Moisés – primeiro inquisidor
Sempre quando ouvimos falar
em inquisição, lembramo-nos da criada pelo Concílio
de Verona, em 1183, pela qual se iniciaram os vergonhosos atos
praticados pelos católicos contra os que não comungavam
a sua crença, e que se tornou prática comum contra
os hereges. Aliás, ainda têm o disparate de dizer
“Santa Inquisição”, embora, com os
requintados métodos de tortura usados pelos “homens
de Deus”, certamente, causaria inveja até ao próprio
“satanás”. Mas, muito antes disso, um homem
tido como profeta de Javé já havia instituído
o “ou crê ou morre”, como forma de impor suas
idéias a um povo. Obviamente, como todos que agem assim,
sempre dizem que, com tais práticas, estão agindo
em nome da divindade.
Quem possui um espírito
investigativo, livre de preconceitos e dogmas, perceberá
que, baseando-se em registros históricos, o primeiro
inquisidor foi Moisés, embora isso possa parecer estranho;
mas é a mais pura verdade, mesmo que ele não tenha
usado os “recursos” da inquisição,
iniciada no século XII e que se estendeu até ao
século XVIII.
A primeira vez que Moisés
usou métodos ortodoxos contra seu povo para lhe impor
suas “verdades” foi quando, após demorar
quarenta dias e quarenta noites no Monte Sinai, o povo hebreu
resolveu construir um bezerro de ouro (Ex
32,1-6). Para quem dizia acreditar num Deus único,
houve uma mudança de idéia muito rapidamente.
Mas o que se percebe desse episódio é que houve
um retorno às práticas religiosas utilizadas no
Egito, quando adoravam o deus Ápis, que era representado
por um touro. O que fez Moisés diante dessa atitude?
Manda triturar e moer tal bezerro de ouro, cujo pó coloca
na água, obrigando o povo a beber dela (Ex
32,20). Depois disso, dizendo-se porta-voz de Javé
(Ex 32,27), manda matar três
mil homens (Ex 32,28), esquecendo-se
de que, debaixo dos seus braços, ainda trazia as tábuas
com o Decálogo, no qual havia o “não matarás”.
Interessante é que,
quando da instituição de suas leis, “os
Dez Mandamentos”, Deus não estabeleceu nenhuma
pena de morte para quem não os praticassem; apenas abençoava
ou amaldiçoava os que, respectivamente, os seguissem
ou não (Lv 26,3-13; 14-45; Dt 11,26-28).
As maldições eram castigos relacionados às
coisas ruins que aconteceriam em relação aos atos
de sua vida cotidiana. Não sendo tão rigoroso
quanto dizem, recomendou práticas religiosas - sacrifícios
de animais imolados em holocausto -, para os que viessem a descumpri-los,
especificando aquelas que deveriam ser feitas pelo sacerdote,
pela comunidade, pelo chefe, pelo homem comum, demonstrando
os níveis de responsabilidade de cada um desses infratores
(Lv 4,1; 3-4; 13-15; 22-24; 27-29).
Ora, o que é para nós
um fato indiscutível é que Deus não muda
de opinião (Ml 3,6); assim,
qualquer atitude neste sentido, só poderá vir
dos homens que atribuíram a Ele coisas que, na verdade,
são suas. Portanto, se Ele havia instituído o
“não matarás”, jamais poderá
mudar de atitude. Diante disso, então, poderemos ver
que Moisés foi o primeiro inquisidor, ao impor a ferro
e fogo suas verdades, usando um método convincente de
persuasão: a pena de morte. Em sua legislação
passou a vigorar tal pena máxima, para os seguintes atos:
para quem ferisse uma pessoa e lhe causasse a morte (Ex
21,12; Lv 24,17), para quem ferisse o seu pai ou a sua
mãe (Ex 21,15) ou quem os
amaldiçoassem (Ex 21,17, Lv 20,9),
para o seqüestrador (Ex 21,16),
para os que trabalhassem no sábado (Ex
31,15; 35,2), para os adúlteros (Lv
20,10), para quem blasfemasse contra o nome de Javé
(Lv 24,16) e para quem oferecesse
sacrifícios a outros deuses (Ex
22,19 combinado com Lv 27,29).
Mesmo diante dessas evidentes
atitudes pessoais por parte de Moisés, ainda há
indivíduos que atribuem tudo isso como se fosse de Deus.
O que será que acontece? Será que abdicaram de
sua capacidade de raciocinar? Não percebem que, por conta
dessa maneira de pensar, acabam por amesquinhar a Deus? Até
quando iremos ver pessoas assim?... Só mesmo apelando
para Jesus que certamente diria: “Pai, perdoa-lhes; porque
não sabem o que fazem” (Lc 23,34).