Isaias Claro

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Condensado da palestra do Dr. ISAIAS CLARO, na Escola de Pais Eurípedes Barsanulfo, promovida pelo Centro Espírita OBREIROS DO SENHOR (CEOS) e proferida na Instituição Assistencial Meimei (IAM) São Bernardo do Campo em março/94.


O tema é de uma atualidade impressionante. Neste minuto uma alma foi impedida de reencarnar. Alguém, em algum lugar do mundo, abortou. Enquanto nos demoramos nesta abordagem necessariamente ligeira, dezenas de espíritos estarão sendo impedidos de retornar ao proscênio da luta corporal.

O artigo 128, do Código Penal, diz que o aborto não é punível, apenas em duas hipóteses.

Quando a mulher corre risco de vida. É o chamado aborto necessário. Sacrifica-se o ser em formação, porque é uma expectativa de vida. Este postulado jurídico tem consonância com o pensamento espírita. Se consultarmos a questão 359 de O livro dos Espíritos, verificaremos que o aborto necessário, que se realiza para salvar a vida da mãe, é moral. Tem perfeito amparo nos códigos soberanos da Justiça Divina e não é contra a lei natural.

Porque se se preservar a mulher em detrimento da criança, o espírito, que iria reencarnar, não está impedido de fazê-lo outra vez e poderá retornar em uma nova experiência. Para isso, evidente que os pais pratiquem conjunção carnal. O espírito, portanto, poderá retornar sem prejuízo algum para a sua evolução.

O Código Penal ainda diz que se a gravidez decorre de estupro, a mulher pode praticar o abortamento, através de médico. É o chamado aborto sentimental.

Este caso não tem amparo nas leis morais. Não direi que a Doutrina Espírita é contra o aborto sentimental. Direi que o aborto sentimental se opõe às leis morais. Porque não sei se o Espiritismo é contra alguma coisa. O Espiritismo esclarece para libertar consciências, mas a pessoa guarda certa relatividade na sua liberdade. Então não direi que a Doutrina Espírita proíbe, direi que o aborto sentimental se opõe às leis morais.

Não é nada fácil para uma moça, uma mulher, trazer em sua cavidade uterina, na sua intimidade, um ser gerado em situações não desejadas, imprevistas, violentas, fruto de uma relação espúria, não nascido do amor, na entrega espontânea, buscada na plenitude fisiológica, emocional, espiritual. E ficamos a imaginar que a mulher está grávida de um estupro.

Eu atendi algumas mulheres estupradas. Pude perceber que elas são, até hoje, vivas-mortas ou mortas-vivas, porque se aniquilaram emocional e espiritualmente. Incapazes de nos olhar nos olhos. Sem coragem de enfrentar a vida com denodo, em virtude daquela ação violenta. Mas se ela conseguir manter a gravidez e levá-la a termo, que progresso extraordinário está realizando, estará se sublimando. Se isso não lhe for factível, depois de nascida a criança que a dê em adoção, é melhor que abortar.

Tramita no Congresso Nacional um outro inciso ao artigo 128 Projeto ou anteprojeto que permitirá à mulher abortar através de médico, até a 25a semana de gestação, desde que tenha sido diagnosticada anomalia física ou mental do feto em formação.

Tudo em nome da eugenia, (do grego eu, bem + genos, de origem, isto é, boa geração), ciência criada no século passado por Francis que viveu de 1822 a 1911. Esta nova ciência pretende o aperfeiçoamento físico, fisiológico e psicológico das raças. Há que se matar todo o ser que apresente uma deformidade, uma anomalia qualquer. Esta proposta não é nova no Brasil. Surgiu em 1984 através de portaria do Ministério da Saúde, mas tem precedentes na França, na Inglaterra e em outros países da Europa.

Em Roma já existia o extermínio de crianças com deficiência física. Eram mortas, pois não se prestavam aos fins bélicos do império romano. Constituíam-se em peso morto, pois o Estado tinha que arcar com o ônus na manutenção daquelas criaturas que nunca se prestariam aos interesses dos romanos, que dominavam o mundo, naquela época.

Na segunda Guerra Mundial, com Adolfo Hitler, nós sabemos do extermínio de milhões de pessoas em nome da eugenia, da etnia. Hitler anelava padronizar as pessoas humanas. Os filmes, a literatura, mostram as experiências que eram feitas para que todos tivessem olhos azuis ou verdes, e milhares de criaturas foram cegas e mortas em nome desta eugenia, etnia, cujo objetivo era a padronização das raças. O extremo da eugenia poderia levar muitas pessoas à morte por não alcançarem os padrões de estética, de plástica. Se alguém não estivesse dentro das regras de beleza, poderia ser morto.

O que teria sido do nosso Aleijadinho e de todos os nomes ilustres da nossa história e mesmo dentro da Doutrina Espírita, como Jerônimo Mendonça, Hellen Keller, este exemplo para a humanidade, surda, cega, muda, realizou um trabalho notável.

Hellen Keller soube que uma professora estava ensinando surdos e mudos a falar, e ela se interessou. Foi ter com Anne Sullivan que colocava o seu dedo na boca de Hellen Keller e colocava o dedo de Hellen na sua boca. Emitia sons e a discípula não ouvia, mas sentia a ressonância do som na boca de Anne Sullivan. Em uma semana a jovem já estava falando e disse: "Eu já não sou mais muda, já posso falar", e foi lutando a vida inteira contra as suas deficiências físicas. Viajou o mundo fazendo palestras e hoje se manifesta aqui, ali, alhures, livre das amarras físicas, demonstrando que as limitações são do corpo e não da alma.

Nada, portanto, poderia justificar o aborto eugênico. Vamos a algumas razões. Em nome do aborto eugênico o médico é quem praticaria o crime. Vejam que paradoxo! O médico, cuja profissão é salvar, preservar a vida, melhorar as condições físicas e psíquicas do homem, estaria a serviço da carnificina, transformando os nossos hospitais em matadouros.

É paradoxal. O Código de Ética Médica, no Brasil, é explicito: não é permitido práticas eugênicas ou eugenésicas, o Código de Ética Médica Internacional, o Código Lawyer Book depois do holocausto, fere a mentalidade médica. Em nome da eugenia se praticariam abusos. Qualquer gravidez indesejada seria interrompida. Bastaria que um ou dois médicos atestassem anomalia física ou mental no feto em gestação e o aborto estaria consumado. E cá entre nós, a Justiça ou a Polícia não tem meia técnica para desautorizar um atestado médico.

Para provar o contrário, precisaríamos de outro médico com coragem, independência de atestar outro diagnóstico contrário. Mas como realizar uma necropsia num ser que já está sepultado e decomposto? Tudo se invalida. Nunca se conseguiu, na prática, uma condenação por aborto. É necessária uma prova técnica, científica, palpável. Há ainda o risco de erro no diagnóstico. Será que a anomalia diagnosticada no feto não poderia ser revertida no futuro?

Fala-se, hoje, em terapia gênica, na possibilidade muito concreta de se introduzir genes sadios nas pessoas.

Fala-se, também, abertamente, em doenças genéticas, em mutações, transformações dos genes que poderão impedir alguém nascer com alguma deficiência. Os genes são corpúsculos invisíveis a olho nu, responsáveis pela transmissão aos descendentes das características físicas dos seus ancestrais. Porque os filhos se parecem com os pais no aspecto físico, na moral nem sempre, salvo se forem espíritos simpáticos, se estiverem no mesmo patamar evolutivo, com as mesmas tendências, com as mesmas aptidões. A parecença física depende das leis da hereditariedade. Os genes estão inseridos nos cromossomos que fazem parte das células. Através dos genes nós transmitimos aos nossos descendentes os caracteres físicos, não morais.

Estes genes, com o passar dos tempos, podem sofrer uma mutação, uma transformação, dando origem a uma doença genética. Pela terapia genética, assim como se faz um transplante de rim, de coração, pode-se introduzir genes saudáveis no organismo, em substituição aos genes doentes. Se o feto for portador de alguma anomalia, haverá a possibilidade de se reverter o quadro por esse processo e, assim, poderá ser evitado o aborto.

É a terapia genética vindo ao encontro da necessidade do aperfeiçoamento das raças.

A questão 692 de O Livro dos Espíritos mostra quão atual é este livro. Só não tem a expressão eugênica, que é um neologismo.

P. “O aperfeiçoamento das raças animais e vegetais pela Ciência é contrário à lei natural? Seria mais conforme a essa lei deixar as coisas seguirem o seu curso normal?

R. Tudo se deve fazer para chegar à perfeição. O próprio homem é um instrumento de que Deus se serve para atingir os seus fins. Sendo a perfeição o alvo para que tende a Natureza, o favorecer a sua conquista é corresponder àqueles fins."

A terapia gênica tem amparo moral. É perfeitamente factível, mas sabemos que também poderão ocorrer abusos, principalmente com os animais: ratos, camundongos, que servem à pesquisa científica.

A medicina fetal também invalida a necessidade do aborto, quando se detecta alguma má formação no feto. O médico abre o ventre materno, tira o nenê, submete-o à cirurgia, devolve-o à cavidade uterina, fecha o útero e a gravidez continua.

Todos são enfoques científicos, culturais para evitar o aborto eugênico.

Devemos também levantar a questão filosófico-doutrinária que tão bem esclarece.

O que é o corpo? É o instrumento que permite ao espírito reencarnante realizar o seu fanal, qual seja, o de construir a sua perfeição relativa. A vida orgânica, material, não é o fim em si mesma. O espírito pré-existe ao corpo e sobrevive a ele quando do recesso celular. Vivíamos antes da concepção e continuaremos a viver. Já estamos na imortalidade, não precisamos morrer para nos tornarmos imortais.

A deficiência física ou mental é reflexo das vidas anteriores. O espírito é que tem a deficiência. O corpo funciona como uma esponja, um escafandro e serve para limpar as impurezas.

Estamos aqui por pouco tempo e por mais que o corpo nos faça sofrer, que esteja doente, vai permitir ao espírito uma libertação.

E eu pergunto. O que é saúde? O que é doença? A definição será tão simples como parece? Chico Xavier, do ponto de vista físico, é considerado uma pessoa extremamente doente, no entanto, tem uma saúde espiritual de ferro. Hitler, perfeitamente saudável. Era vegetariano e Chico alimenta-se de carne, só para mostrar a relatividade das coisas.

O que é saúde, então? E como diz Jerônimo Mendonça "a doença do corpo trabalha a saúde da alma".

“É uma benção, um aguilhão benéfico", diz o Irmão X, porque dá ao espírito a condição de resgatar o passado.

Nem toda doença, porém, tem origens cármicas. André Luiz relata, num dos seus livros, o caso de uma jovem que reencarnaria num corpo escultural. Temerosa de que poderia "escorregar" de novo, pediu um “defeitozinho” para que não corresse o mesmo risco.

Muitas vezes, como diz Nancy Puhlmann di Girolamo, em seu livro “O castelo das aves feridas", existem espíritos que amam os excepcionais e pedem para vir excepcionais e servirem de cobaias de experiências científicas. Eles, que nada devem, auxiliam os que têm débito no passado.

Outro exemplo é o cego de nascença de quem os discípulos perguntaram à Jesus: - Mestre, quem pecou? E Jesus respondeu: - Nem ele nem seus pais.

E como explicar a cegueira deste homem? É provável que ele já era cristão antes de reencarnar e estava planejado de vir cego e ser curado pelo Mestre para contribuir a que os céticos cressem em Jesus. Muitos têm a missão de despertar os outros.

Se impedíssemos os espíritos de reencarnar por serem portadores de anomalias, eles não resgatariam o passado e não cumpririam a missão. Com todo respeito e carinho, será que Jerônimo Mendonça teria feito tudo o que fez se tivesse uma saúde perfeita? Os problemas ensinam, a dor é despertador.

O câncer, a AIDS, as deficiências estão na alma. Se a lei a que me referi for aprovada, consentindo o aborto eugênico, a Lei a Deus terá outras formas para se cumprir. Uma criança pode nascer sã, mas nos primeiros passos, num tombo bobo, torna-se deficiente. E não vai se matar um filho com um ano ou dois.

Se formos abortar, abortemos o orgulho, o egoísmo, a ambição, a vaidade, pais do aborto eugênico, defeitos esses capazes de nos concentrar na vida material.

Porque hoje somos valorizados pelo que temos, ou que carregamos, ou pela nossa beleza plástica, ou pela apresentação.

Jerônimo Mendonça é um exemplo notável. Portador de várias doenças ficou décadas numa mesma posição. Sua cama era seu banheiro, sua tribuna. Fundou dois centros espíritas, gravou muitas fitas e viajou por dezenas de cidades do Brasil. Escreveu cinco livros, fundou uma creche em Ituiutaba. Um espírito que, nesta condição, realizou tanto. Isto mostra que o corpo não impede a realização da alma.

Quantos sadios estão se comprometendo, perdendo a oportunidade excelente na ociosidade, na preguiça, na acomodação, enquanto outros vitimados por estas limitações vão à luta, superam-se pela fé, pelo amor, pelo desejo de servir, realizam obras notáveis.

Morgana, minha filha, tem 12 anos, l6 cirurgias, já extraiu um rim e é portadora de hidrocefalia, tem válvula no cérebro; não tem controle dos esfíncteres; não têm sensibilidade nos membros inferiores motores; vive na cadeira de rodas. Eu sou uma pessoa abençoada. Ela me ensinou a viver. Estou longe de viver como deveria viver, mas com ela, tenho certeza, sou bem melhor. Com ela, em nossa casa, tudo mudou, tudo ganhou beleza. Ela demorou dois anos para sentar pela primeira vez, sem cair do lado, quatro anos para ficar em decúbito ventral. Mostrou-nos o valor das coisas pequenas, que vamos de lá para cá, que nos sentamos sem perceber.

Se a minha filha veio para ficar, ela vai ficar. Não conto para despertar compaixão, mas para dizer que um filho excepcional é um excepcional filho.

 




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