13/05/2008
Ao estudar a atuação
de instituição dedicada a questões de violência
na família, pesquisadores da Unicamp desenvolvem metodologia
inovadora para assistência a conflitos.
Pesquisa resultou no livro
"Mediação familiar transdisciplinar"
Por Fábio de Castro
Agência FAPESP – Quando o assunto é
conflito de gênero, advogados, psicólogos e assistentes
sociais precisam intervir em conjunto. Essa é a proposta de uma
inovadora metodologia para mediação de conflitos familiares
apresentada no livro Mediação familiar transdisciplinar,
que acaba de ser lançado.
A obra foi o produto de um estudo realizado pelo Núcleo
de Estudos de População (Nepo) da Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp), que, durante três anos, estudou a experiência
de trabalho de uma instituição paulista dedicada, há
três décadas, à questão da violência
doméstica.
A pesquisa, coordenada por Maria Coleta Oliveira, professora
do Departamento de Demografia da Unicamp e pesquisadora do Nepo, teve
apoio da FAPESP, por meio do Programa de Pesquisa em Políticas
Públicas, e do Programa de Apoio a Projetos em Sexualidade e
Saúde Reprodutiva (Prosare) da Comissão de Cidadania e
Reprodução (CCR). Segundo a coordenadora, teorias de mediação
de conflitos desenvolvidas em várias partes do mundo têm
sido aplicadas em instituições voltadas para a violência
no contexto familiar.
“Muitas mulheres, ao sofrer agressão, vão
à delegacia. Mas, posteriormente, retiram a queixa, pois não
querem atrapalhar a vida dos maridos. Elas querem que eles mudem, que
não bebam, não batam, não quebrem as coisas, mas
não querem que sejam presos. Mediar uma situação
dessas não é algo trivial”, afirmou.
A pesquisa teve, inicialmente, o objetivo de fazer uma
avaliação qualitativa sobre o trabalho da organização
não-governamental PróMulher, Família e Cidadania
(PMFC). A instituição tem sua origem ligada ao nascimento
do movimento feminista em São Paulo e, historicamente, tinha
atuação voltada para a assistência jurídica
às vítimas de violência de gênero.
“Com o tempo, a instituição cresceu
e começou a atender não apenas as mulheres, mas também
homens e crianças. Seu corpo de técnicos passou a integrar
psicólogos, além de assistentes sociais”, disse
Maria Coleta.
Influenciada por teorias de mediação de
conflitos desenvolvidas em diversos países, a entidade começou
a desenvolver uma metodologia própria de atendimento para essas
situações.
“Há cerca de dez anos, a entidade firmou
convênio com a Procuradoria Geral do Estado, no segmento de assistência
judiciária. Pelo convênio, ela assumiu a defensoria em
São Paulo, atuando diretamente em cada comarca”, contou.
O livro agora lançado conta a história
da instituição, relata sua metodologia, discute os ideais
de justiça e promoção dos direitos humanos, define
o que é conflito de gênero e analisa os tipos de respostas
que normalmente aparecem nesses casos. Mas, acima de tudo, de acordo
com a coordenadora da pesquisa, a obra é um manual prático
para aplicação.
Foram feitos três estudos de caso. O primeiro
tratou do trabalho de assistência feito na sede da PMFC –
onde eram atendidos os casos mais dramáticos, que não
podiam ser resolvidos na procuradoria –, que utilizava uma metodologia
desenvolvida por eles.
O segundo estudo acompanhou o grupo de técnicos
– psicólogos e assistentes sociais – que atuava nas
dependências da procuradoria. O terceiro foi voltado para a população-alvo.
“Estudamos uma população que não fazia parte
da clientela atendida, mas que era equivalente do ponto de vista social.
Essa população serviu como grupo de controle”, disse
a pesquisadora do Nepo.
Inovação social
Os autores do estudo contaram com a consultoria de uma
especialista em avaliação de projetos sociais, a socióloga
Regina Faria. “Ela nos ajudou a delinear o projeto utilizando
um modelo que chamamos de avaliação formativa: à
medida que os resultados vão sendo produzidos, são introduzidas
alterações no atendimento. Com isso não era necessário
esperar que o projeto acabasse para que melhorias pudessem ser feitas”,
disse Maria Coleta.
Esse modelo, segundo a professora do Departamento de
Demografia da Unicamp, é coerente com a linha de pesquisa do
Projeto de Políticas Públicas da FAPESP, uma vez que a
tecnologia social gerada pode ser transferida para aplicação
na sociedade.
“A cada momento, a pequisa era discutida com as
equipes, para que elas aprimorassem as ações. A própria
característica da PróMulher, Família e Cidadania,
cujos técnicos tinham abertura para a constante reelaboração
dos procedimentos, facilitou essa tarefa. O tempo todo eles puderam
se expressar sobre pontos positivos e dificuldades encontradas”,
contou.
Foram realizados, então, workshops de treinamento
com os técnicos que estavam trabalhando e, no fim do processo,
com os defensores públicos que passaram a atuar depois. “Nos
workshops utilizamos a estrutura do que seria um programa de treinamento
para mediadores”, disse.
Na segunda parte, segundo Maria Coleta, o livro expõe
detalhadamente o método transdisciplinar resultante de toda a
pesquisa. “Basicamente, demos instrumentos para que advogados,
psicólogos e assistentes sociais possam agir em seus respectivos
setores de forma coordenada”, afirmou.
O livro dá recomendações práticas
para uma efetiva transdisciplinaridade, recomenda procedimentos técnicos
para o estabelecimento de acordos e apresenta dicas de linguagem e atitude,
além de sugerir uma bibliografia para aprofundamento na metodologia.
Um anexo traz ainda remissões a casos paradigmáticos,
em que alguns relatos de mediação de conflitos foram editados
e narrados. “O resultado é um verdadeiro instrumental de
trabalho, na forma de um manual bastante prático”, disse
a coordenadora do estudo.
A equipe de pesquisa teve cerca de dez profissionais
fixos e inúmeras contribuições. Além da
coordenadora, a organização do livro coube à socióloga
Sandra Unbehaum e às psicanalistas Malvina Muszkat e Susana Muszkat.
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