22/07/2008
Governo adota terapia
comunitária em programa nacional de saúde
Experiência, que surgiu em favela de Fortaleza,
será expandida com a formação de 1,1 mil terapeutas
Emilio Sant’Anna
A terapia comunitária, experiência que
surgiu em 1987 numa favela de Fortaleza (CE), vai integrar a partir
deste ano o Programa Saúde da Família (PSF), do Ministério
da Saúde. Convênio firmado com a Fundação
Cearense de Pesquisa e Cultura destinará mais de R$ 2 milhões
para a formação de 1,1 mil terapeutas comunitários.
O treinamento será dado a partir deste mês em centros de
capacitação espalhados pelo País. “O objetivo
é conseguir uma aproximação ainda maior da comunidade”,
diz a representante do departamento de Atenção Básica
do ministério, Carmem di Simoni.
O PSF oferece hoje atendimento médico na área
de prevenção, serviço odontológico, mas
ainda não contava com a área de saúde mental. As
sessões de terapia comunitária têm regras simples:
um após outro, os participantes dão seus depoimentos.
Desfiam histórias de angústia, depressão, violência
e solidão. Alguns não falam nada, estão ali só
para ouvir. Outros falam sem parar, estão ali só para
serem ouvidos. Dali é escolhida uma história que será
debatida entre todos.
Hoje, mais de 12 mil terapeutas já trabalham
após serem treinados para conduzir as sessões. São
médicos, psicólogos, enfermeiros e agentes de saúde
que atuam em comunidades carentes, salões paroquiais, postos
de saúde, hospitais e empresas. O lema é o mesmo para
todos: “Quando a boca cala, os órgãos falam.”
Os casos mais freqüentes são estresse, conflitos
familiares, dependência de álcool e drogas, questões
ligadas ao trabalho, depressão e violência. No mês
passado, o Estado esteve em duas reuniões desses grupos e ouviu
o depoimento de pessoas em busca de acolhimento.
No Hospital Estadual de São Mateus, zona leste
de São Paulo, a experiência deu tão certo que todos
os dias é possível encontrar uma sessão de terapia
sendo realizada. Ali, não só a comunidade é atendida,
mas também funcionários, pacientes e familiares.
Uma das funcionárias é a assistente administrativa
Regina Martins, de 36 anos. Perdeu a mãe e a cunhada no mesmo
mês. No início da sessão, está calada. Uma
enfermeira fala do medo que sente quando a filha sai à noite.
Por ela, não sairia mais de casa. Regina pede a palavra, só
quer deixar um recado para o grupo. “Às vezes deixamos
de beijar nossa mãe e de dizer ‘eu te amo’ por bobeira”,
diz. “Depois que ela se vai, não dá mais tempo.”
Ela pára aí.
Para a surpresa de Regina, seu depoimento é o
escolhido para ser debatido no grupo. Enquanto a história é
detalhada, aparece uma mulher angustiada. A mãe bebeu por anos.
O resultado foi uma família desestruturada. Quando largou o vício,
veio o mal de Alzheimer. “Do jeito que estou conversando aqui
hoje, nunca conversei com ela”, desabafa.
ATENÇÃO BÁSICA
Não é necessário ter formação
superior para ser terapeuta comunitário, nem sequer trabalhar
na área da saúde. O trabalho desses terapeutas passa longe
da intervenção clínica, o foco está na diminuição
do sofrimento e promoção da saúde mental. “A
terapia comunitária acolhe, escuta, cuida e direciona melhor
as demandas permitindo que só sigam para os níveis secundários
de atendimento as que não foram resolvidas nesse primeiro nível
de atenção”, diz o psiquiatra Adalberto Barreto,
criador da terapia.
Acostumada com histórias como a de Regina, há
sete anos Maria Selma da Silva Nascimento, do Instituto Brasileiro de
Desenvolvimento da Pessoa Humana (IBDPH), coordena a implantação
de grupos de terapia em zonas carentes de São Paulo. “A
terapia age onde o Estado não dá conta, evitando os casos
de medicalização do sofrimento”, diz.
Fonte: Jornal O Estado de S.
Paulo – Sábado, 05 de Abril de 2008 – VIDA& -
Prevenção A34
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