Gareth Cook
> Estudo científico da prece apresenta resultados
surpreendentes
Em um laboratório tranquilo,
Andrew Newberg tira fotografias do que os fiéis chamam de presença
de Deus. O jovem neurologista convida budistas e freiras franciscanas
a meditarem e orarem em uma sala fechada. Depois, no momento da mais
alta devoção, ele injeta um marcador que viaja até
o cérebro e revela sua atividade no momento da transcendência.
Um padrão emergiu das experiências de Newberg: Existe
uma pequena região, próxima à parte posterior
do cérebro, que calcula constantemente a orientação
espacial da pessoa, dando uma idéia de onde o corpo da pessoa
termina e o resto do mundo começa.
Durante prece intensa ou meditação, essa região
torna-se um oásis tranquilo de inatividade, por razões
ainda inteiramente desconhecidas. Esse fato poderia explicar a comunhão
espiritual de ausência de limites, sentida pelos religiosos
ao longo das eras.
"Ela embaça a relação entre o eu e o outro",
disse Newberg. O neurologista é professor assistente da Universidade
de Pensilvânia e seu trabalho foi publicado na edição
de 10 de abril da revista Psychiatry Research: Neuroimaging. "Se
forem longe o bastante, os praticantes têm uma dissolução
completa do eu, uma sensação de união, de espaço
infinito". Newberg e outros cientistas estão descobrindo
que as diversas tradições de devoção humanas
têm uma realidade biológica poderosa. Durante intensa
meditação ou prece, tanto o cérebro quanto o
corpo experimentam mudanças ainda pouco compreendidas, que
poderiam trazer nova compreensão da experiência religiosa
e, talvez um dia, até fornecer dicas para se viver com mais
saúde e plenitude. Segundo os cientistas, o novo campo de estudo
já forneceu evidências de que esses estados meditativos
- que dependem do desligamento dos sentidos e de repetição
de palavras, frases ou movimentos - são uma parte natural do
cérebro. E que os humanos são, em certo sentido, seres
inerentemente espirituais.
"A prece é o meio que o cérebro moderno tem para
se conectar com estados de consciência ancestrais poderosos",
disse Gregg Jacobs, professor assistente de psiquiatria na Escola
de Medicina de Harvard, que publicou diversos estudos sobre como as
ondas cerebrais se modificam durante a meditação. Com
os estados meditativos, as pessoas parecem desligar o que Gregg chama
de "conversa interior" do cérebro superior, consciente.
Durante a meditação, os pesquisadores observaram aumento
na atividade das ondas cerebrais "teta", um tipo que se
move lentamente e que inibe outras atividades do cérebro. Com
base em uma análise preliminar de dados recentes, Gregg disse
que observou atividade teta inibidora saindo de uma área do
cérebro, chamada de lobo parietal, que contém o oásis
tranqüilo da prece. Eventualmente, os pesquisadores esperam poder
identificar um centro biológico comum nas muitas variedades
mundiais de adoração.
No entanto, na medida em que os cientistas adotam tecnologia cada
vez mais sofisticada para o estudo da religião, muitos advertem
que esses primeiros vislumbres de território misterioso não
devem ser excessivamente interpretados. "O que quer que possamos
aprender sobre esses estados será uma grande vantagem para
nós", disse Lawrence E. Sullivan, diretor do Centro de
Estudos das Religiões Mundiais de Harvard.
Há o perigo, entretanto, "de que nossa tecnologia e conclusões
não se igualem à riqueza e complexidade da religião".
A própria prece é espetacular em sua diversidade, disse
Sullivan, citando a tradição Taoista de meditação
profunda, na qual os praticantes imaginam seu próprio nascimento,
e os cânticos e danças rituais de um povo que habita
uma região próxima ao rio Orinoco, da Venezuela, quando
os adolescentes atingem estado de transe estático e depois
morrem metaforicamente. Nos anos 1970, alguns pesquisadores começaram
a estudar seriamente o valor terapêutico da religião.
Herbert Benson, presidente do Instituto Corpo/Mente afiliado à
Universidade de Harvard, cunhou a expressão "resposta
de relaxamento", para descrever as mudanças psicológicas
saudáveis nas pessoas que seguiam práticas meditativas
orientais. Recentemente, no entanto, os pesquisadores também
passaram a considerar práticas de prece ocidentais similarmente
intensas. No ano passado, os Institutos Nacionais de Saúde
(NIH) anunciaram que estariam financiando um ensaio clínico
na Universidade Johns Hopkins para estudar os efeitos de longas sessões
de oração de um grupo de mulheres afro-americanas com
câncer de mama - o primeiro estudo desse tipo em toda a história.
Uma das mais impressionantes descobertas aconteceu em 1997, quando
uma equipe de pesquisadores da Universidade da Califórnia em
San Diego descobriu o que chamaram de "módulo Deus",
no cérebro. Eles estudaram pacientes que sofriam de uma forma
de epilepsia que afeta o lobo temporal do cérebro. Esses pacientes
têm experiências profundamente religiosas durante os acessos
e depois ficam fascinados com assuntos místicos.
Os pesquisadores, chefiados por Vilayanur Ramachandran, disseram que
os acessos fortaleciam uma porção do cérebro
que responde a palavras religiosas, implicando que o sentimento religioso
é parte da arquitetura cerebral. Newberg, da Pensilvânia,
que é autor de um livro lançado este mês chamado
"Why God Won't Go Away" (por que Deus não irá
embora), disse que o mistério da experiência religiosa
era inerentemente difícil de ser resolvido em laboratório,
especialmente com um scanner de cérebro barulhento funcionando.
Sua estratégia, no entanto, tem sido usar uma técnica
chamada Spect, que usa um marcador que se fixa no padrão de
atividade cerebral ao ser injetado, mas pode ser observado depois,
com o scanner. Newberg já discutiu suas descobertas em conferências
científicas, mas somente os resultados com budistas foram publicados.
Ninguém sabe ainda, entretanto, porque o cérebro tem
essa habilidade milagrosa de atingir outros tipos de estados de consciência,
simplesmente voltando-se para dentro, aquietando-se, concentrando-se
em uma imagem trêmula e repetindo uma frase sagrada.
Algumas pessoas interpretarão os resultados da pesquisa como
evidência de que Deus é um produto do cérebro,
enquanto outras dirão que são evidência de que
o cérebro é um produto de algum poder maior - que, como
diz Benson, "talvez Deus nos tenha dado o mecanismo para entender
e sentir Deus de determinada forma".
Tradução: Deborah Weinberg
Fonte: THE BOSTON GLOBE
Sobre o autor Gareth Cook:
Gareth Cook has covered science for the Boston Globe
since 2000. He graduated in 1991 with two bachelor's degrees from
Brown University: International Relations and Mathematical Physics.
He was named to the Sigma Xi and Phi Beta Kappa honor societies.
After graduating, Cook passed the Foreign Service
written and oral examinations but then decided on a career in journalism.
He worked as an assistant editor at Foreign Policy magazine until
1993. From 1993 to 1994, he worked as a reporter at U.S. News &
World Report, focussing mainly on national politics. In 1995, he moved
to a job as an editor at the Washington Monthly. Cook then left Washington
to be the news editor of the Boston Phoenix. He recruited a new staff,
and his staff won numerous awards from the New England Press Association.
In 1999, he came to the Globe's city desk, where
he started as the New England Editor. In the fall of that year, he
was named the Sunday Metro Editor, responsible for editing local and
regional stories for the Sunday paper. The next year, Cook moved to
a job covering science -- a lifelong passion.
He was born in Ann Arbor, Michigan, and now lives
in Jamaica Plain, Massachusetts, with his wife, Amanda, and his son,
Aidan.
* retirado do website http://www.pulitzer.org/winners/gareth-cook
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