21/04/2008
Na Alemanha, o Islã
é freqüentemente associado ao fundamentalismo e ao fanatismo,
uma concepção que impõe pesado fardo sobre os 3
milhões de muçulmanos do país. Sua relação
com a sociedade ocidental é dividida entre a integração
e, às vezes, a exclusão auto-imposta
Norbert F. Pötzl
Der Spiegel
O nome do salão é alemão - Goldene
Finger (Dedos Dourados) - mas os serviços que oferece estão
listados na janela em árabe e turco. Na parte da frente da loja,
Roufic al-Rifae, palestino de 40 anos, trabalha como barbeiro. As mulheres
usando véus desaparecem nos fundos da loja, atrás de uma
cortina, onde as cabeleireiras cuidam de seus cabelos e da maquiagem
ao estilo árabe, traçando linhas grossas ao redor dos
olhos com o tradicional "kohl" do Oriente Médio.
Do outro lado da rua, o restaurante Ris A, especializado
em carnes grelhadas, faz propaganda de seu frango à "halal",
abatido de acordo com as regras religiosas islâmicas. O local
antes era uma franquia do McDonald's, com mesas e cadeiras de plástico
colorido e piso frio. Na cozinha visível em um dos cantos, 72
frangos são assados sobre o carvão em uma grande grelha
giratória. O nome do restaurante, explica o dono, um libanês
de 35 anos, "significa no Islã: 'O que Alá concedeu
a mim'."
A Al Sundus é uma loja especializada em "lingerie
árabe", narguilés árabes, conhecidos como
"shishas" borbulham no café El Salam, e as padarias
da vizinhança vendem bolos retangulares cobertos com creme branco
ou decorados com pistaches de um verde brilhante. Uma loja oriental
atrás da outra compõem a paisagem do extremo norte de
Sonnenallee, uma das ruas principais do distrito de Neukölln, em
Berlim.
Para alguns, Sonnenallee é uma rua de comércio
colorida e imprevisível. Outros ironicamente se referem a ela
como a Rua de Gaza.
A maioria das lojas que não estão nas
mãos dos árabes, pertence aos turcos: a padaria de Mehmet
Özçelik, que vende o doce baklava, uma agência de
viagens da Turkish Airlines; o supermercado administrado por Nazik Balabanoglu
e seu marido Ergin; a funerária de propriedade de Mustafa Mutlu,
em que o funcionário islâmico Cenaze Servisi providencia
o envio dos corpos de muçulmanos a seus países de origem
ou organiza seus funerais em um cemitério islâmico próximo
à grande Mesquita Shitlik na rua Bolumbiadamm, em Berlim. Os
turcos desempregados matando o tempo no Taxi Café chamam a vizinhança
de "Pequena Istambul".
Falar alemão não é um requisito
para a vida cotidiana nesse bairro de imigrantes, onde o cenário
das ruas conta com homens de barba usando tocas e mulheres com lenços
na cabeça. Entretanto, nem todas as lojas são turcas ou
árabes. Os alemães mais velhos se reúnem às
terças-feiras para noites dançantes no Zum Ambrosius,
um dos pubs tradicionais de Berlim, que parece exótico nesse
ambiente. Mas mesmo esse tradicional estabelecimento alemão foi
recentemente comprado por um descendente libanês.
Alguns consideram esse mercado do centro de Berlim pitoresco.
O Museu Neukölln, administrado pela prefeitura do distrito, agora
oferece tours pela "kiez", ou "vizinhança"
muçulmana. Abeer Arif, cidadão alemão nascido no
Iraque, é o encarregado do "Tour Oriental de Descobertas".
Mas há também um caráter opressivo,
característico de um gueto, nesse distrito comercial do Oriente
Médio no meio do bairro muçulmano mais povoado da Alemanha.
Cerca de 300 mil pessoas vivem no distrito de Neukölln,
a metade delas na parte norte, atravessada pela rua Sonnenallee. Um
terço da população de Neukölln é de
imigrantes - incluindo cerca de 60 mil muçulmanos, que estão
concentrados quase que exclusivamente no norte.
Só em Neukölln há 20 mesquitas, dentre
as cerca de 80 em toda Berlim. Poucas dessas casas de adoração
são reconhecidas como tal pelo lado de fora. A maioria fica atrás
de portões ou nos fundos de casas onde antigos prédios
de fábricas e oficinas foram convertidos em salões de
oração com tapetes de padronagem colorida. Doces, chá
e refrigerantes são vendidos nas lojas adjacentes.
Neukölln, como um espécime sob um microscópio,
é uma evidência significativa de algo que está lentamente
florescendo no resto do país: o Islã, essa misteriosa
religião, tão fascinante quanto alarmante, está
se consolidando na Alemanha, que agora é o lar de mais de 3 milhões
de muçulmanos. Mas a proximidade entre os alemães há
muito estabelecidos e os estrangeiros muçulmanos é também
uma potencial fonte de conflitos, gerando o ressentimento e o medo em
ambos os lados.
Desde que os ataques terroristas motivados pela religião
aconteceram em Nova York e Washington em 11 de setembro de 2001, muitos
alemães vêem a fé em Alá sobretudo como uma
ameaça. Há um medo crescente de que os jihadistas comecem
a lançar ataques e carros-bomba na Alemanha, um temor alimentado
em parte pelos alertas das agências de segurança alemãs.
Em meio a esse clima de medo, as suspeitas são facilmente generalizadas
para incluir todos os fiéis islâmicos, apesar do fato de
que provavelmente não há mais do que algumas centenas
de muçulmanos promovendo o terror na Alemanha.
Essas suspeitas, por sua vez, levam muitos muçulmanos
a se sentirem excluídos e rejeitados pela maioria alemã.
O ministro do Interior Wolfgang Schäuble vê isso como um
dos desafios centrais da política de integração.
Schäuble, que é membro da conservadora União Democrática
Cristã (UDC), enfatizou que "os muçulmanos são
parte da sociedade e do nosso futuro comum", durante uma conferência
sobre a imagem do Islã na Alemanha, em fevereiro. A dificuldade,
Schäuble aponta, está na tendência crescente por parte
do público em considerar o Islã como sinônimo de
fundamentalismo e fanatismo.
O primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan não
ajudou muito a causa da integração com sua retórica
recente. Falando para uma multidão animada de quase 20 mil turcos,
alguns deles já naturalizados cidadãos alemães,
na Arena de Colônia duas semanas antes da conferência de
fevereiro, Erdogan alertou seus compatriotas para não irem longe
demais em seus esforços de integração. "Ninguém
pode esperar que vocês se submetam à assimilação",
disse. "Porque a assimilação é um crime contra
a humanidade."
Ninguém pediu aos turcos para se submeterem à
assimilação, que significaria a remoção
total da identidade cultural e religiosa. Mas as conseqüências
da recusa em se integrar à sociedade de maioria alemã
são bastante aparentes nas vizinhanças em torno de Sonnenallee,
em Neukölln.
A área é um símbolo de um bairro
conflituoso. Um em cada dois moradores está desempregado. O número
de roubos e assaltos mais do que triplicou desde 1990.
Neukölln é um bom lugar para experimentar
a "sociedade paralela" em primeira mão. Foi o prefeito
do distrito, Heinz Buschkowsky, 59, um social democrata convicto, que
primeiro cunhou esse termo tabu - e que foi imediatamente criticado
por sua suposta violação do politicamente correto. O professor
de sociologia Hartmut Häussermann, irritado, foi rápido
em informar ao político local que seria preferível que
ele se referisse aos imigrantes muçulmanos como uma "colônia
étnica". "Agora, você diria que isso de um termo
mais agradável?", Buschkowsky perguntou em resposta.
O termo "sociedade paralela" é parte
de uma "semântica do pânico" que generaliza exceções
óbvias, diz Klaus J. Bade, historiador e especialista em imigração
de Osnabrück, no noroeste da Alemanha. Na melhor das hipóteses,
diz Bade, a política migratória da Alemanha, que "foi
por muito tempo contrária à imigração",
levou os imigrantes a se isolarem. "Um país relutante em
relação à imigração não deveria
ficar tão surpreso ao descobrir que seus imigrantes às
vezes também são relutantes."
Há alguma verdade nisso. Durante décadas,
poucos na Alemanha se interessaram pelos novos moradores e cidadãos
muçulmanos do país. "Nem a maioria da sociedade nem
os próprios imigrantes viram qualquer motivo para se interessarem
uns pelos outros e para desenvolverem regras de comportamento para viverem
juntos", escreve o especialista em Oriente Médio Michael
Lüders em seu livro "The Long Shadow of Allah" ("A
Extensa Sombra de Alá"). "Ambos os lados acreditavam
que sua interação seria apenas temporária."
Quando a Alemanha começou a recrutar "trabalhadores
convidados" no início dos anos 60, esperava que eles ficassem
no país por um período de tempo limitado e depois voltassem
para casa. Na Turquia, os "gurbecti", como são chamados
os turcos que vivem no estrangeiro e querem voltar para casa, acostumaram-se
com um sistema em que esperam que outros turcos cheguem à Alemanha
para substituí-los.
Mas os trabalhadores da primeira geração
decidiram ficar na Alemanha, estabelecer novas famílias e trazer
seus parentes turcos para morar com eles. Há cerca de 2,7 milhões
de pessoas de origem turca vivendo na Alemanha hoje, e cerca de 800
mil desses são cidadãos alemães.
Durante anos, a Alemanha também atraiu imigrantes
muçulmanos de outros países, especialmente da Bósnia,
Irã, Marrocos, Afeganistão, Iraque e Líbano. Entretanto,
é difícil saber o número exato de muçulmanos
que hoje vivem na Alemanha porque as autoridades de imigração
não pedem aos imigrantes que declarem sua crença religiosa
e porque o Islã não tem um sistema de registros de associação.
Pela mesma razão, as congregações muçulmanas
são incapazes de especificar quantos membros têm.
De acordo com a Conferência Alemã Islâmica
(CAI), há cerca de 3,4 milhões de muçulmanos na
Alemanha hoje, tornando o islamismo a segunda maior religião
do país depois do cristianismo, e os muçulmanos fazem
parte da vida cotidiana da Alemanha. Eles trouxeram Alá, Deus
para os muçulmanos, para a Almanya, como o país é
chamado tanto em turco quanto em árabe.
Assim como não se conhece o número de
muçulmanos, não se sabe quantas seitas religiosas diferentes
há dentro do Islã. O cientista político Stefan
Luft, da cidade portuária de Bremen no norte da Alemanha, enfatiza
que os imigrantes "não são um grupo homogêneo
em nenhum sentido, seja religioso, étnico, político ou
cultural." O espectro de imigrantes, diz Luft, vai desde os bósnios
relativamente cosmopolitas e acadêmicos ocidentalizados de cidades
como Istambul e Teerã a fazendeiros conservadores da Anatólia
e militantes islamistas da Arábia Saudita e Afeganistão.
A vasta maioria dos imigrantes muçulmanos vive
de forma discreta entre seus vizinhos alemães há muito
estabelecidos. Apesar disso, muitos alemães têm problemas
em aceitar as graduais mudanças em sua sociedade e o fato de
estarem em contato físico com uma cultura moldada pelas regras
do Alcorão. Isso é porque o Islã, segundo Lüders,
"é tanto uma religião quanto um modo de vida para
os devotos muçulmanos."
Cada vez mais os alemães consideram o Islã
como sinônimo de fundamentalismo e de uma tendência à
violência e opressão da mulher. "As percepções
já eram negativas no passado", concluiu um estudo de 2006
pelo instituto de pesquisa de opinião Allensbach, "mas se
tornaram visivelmente mais ameaçadoras nos anos recentes".
De acordo com o estudo da Allensbach, 98% dos alemães associam
o Islã com violência e terrorismo, enquanto apenas 6% expressam
simpatia pelo Islã. 61% não acreditam que o Islã
pode coexistir pacificamente com o cristianismo, enquanto 83% consideram
os muçulmanos fanáticos religiosos.
Ironicamente, os muçulmanos na Alemanha "tendem
a ser mais relaxados em relação à religião",
diz Katajun Amirpur, um especialista em estudos islâmicos de Berlim.
De acordo com Amirpur, a religião "não tem um papel
tão dominante" na vida cotidiana dos imigrantes, ainda que
eles se considerem como muçulmanos devotos - mesmo que "ocasionalmente
bebam um copo de Arrak ou Raki" e "algumas vezes esqueçam
uma oração ou outra durante o dia". No que diz respeito
a desobedecer aos mandamentos de sua fé, eles se colocam facilmente
ao lado dos seus colegas cristãos.
Entretanto, um novo zelo religioso parece estar tomando
forma entre os muçulmanos. O Centro de Estudos Turcos, sediado
na cidade de Essen no oeste da Alemanha, estudou o apego religioso dos
imigrantes de descendência turca durante muitos anos. Em 2000,
apenas 8% dos entrevistados descreveram a si mesmos como "estritamente
religiosos". Em cinco anos, esse número cresceu para 28%.
"Nosso reflexo antiislâmico", dizia
o editoral do jornal Süddeutsche Zeitung, não enxerga "que
os fatores que realmente deveriam ser motivo de preocupação
são principalmente seculares e não religiosos: o estabelecimento
de uma sociedade paralela que vive de acordo com regras insulares; a
taxa de crescimento populacional acima da média dos imigrantes
e, finalmente, a estrutura autoritária das famílias dominadas
pelos homens."
O prefeito distrital de Neukölln sabe uma ou duas
coisas sobre o assunto. "Não estou qualificado para falar
sobre se o Islã tem lugar na Europa. Isso é para outros
discutirem", diz ele. Em vez disso, ele prefere falar sobre os
problemas comuns e cotidianos: sobre pais que proíbem suas filhas
de participar de aulas de natação e viagens com os colegas
de escola; e sobre mulheres de 18 anos de idade que são enviadas
da Turquia como "noivas importadas, porque o patriarca da família
não gosta das mulheres esclarecidas que trabalham no banco turco
de Neukölln".
Os valores tradicionais dos imigrantes muçulmanos
são reforçados pelos veículos de mídia de
seus países de origem. Ao dirigir de Neukölln para o vizinho
Kreuzberg, famoso distrito multicultural de Berlim, atravessa-se o bairro
de Kottbusser Tor. A praça central do lugar é cercada
por prédios de apartamentos de muitos andares, quase que exclusivamente
habitados por famílias turcas. Há antenas parabólicas
em quase todas as varandas.
Mais de 40 canais em língua turca estão
disponíveis hoje na Alemanha. A seleção de canais
em língua árabe, assistida nas casas, cafés e instituições
culturais, é só um pouco menos variada.
Opções populares e relativamente inócuas
são os canais de entretenimento turcos como o Kanal D, ATV e
Show TV, com suas novelas e vídeos musicais. Mais problemático
é o conteúdo religioso de canais como o Iqra, sediado
na Arábia Saudita, e alguns dos programas transmitidos pela Al-Manar,
uma estação de TV operada pelo Hezbollah no Líbano.
O TV5, canal alinhado com a Milli Görüs, uma influente organização
islâmica na Alemanha, recentemente transmitiu uma versão
turca da série iraniana anti-semita "Zarah's Blue Eyes"
("Os olhos azuis de Sara").
Pastores televisivos como o clérigo egípcio
Yusuf al-Qaradawi, de 81 anos, encontraram um ouvido atento, especialmente
entre os jovens muçulmanos. A Al-Jazeera, estação
de TV sediada no Qatar, transmite seus sermões sobre questões
legais e moralidade islâmica em horário nobre todos os
domingos, como parte do programa "Sharia e a Vida".
Qaradawi é considerado o líder de um islamismo
moderno. Ele se apega ao conceito tradicional de casamento, e mesmo
ao direito de bater nas esposas "insubordinadas", e mesmo
assim encoraja as mulheres a entrarem na política. Ele recomenda
uma vida islâmica mais aberta, que inclua computadores, filmes
e música, mas também dá conselhos sobre a forma
correta de se usar o véu.
Seus ensinamentos ambivalentes também são
bem recebidos na Alemanha. No livro "Between Pop and Jihad"
("Entre o Pop e a Jihad"), a jornalista Julia Gerlach escreve
que entre os muçulmanos na Alemanha "desenvolveu-se uma
nova cultura jovem em que não é visto como contradição
ser um devoto muçulmano e um bom cidadão alemão.
Os muçulmanos pop podem parecer relaxados em termos de comportamento,
mas raramente são liberais."
Seus ídolos musicais se expressam de modo tão
ambivalente quanto. O astro pop turco-alemão Muhabbet (cujo nome
verdadeiro é Murat Ersen), de 23 anos, especializado em música
soul do Oriente Médio ("R'n'Besk"), foi celebrado como
garoto-propaganda da integração bem sucedida - até
levantar controvérsias com seus comentários ambíguos
sobre o assassinato do diretor de cinema holandês Theo van Gogh.
Em novembro passado, Muhabbet gravou uma música
em um estúdio de Kreuzberg com os ministros das relações
exteriores da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, e da França,
Bernard Kouchner, com um refrão provocativo que dizia: "Alemanha,
por que você se fecha? Alemanha, coloque suas cartas sobre a mesa.
Você pensa que eu vou desistir, você pensa que eu não
vou resistir, e você pensa que eu vou calmamente e silenciosamente
me deitar sobre o seu chão?"
O rapper mais conhecido da cultura pop islâmica
na Alemanha chama a si mesmo de "Ammar 114". O número
é uma referência a um trecho do Alcorão sobre recorrer
a Alá em tempos de perigo e conflito. O artista de 28 anos nasceu
na Etiópia, vêm de uma família cristã e se
converteu ao islamismo.
As letras de Ammar são com freqüência
bastante religiosas, mas também refletem o que o jornal Frankfurter
Rundschau chama de "uma mistura tensa de emoções
hostis". Sua música "Wir sind Deutschland!" ("Nós
somos a Alemanha!") pode ser interpretada como um comentário
furioso sobre o debate público da integração dos
muçulmanos: "Nós somos a Alemanha, com certeza, somos
parte dela. E é hora de finalmente termos os nossos direitos."
À medida que alguns jovens muçulmanos
indignados viram as costas para o que eles vêem como uma cultura
decadente alemã, alguns cultivam sentimentos de superioridade.
Enquanto seus pais e avós imigrantes tentaram assimilar a cultura,
pelo menos superficialmente, alguns jovens muçulmanos deliberadamente
ostentam o fato de que são diferentes usando roupas estritamente
muçulmanas em público.
Os jovens criminosos muçulmanos cujos atos de
violência estão freqüentemente no noticiário
estão se rebelando contra a sociedade majoritária à
sua própria maneira. Eles chamam as vítimas de seus ataques
brutais de "alemães de merda" e "comedores de
porcos", e chegam ao ponto de ocasionalmente xingar os policiais
alemães de descendência turca de "cristãos
de merda". Günter Piening, o comissário de integração
do governo estadual de Berlim, acredita que o que está por trás
dos insultos é um "processo de desenvolvimento da identidade",
e que os vândalos muçulmanos estão simplesmente
agindo a partir das letras violentas dos rappers.
Já no elegante bairro de Kreuzberg, "onde
a situação geral é discutida entre garrafas de
Veuve Cliquot" e onde "a burguesia intelectual de esquerda
criou seu próprio enclave", diz o prefeito distrital de
Neukölln ironicamente, muitos ainda acreditam em um "mundo
multicultural idealizado", apesar de que, segundo ele, esse mundo
não existe nem mesmo no diverso Kreuzberg.
Buschkowsky prefere adotar o "princípio
fundamental" de Ferdinand Lassalle, um dos fundadores originais
do partido que deu origem aos Sociais Democratas Alemães (SPD),
de centro-esquerda: "Toda ação política começa
com a articulação das coisas tais como elas são."
Mantendo-se fiel a essa doutrina, Buschkowsky, além de estabelecer
centros de línguas e contratar trainees imigrantes para trabalhar
na prefeitura, ajudou a lançar um projeto nacional único
patrocinado pela Diakonisches Werk, uma organização beneficente
da Igreja Protestante Alemã, que ganhou o Prêmio de Prevenção
da Comissão Estadual contra a Violência de Berlim no outono
passado.
De acordo com o programa, "as mães de bairro"
- jovens mães de descendência turca e árabe - visitam
as jovens famílias de imigrantes e oferecem aconselhamento sobre
temas relacionados à saúde e educação das
crianças. Os organizadores do programa esperam que as mães
de bairro, que já experimentaram o sentimento de serem forasteiras
e passaram pelo difícil processo de integração,
possam chegar àqueles que dificilmente seriam alcançados.
Há atualmente 80 mães de bairro em Neukölln,
e o programa inclui planos de ter 200. As mulheres passam por seis meses
de treinamento para essa tarefa. Cada mãe de bairro visita duas
famílias por mês. Cada família recebe dez visitas,
e cada visita dura entre uma hora e meia e duas horas.
Güler Savran, 34, esteticista por formação,
é uma das mães de bairro. Ela mora no bairro de Rollberg,
em Neukölln, e conhece bem os problemas da área: sabe que
a violência tem um papel fundamental em muitas famílias,
que apenas uma em cada duas crianças em idade pré-escolar
freqüenta o jardim da infância e que as mulheres não
podem tomar nenhuma decisão sem seus maridos.
Muitas famílias têm medo das agências
e instituições governamentais. Muitos temem que o departamento
para o bem-estar dos jovens os esteja espionando ou até mesmo
tirando as crianças das famílias. Para reduzir esses temores,
Savran deixa claro na primeira visita à família que ela
não trabalha para o departamento de bem-estar dos jovens.
"A maioria das perguntas são sobre a alimentação",
diz a mãe de bairro Djamila Boumekik, uma nativa da Argélia
de 31 anos de idade.
Muitos muçulmanos temem que suas crianças
sejam obrigadas a comer carne de porco nas creches, ou acreditam que
a única razão das creches é fornecer comida e um
lugar para as crianças dormirem.
"Quando ouço isso, digo a eles que as
crianças saem em pequenas excursões, fazem trabalhos
manuais, pintam e brincam", diz Boumekik.
Além disso, ela acrescenta, as creches ajudam
as crianças a aprenderem alemão.
Os homens, normalmente céticos, reagem a esse
último ponto.
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