Ademir
L. Xavier Jr.
> As duas opções (por Michael Prescott)
Apresentamos uma tradução para
o português do texto de Michael Prescott
"The two options" (1
-
original) que discorre de
uma forma lógica sobre teorias que competem com as explicações
espíritas para os fenômenos mediúnicos. Em particular,
o que me chamou a atenção neste texto foi a brilhante
classificação das 'teorias de super-psi' como uma
variedade de "teoria da conspiração" e,
portanto, sua impossibilidade de refutação. Pedimos
autorização ao autor para a tradução
apresentada logo abaixo. Adicionamos alguns comentários na
parte final.
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por Michael Prescott
Como os leitores assíduos desse
blog sabem, existe uma variedade sugestiva de evidências
da sobrevivência da consciência depois da morte. Algumas
delas, naturalmente, são mais persuasivas do que outras, mas,
quando se olha para a totalidade da pesquisa, é fascinante ver
como várias investigações convergem para a mesma
conclusão.
Entre tais evidências estão as experiências de quase
morte, experiências fora do corpo induzidas, aparições
e assombrações, comunicações espontâneas
e induzidas após a morte, mediunidade, memórias espontâneas
de vidas anteriores reportadas por crianças, alegadas memórias
de vidas passadas e de existência entre vidas descritas por adultos
hipnotizados e fenômenos de vozes eletrônicas. Isso não
é uma lista que pretenda ser completa. Tenho certeza que deixei
de lado poucas coisas.
De novo, não digo que todas essas linhas de investigação
são igualmente convincentes: por exemplo, a regressão
hipnótica pode ser problemática porque sujeitos hipnotizados
tem a tendência de confabular. E muito dos fenômenos de
vozes eletrônicas se parecem mais com ruído do que com
vozes de fato, pelo menos para mim. Mesmo assim, quando olhamos tudo
de uma perspectiva maior, acho que apenas duas alternativas podem explicar
a totalidade dessas evidências.
A primeira e mais óbvia explicação é que
a consciência realmente sobrevive à morte, ao menos por
certo tempo e, em alguns casos, reencarna (2).
A segunda explicação possível é que existe
um tipo de conspiração cósmica em operação
- um esforço orquestrado pelo subconsciente coletivo da humanidade,
ou por demônios enganadores, ou por qualquer outra força
preternatural - uma conspiração para nos convencer de
que sobreviveremos à morte quando, de fato, isso não irá
acontecer.
As alternativas não materialistas à sobrevivência
se classificam todas de certa forma nessa segunda categoria. Defensores
de superpsi (ou super ESP, 3) essencialmente
dizem que poderes desconhecidos da mente (4)
estão nos enganando (Fig. 1) para
diminuir nosso medo de morrer. Alguns fundamentalistas religiosos dizem
que a mediunidade e experiências de quase morte são obra
do demônio para nos afastar da ortodoxia.
Agora, o ponto sobre teorias de conspiração é que
elas são impossíveis de se refutar. Não importa
quanta evidência for reunida, elas sempre irão reforçar
a ideia; o devotado teórico conspiracionista simplesmente dirá
que a evidência é parte da conspiração. Por
exemplo, algumas pessoas acreditam que a aterrissagem na lua foi uma
fraude feita em estúdio (5). Se
se afirmar que astrônomos no mundo inteiro rastrearam a trajetória
da espaçonave Apolo, eles irão afirmar que tais astrônomos
fazem parte do jogo conspiratório. Se for mostrado que rochas
foram trazidas da Lua e analisadas por especialistas, será dito
que tais especialistas, por sua vez, também fazem parte da conspiração.
Quanto mais evidência for apresentada, tanto maior terá
que ser a conspiração, o que não é um problema
para o teórico da conspiração, que se encanta com
a ideia de que ele é a voz solitária da verdade e lucidez
a lutar contra chances improváveis.
Não estou a dizer que conspirações nunca ocorrem.
Obviamente, houve conspirações ao longo da história.
Por exemplo, uma conspiração foi feita para assassinar
o imperador Júlio César. Mas, ela não permaneceu
oculta por muito tempo e não envolveu um número grande
de pessoas. Houve um tipo de conspiração para evitar que
o público soubesse de benefícios recebidos por Franklin
Roosevelt durante o seu mandato e que o casamento de John Kennedy era
basicamente uma farsa. De novo, tais montagens envolveram um número
limitado de pessoas e foram eventualmente descobertas depois.
O problema das teorias de conspiração com explicações
de tudo é que, não somente elas nunca podem ser refutadas,
mas também elas invocam um sentido de incapacidade, passividade
ou cinismo. Se o mundo todo existe para nos consumir, então,
nada podemos fazer para escapar, a não ser alimentar o desespero.
Quando nos voltamos para uma ideia como super-psi, encontramos uma teoria
de conspiração que é ainda mais difícil
de refutar do que qualquer outra. Por definição, super-psi
envolve potencialmente o subconsciente de todo mundo - qualquer pensamento
ou sentimento que quem quer que seja tenha tido ou irá ter um
dia.
Mas, é possível ter muito mais que isso! Se recursos combinados
de mentes subconscientes de todos os seres humanos estão envolvidos
em perpetrar uma charada, e se tais recursos não reconhecidos
são imensamente maiores do que se pode imaginar, então,
tal conspiração será capaz de produzir literalmente
qualquer evidência necessária, ao mesmo tempo que suprimirá
qualquer outra que lhe seja contrária.

Fig. 1 Pe O. G. Quevedo que se especializou em usar hipóteses
da superpsi e fraudes em seu combate ao Espiritismo.
O grosso de sua argumentação sustentava-se na ideia de
que a mente tem recursos desconhecidos ou que não é confiável.
Como M. Prescott pondera, tais explicações não
têm caráter científico porque são irrefutáveis,
sendo melhor classificadas como variedades de teorias de conspiração.
Isso não apenas significa que nunca poderemos saber a verdade
sobre a vida após a morte. Significa que jamais saberemos a verdade
a respeito de qualquer coisa. Não podemos confiar em
nossas mentes, já que, no nível mais profundo, ela foi
criada para nos enganar. Não podemos confiar na percepção
de ninguém, incluindo na nossa própria. Se levarmos super-psi
a sério ou, de outra forma, se acreditarmos que qualquer evidência
que contradiga nosso sistema de crenças foi fabricado por demônios
para testar nossa fé, ou criado por 'fantasmas devoradores de
almas' para nos entorpecer antes do abate final, ou por alienígenas
desejosos de nos observar em tubos de ensaio, então, nunca haverá
chance alguma de usar tanto nossa faculdade de raciocínio como
recorrer às evidências para saber a verdade.
Então, ficamos assim. Assumindo que encontramos evidências
da sobrevivência que são razoavelmente convincentes e que
não podem ser explicadas de outra forma como observações
incorretas, fraudes, lendas urbanas ou
'wishful thinking' etc, estamos diante de uma escolha básica.
Podemos aceitar a evidência pelo seu valor de face, na hipótese
de que o Universo é essencialmente benigno (6)
e que nossas mentes são, em princípio, capazes de discernir
a verdade a respeito das coisas (7). Ou,
podemos assumir que a evidência é o resultado de gigantesco
trabalho conspiratório, sendo que o Universo é essencialmente
maligno e nossa consciência e mente racional são, em princípio,
incapazes de saber a verdade de qualquer coisa.
Concordo que não há jeito de se, definitivamente, decidir
entre as duas alternativas (8). De alguma
forma, ela depende de nossa visão sobre a existência ser
basicamente otimista ou pessimista. Seria o Universo amigável
ou será que ele existe para nos consumir? Seria a vida uma aventura
ou um pesadelo? Haveria espaço para esperança ou somente
o medo?
Isso está de certa forma relacionado ao que William James chamou
de 'desejo de acreditar', o seja, a necessidade de se tomar um ato de
fé no ponto onde o raciocínio não consegue mais
ir além. Cada um de nós deve tomar esse passo a mais em
uma ou outra direção, por nós mesmos.

Michael Prescott
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Referências e comentários
(1) Michael Prescott's blog: http://michaelprescott.typepad.com/michael_prescotts_blog/
(2) Numa visão puramente empírica,
isto é, ditada pelas 'evidências', não há
bases para se afirmar que todos reencarnam e nem que todos reencarnam.
(3) Com explicado por Prescott em seu texto, a teoria
de 'super-psi' é uma das alternativas 'não espíritas'
e 'não materialistas' aos fenômenos psíquicos. Resulta
de um desenvolvimento de teorias do subconsciente que chegam ao extremo
de refutar a sobrevivência usando da ideia de 'orquestração
inconsciente' e 'super-mente'. Como também explicado por Prescott,
essas teorias caem na categoria de 'teorias de conspiração'
e são incapazes de produzir qualquer previsão de fenômeno.
(4) No Brasil, nos anos 80-90 foi bastante conhecida a campanha do clérigo
jesuíta Oscar G. Quevedo contra o Espiritismo usando essencialmente
conspiração de super-psi nos casos mais difíceis
de se refutar e uma variedade de explicações do tipo 'fraude'
nos considerados 'mais fáceis'. Por isso, a importância
do texto de Prescott. A 'teoria do demônio' é tratada com
brilhantismo por Allan Kardec em "O Livro dos Médiuns",
Primeira Parte - Noções preliminares, Capítulo
IV - Dos sistemas.
(5) Sobre isso, ver também nosso texto: "Crenças
Céticas XXI: Será que o homem pousou na Lua?".
(6) O texto de Prescott torna possível perceber a visão
puramente empírica que alguns espiritualistas considerados 'científicos'
sustentam. Para eles, a verdade deve vir, por indução,
a partir da mera observação dos fenômenos. Porém,
a fenomenologia psíquica representa uma espécie de 'esquina'
para o pensamento, uma vez que, para sua correta explicação,
exige a adoção de uma postura filosófica
sobre o Universo que é dispensável nas explicações
dos fenômenos materiais. Para a física, química
etc, não é necessário que o Universo seja 'benigno',
mas apenas que ele seja 'racional'. Prescott torna evidente porque Kardec
iniciou a apresentação das questões aos Espíritos
em 'O Livro dos Espíritos' - que é a
obra fundamental do Espiritismo - pela questão 'O que é
Deus?'
(7) Esse é o ponto de vista da ciência.
O Universo pode ser explicado racionalmente, isto é, conhecendo-se
as causas, é possível explicar os efeitos e nossas mentes
não estão sendo enganadas.
(8) Na visão empírica do autor, deveria
ser possível colher evidências adicionais sobre esse caráter,
que torne discernível qual é a opção correta.
Obviamente, a discussão aqui toca questões metafísicas
que estão além da busca meramente empírica e que
são, na Doutrina Espírita, tratadas de forma conveniente
pela contraparte filosófica. O Universo é benigno porque
Deus - como causa primária de todas as coisas - é bom.