Histórias de fins,
histórias sem fins...: um estudo sobre rituais no processo
de luto. 2010. 206 f. Tese (Doutorado em Psicologia) - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, São Paulo,
2010.