Quando alguém avalia uma
pessoa por sua condição de exaustão física,
atributo próprio da velhice está, na realidade, avaliando
um espírito, e, nem todos se dão conta disso. Um espírito
traz seu acervo de vivências desta e de outras existências,
e, por isso, o avaliador, nem sempre foca o conteúdo, mas
apenas as precárias manifestações das forças
físicas, como se estas estivessem a atravancar a pressa das
enfermidades do mundo e como se o mundo fosse regido pela plenitude
física de seus habitantes.
É o estado social da humanidade, como decorrência do
progresso intelectual e moral até então realizado,
que espelha a condição do mundo, e a plenitude física
pouco contribui para essa condição.
O estado social atual da humanidade mostra, embora as valiosas conquistas
humanas ao longo da História, o quanto ainda a sociedade
humana tem que caminhar rumo ao seu grandioso destino. Não
são as forças físicas e sim as do coração
e da sabedoria que levarão a esse destino.
Nos primeiros estágios do desenvolvimento da humanidade as
forças físicas prevaleciam. O homem era ditado mais
pelos instintos do que pelo sentimento e a razão. A conquista
e a luta pela sobrevivência imediata eram necessárias.
Nessas condições, o planeta, ainda bruto, não
podia prescindir das forças da natureza através das
convulsões geológicas e também da ação
do próprio homem e dos animais de então, para tornar-se
saneável e promover a habitabilidade. Pouco se sabe sobre
a velhice daqueles tempos. Provavelmente éramos velhos novos,
o que significa que nem chegávamos a envelhecer diante de
tantas adversidades no enfrentamento de uma natureza inóspita.
O vigor físico e o agrupamento eram condições
de sobrevivência. A experiência humana ensaiava os primeiros
passos. Éramos apenas artífices do futuro a entalhar
com sangue e suor a sociedade que hoje conhecemos. Hoje as necessidades
são diferentes e a própria configuração
do homem é outra. Analisar o velho pela sua condição
física demonstra uma visão espiritual apequenada.
É deixar de entrever a beleza da história da realização
do ser, que se projeta por trás do olhar vivaz do rosto lívido
e enrugado. Precisamos de um novo agrupamento. O da fraternidade,
onde todos tenham oportunidades de ser úteis. A sociedade
moderna já não necessita da subjugação
pela força e os tempos da barbárie já são
idos. Precisamos valorizar a todos. Nossos velhos, assim como nossas
crianças e jovens, são nossos melhores valores. Há
pontos de contato entre eles, embora nem sempre haja contato, mormente
quando a indiferença faz morada nos corações.
Criou-se-lhes até uma categoria: a da terceira idade. Categorização
louvável, para o tempo da Terra. Porém, sua idade
espiritual é insondável e não categorizável,
pois que, a vida do espírito é uma só, no conceito
da imortalidade da alma e das vidas sucessivas na jornada terrena.
Muito do que temos e sabemos, nesta vida, devemos a eles. Eles voltarão
– almas antigas em planos novos, em nova existência
para novas vivências na Terra, como é da Lei, exatamente
como aqueles que hoje os desprezam voltaram e aqui estão
e, quiçá, serão velhos também, um dia.
O velho é o oposto da criança; muitos deles, com suas
belas criancices.
Uns chegando ao mundo – as crianças, embalados pelos
sonhos da infância, com seus potenciais de experiências
a realizar.
Outros – os velhos, ocupados intimamente com a partida, vivendo
com intensidade o tempo que lhes resta, levando na bagagem suas
realizações de virtudes; valores imperecíveis,
porque são tesouros dos céus, onde a traça
não corrói. E, no âmago do ser, elevando sua
gratidão por tudo aquilo que viveram e por todos com quem
conviveram. Trazem no brilho do olhar as expectativas do encetamento
de novas práticas da vida nas trajetórias terrenas
futuras, e o regozijo do anseio por antigos reencontros afetivos
no retorno aos braços dos que não vieram a acompanhá-los
nesta jornada ou dos que partiram antes. É que já
descobriram o valor da velhice e a amplitude da vida do Espírito;
imortal vida.
Em sua sabedoria, se antecipam à saudade que advirá
dos que prosseguem na marcha terrena, amando na velhice seus entes
queridos e amigos como nunca dantes. Levarão o amor na lembrança.
Mais belo ainda esse amor, se correspondido.
Como isolá-los, então?
Não é melhor amá-los, no entrelaçamento
desse grandioso amor?
Oh! Deus, como nosso coração
é mesquinho. Ensina-nos a amá-los!
Indiferentes à indiferença
do mundo, sabem que Deus, em sua infinita sabedoria, deu netos para
alegrá-los e isso lhes ascende à Vida. As lutas agora
são outras. São as lutas do encantamento; do não
deixar passar os momentos felizes, singulares da velhice; momentos
únicos. Por isso, precisam ser bem vividos.
As crianças, simbolizando
a pureza da alma, não têm a pressa e a sagacidade da
pressa que a vida impõe impiedosamente ao homem do mundo
e, por isso, curtem os seus velhos e ouvem encantadas seus contos,
renovando com seus encantos, os avós desprezados da vida.
Os velhos, para serem velhos, devem
aprender a envelhecer. Resignarem-se diante do exaurir gradual das
forças e das ofensas do mundo; mas não se deixarem
abater, renascendo para a própria vida em forma do vivenciamento
intenso de seus anseios mais nobres em correlação
com as suas forças. Afinal, agora velhos, já não
estão mais presos às convenções e aos
deveres. Já têm tempo e sabem o que melhor lhes dignifica
esse novo tempo; tempo que só os velhos têm. Deus é
sábio e deu-lhes a decrepitude quando já não
lhes é mais exigida a luta acerba do dever da sustentação
da família. Deu-lhes a oportunidade do vivenciar mais belo,
sem a exigência da força física de outrora,
que ficou consubstanciada em outras lidas.
É preciso que os homens,
à semelhança de Deus, sejam revestidos de sabedoria
para vivenciarem os seus velhos; beberem as suas ricas experiências
do sentir e do saber.
Feliz dos velhos que têm netos
e filhos amorosos, pois já não terão que experimentar
o fel da indiferença, oferecendo, em contrapartida a esse
amor, o seu próprio amor.
Desrespeitar os velhos é
não considerar o amanhã.
O velho de hoje, foi, em tempo ido,
se bem vivido, o servidor de todos e, por isso, está apto
ao galardão de maior entre todos, na assertiva de Jesus:
“Quem quiser ser o maior dentre vós, seja o servidor
de todos”.
Não desprezemos, pois, os
que promoveram as nossas vidas e que hoje as enchem de amor.
Feliz daquele que valoriza e ama
os velhos do mundo. Feliz do velho que viveu a vida bem vivida e
vive agora o esplendor da velhice com o espírito jovem, cheio
de vida.
Ouçamos como as crianças,
a história do vovô! Saboreemos o bolo da vovó!
O mundo certamente será mais doce e mais poético.
E vós, que possuis o privilégio
de ainda conviver com eles, já abraçou os seus velhos
hoje?