Estava preparando um estudo para
o Grupo Scheilla, em Belo Horizonte, quando me deparei com o texto
abaixo, ditado pelo espírito Lamennais, ao Sr. Didier (1861):
“As
ideias mudam, mas as ideias e os desígnios de Deus, nunca.
A religião, isto é, a fé, a esperança,
a caridade, uma só coisa em três, o emblema de Deus
na Terra, fica inabalável em meio às lutas e preconceitos.
A religião existe, sobretudo nos corações,
e assim não pode mudar. É no momento em que reina
a incredulidade, em que as ideias se chocam e entrechocam, sem
proveito para a verdade, que aparece esta Aurora que vos diz:
Venho em nome do Deus dos vivos e não dos mortos; só
a matéria é perecível, porque é divisível,
mas a alma é imortal, porque una e indivisível.
Quando a alma do homem se enfraquece na dúvida sobre a
eternidade, ela toma moralmente o aspecto da matéria; ela
se divide e, por conseguinte, é submetida a provas infelizes
nas suas novas reencarnações. A religião
é, pois, a força do homem. Diariamente ela assiste
às novas crucificações que inflige ao Cristo.
Diariamente ela ouve as blasfêmias que lhe são atiradas
à face, mas, forte e inabalável como a Virgem, ela
assiste divinamente ao sacrifício de seu filho, porque
possui em si a fé, a esperança e a caridade. A Virgem
desvaneceu-se ante as dores do Filho do Homem, mas não
está morta”.
Allan Kardec faz uma avaliação
muito curiosa dos ditados desse espírito, que foram agrupados
sob o título "Meditações filosóficas
e religiosas". Ele entende que Lamennais, longe de ser um espírito
perfeito, traz muitas das questões de sua última encarnação,
que são passíveis de crítica, mas entende também
que seus ditados podem ser proveitosos, por isso os publica. Encontramos
citações dos ditados de Lamennais em O Livro dos Espíritos.
Veja a posição do codificador:
"Sem dúvida há
em suas comunicações muitas coisas boas e belas,
em termos de idéias e de estilo, mas há, evidentemente,
as que podem ser submetidas à crítica, e pelas quais
não assumimos nenhuma responsabilidade. Cada um tem a liberdade
de aproveitar o que achar bom e rejeitar o que parecer mau. Só
os Espíritos perfeitos podem produzir coisas perfeitas.
Ora, Lamennais, que sem contradita é um Espírito
bom e elevado, não tem a pretensão de já
ser perfeito, e o caráter sombrio, melancólico e
místico do homem incontestavelmente se reflete no do Espírito
e, consequentemente, nas suas comunicações."
Independente da avaliação
de Kardec sobre Lamennais, esse e outros ditados, nessa época,
fizeram refletir ao Mestre Francês, que escreveria que o espiritismo
entraria em seu período religioso. Kardec percebeu-se que,
além das ideias sobre a vida após a morte e as evidências
empíricas, era necessário o desenvolvimento de uma
reflexão ética no contexto do espiritismo, o que fez
com que publicasse, daí a três anos, "O evangelho
segundo o espiritismo".
Para conhecermos quem foi esse espírito, retirei algumas
informações convergentes de duas ou três fontes
diversas na internet que sintetizo abaixo:
Desencarnado em 1854,
Félicité Robert de Lamennais passou a comunicar-se
nas reuniões da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas
e foi muito citado por Allan Kardec ao longo de sua obra.
Lamennais foi um escritor e padre que
viveu na França entre 1782 e 1854. Do ultramontanismo (católico
muito conservador), ele se interessa pelas ideias liberais, como
a separação entre o estado e a igreja, a liberdade
de consciência, do ensino, da imprensa e de associação,
voto popular e direito de insurreição do povo.
Censurado pelo estado e pelo próprio
Papa, em duas encíclicas, Lamennais passou a dedicar-se
ao povo, e a escrever pelo socialismo e pela república.
Ele é considerado por diversos autores um precursor do
catolicismo social. Em sua época a ideia de socialismo
estava associada à melhora das condições
de vida da população trabalhadora.