Espiritualidade e Sociedade



Claudio de Moura Castro

>    Educação em áreas conflagradas?

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Claudio de Moura Castro
>    Educação em áreas conflagradas?

 

 

A ciência tomou corpo quando se descobriu ser mais fácil entender o mundo classificando o que vai aparecendo pela frente. Aristóteles deu a partida. Muito mais adiante, Lineu deu ordem à biologia, separando os bichos e plantas: “Esse de seis perninhas vai com o outro, também com seis. Ou, os que põe ovos vão juntos.” Assim separados, fica mais fácil estudar e encontrar outros traços comuns. Para E. Junger, a classificação das espécies da flora é uma metáfora suprema da razão.

Classificamos até em um campo inconsútil como a educação. Cada maneira de classificar chama a atenção para aspectos diferentes. Para entender os avanços e atoleiros do nosso ensino, proponho que pensemos nas escolas como pertencendo a três categorias. Há as escolas dos grotões, há as escolas das cidades médias e pequenas e, finalmente, há as escolas conflagradas das periferias urbanas.

Os grotões vivem o círculo vicioso da pobreza. A seu favor, são mundos fechados, onde cada um é cada um. Mas lá não se reconhecem as vantagens da educação, a tem pouca e não sentem falta de mais. A depender da sua própria dinâmica, nada vai mudar. Mas com um bom empurrão de fora, transformações são possíveis.

As cidades pequenas e médias vivem em um equilíbrio instável, do ponto de vista da educação. Se são minimamente dinâmicas e se têm um prefeito que acredita em escola – ou pelo menos, atrapalha pouco – têm tudo que precisam para avançar céleres, praticamente, por conta própria. Com o IDEB, sabem onde estão. Aos poucos, vão aprendendo os caminhos. Em um bom número delas, os avanços são admiráveis. Passaram na frente das capitais, com mais riquezas e mais tradições. E isso, em todos os níveis. Em São Paulo, até a pesquisa já é mais numerosa no interior do que na capital. Dentre elas estão os caso de sucesso na educação brasileira. Nem todas, mas muitas tomaram as rédeas nos dentes e dispararam.

Finalmente, temos as periferias das grandes capitais. Esse é o enguiço mais sério. Não faltam recursos, não faltam atenções. Contudo, estão travadas e perdendo espaço para as cidades menores.

O nó da questão é que são regiões conflagradas. A sociedade local ou teve seu tecido social dilacerado pelo crescimento rápido demais ou foi invadida por vagas de imigrantes desenraizados das suas comunidades e que não conseguiram se integrar na grande confusão das periferias.

Algumas são como praças de guerra, por seus problemas de insegurança, criminalidade, desemprego, pobreza e desintegração familiar. Nesses casos, faz sentido lembrar a hierarquia do psicólogo Maslow. Para ele, as pessoas só se fixam em certos objetivos de vida depois de que outros mais importantes já foram resolvidos. Insegurança física, desemprego e condições precárias de vida vêm antes de educação. Sem serem minimamente atendidos, pouquíssimos irão dar atenção ao ensino.

Portanto, a não ser que se pacifiquem essas periferias, estão fadadas ao insucesso as tentativas heróicas dos secretários de educação de agir nessas regiões. Simplesmente, são outras as prioridades, tais como sobreviver às guerras de gangues do narcotráfico.

Isso tudo nos leva à necessidade de políticas educativas diferentes para essas regiões. É preciso cuidar, simultaneamente, de uma boa coleção de problemas no entorno da escola. A tarefa ultrapassa o alcance das secretarias de educação. Porém, requer uma ação minimamente coordenada com elas. Polícia, assistência social, saúde e políticas de emprego têm que entrar em cena e agir de forma articulada.

Há boas experiências no Brasil e devemos aprender com elas. Mas citemos outro caso com grande visibilidade: Medellín. Chama atenção tanto pela virulência das guerras do narcotráfico que havia antes quanto pela pacificação conquistada por um bom prefeito.

Esta taxonomia simples nos permite orientações valiosas. Os grotões, quem sabe, podem esperar. Mas dá para ir lá e consertar. Nas cidades pequenas e medias, é cutucar os prefeitos lentos e recalcitrantes com respeito à educação. As outras vão quase sozinhas. Nas praças de guerra das periferias, só educação não resolve. Ou entramos com programas mais abrangentes, ou nada vai acontecer - além da repetição das conflagrações costumeiras.

 

 


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