“A Terra produz bastante
para nutrir, a todos os seus habitantes; quando os homens souberem
administrar os bens que ele dá, conforme as leis de justiça,
de caridade e de amor ao próximo; quando a fraternidade
reinar entre os diversos povos,... o que é momentaneamente
supérfluo para um, suprirá a momentânea insuficiência
do outro, de modo que todos terão o necessário”.
Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XXV, item 8
“Numa sociedade organizada
segundo a lei do Cristo ninguém deve morrer de fome.”
Resposta dos Espíritos a Questão 930 de o Livro
dos Espíritos.
Observando o mundo atual constatamos facilmente a existência de
grandes contradições, onde o homem, a cada instante, embora
demonstre ter alcançado elevado padrão de desenvolvimento
tecnológico, ignora em sua grande maioria os valores essenciais
de sua natureza espiritual, gerando grandes divergências de opinião,
dificultando a sua caminhada evolutiva.
Pois, como nos mostrou a socióloga Cleusa Colombo também
no movimento espírita brasileiro, existem as divergências
de opiniões, que dificultam a união dos espiritistas e
a unificação do movimento espírita na aplicação
do método kardequiano. (1)
Na área da Assistência e Promoção Social
Espírita não é diferente. Há divergências
de opiniões e interpretações a cerca de como deve
ser a atuação do movimento espírita em relação
a questão social.
Há, por exemplo, os que apoiam basicamente uma caridade assistencialista
- filantrópica; Há, os que se dedicam ao estudo dos fenômenos
e suas implicações, entendendo que não cabe ao
Espiritismo o atendimento social e assistencial às massas menos
favorecidas socialmente. E há ainda, outros que acreditam na
transformação da humanidade, através de um entendimento
tríplice da Doutrina Espírita, em que para estes Ciência,
Filosofia e Religião se entrelaçam indissoluvelmente,
entendendo que a caridade deve transcender o assistencialismo, e que
o movimento espírita deve ter uma atuação mais
efetiva, influindo nas estruturas sociais, e contribuindo para a promoção
do homem, usando a educação como instrumento de progresso
moral e espiritual.
No que se refere ao social, Kardec nos afirmava que:
“A questão social
depende inteiramente do melhoramento moral do indivíduo e das
massas,...”.(2)
Esclareceu ele ainda, que;
“A educação
é o conjunto de hábitos adquiridos e que é através
da educação que as massas menos favorecidas melhorarão
economicamente”.(3)
Neste sentido o Espiritismo assume a
posição de que a questão social está intimamente
ligada às questões moral e espiritual, sem divisão
entre a realidade social e a realidade espiritual, e a evolução
do homem integral, entendido como ser moral que se manifesta na sociedade,
determina a evolução das relações sociais.
Para Kardec:
“o progresso é uma
sucessão de fatos morais e sociais determinados pelas relações
entre o elemento espiritual e o elemento material”.(4)
Na visão do reformismo social
cristão, enfatiza que a questão social moderna transcenderá
o âmbito econômico-social, apontando cada vez mais para
a esfera espiritual e cultural.
Já o Espiritismo visando promover a transformação
da humanidade, utiliza-se do mecanismo da reforma moral dos indivíduos.
Herculano Pires, no entanto, acentua; “esta reforma deve ser
profunda, não superficial”.(5)
Parte ele do princípio de que, “o mundo e, por conseguinte
a humanidade, é o reflexo do homem e que para obtermos um mundo
transformado, ou um verdadeiro mundo de luz é necessário
acendermos a luz das almas”. (5)
Diz ainda que; “Isso, por si só, não basta,
é preciso, ao mesmo tempo em que, acendemos a luz das almas,
devemos fazê-la brilhar no meio social em que vive, pois as almas
iluminadas iluminam a sociedade”. Considera ainda, Herculano;
que “essa iluminação se dará através
da Educação, cuja Pedagogia consiste em ensinar e dar
o exemplo, (5) seguindo o modelo do Cristo”.
Também o Espiritismo partindo do conceito de que os sistemas
sociais se criam de acordo com a evolução dos homens,
não concorda que esta reforma, ou mudança seja feita de
forma abrupta e impositiva, mas sim de modo gradual e permanente. É
preciso que haja tempo para a assimilação das novas idéias.
Kardec acentua:
“Não se transforma
o coração dos homens por decreto. (6)”.
Na visão espírita, conforme
nos demonstra Denis,
“A educação
da alma é a finalidade última, o fim supremo da evolução
humana”. (7)
Portanto, a solução dos
problemas sociais, segundo o Espiritismo, está baseada na Pedagogia,
constituindo-se a educação no instrumento desta transformação.
Entende ainda, que é através da educação
que se conseguirá libertar o homem, induzindo-o a prática
da caridade, da solidariedade, do amor ao próximo, do combate
ao orgulho e ao egoísmo. Pois como Kardec, afirmava:
“Nada se opõe mais
à liberdade e a fraternidade, do que o orgulho e o egoísmo”.(8)
Por isso, para o Espiritismo o caminho
para a solução dos problemas sociais está na Pedagogia
da transformação moral do homem e da sociedade. Isto significa
que os problemas sociais, na sua essência, são problemas
morais.
Ainda, partindo do raciocínio de que o exercício da solidariedade
é lei universal que liga todos os seres humanos, a prática
da caridade deve transcender o assistencialismo, atuando nas estruturas
sociais e culturais, transformando a mentalidade dos homens. Sendo por
isso importante investir na Educação, proporcionando à
criança, jovens e adultos, uma formação cultural
apoiada na mais positiva e completa base espiritual, que mostre a insensatez
das concepções materialistas.
Outro aspecto a ser observado em relação à questão
social é a falta de cuidado com o ser humano, estigma de nosso
tempo. Esta falta ocorre em todos os sentidos. Portanto, cabe a nós
espíritas, neste terceiro milênio, construir um novo paradigma
de convivência, inaugurando um novo modelo de assistência
e promoção social, estabelecendo um pacto social, de respeito
e preservação a tudo que existe e vive, buscando alternativas
que representem uma nova esperança. Leonardo Boff nos alerta,
“O grande mal desta civilização é o descuido,
o descaso, o abandono, numa palavra, a falta de cuidado. Há um
descuido manifesto pelo destino dos pobres e marginalizados da sociedade.”
(9)
Assim, acima de qualquer combate à classes sociais e estruturas
econômicas, o Espiritismo deve atuar no campo social, transformando
o homem, por dentro, tornando-o capaz de moralmente realizar a construção
de uma sociedade mais justa, contribuindo na formação
de um homem consciente de suas responsabilidades com a vida, com o mundo,
com o meio ambiente, com a sociedade, com o próximo, com Deus
e consigo mesmo.
Mostra ainda, o Espiritismo, através da leitura de suas obras
básicas, que a ação mais agradável a Deus,
é a da caridade.
“Mas não dessa caridade
fria e egoísta que consiste em espalhar em torno de si a sobra
de uma existência nababesca, mas da caridade cheia de amor,
que vai ao encontro do infeliz e o levanta sem humilhar...”
Segue dizendo;
“Não repudies as
lamentações receando ser enganado, mas vai à
fonte do mal. Alivia primeiro, depois informa-te e verifica se o trabalho,
os conselhos, mesmo a afeição, não serão
mais eficazes que a esmola”. (10)
Esclarece ainda, o Espiritismo as relações
que há entre o corpo e a alma, e afirma; “Que por serem
necessários um ao outro, é preciso cuidar de ambos”.
(11) Contempla assim, o homem na sua totalidade:
Espírito e Corpo.
Portanto, a assistência e promoção social espírita
constituem-se, hoje num instrumento de interação com a
sociedade, de que dispõe o Movimento Espírita, veicula
a mensagem espírita, exercendo o seu papel transformador, levando
o consolo, esclarecimento, iluminação, assistindo àqueles
que passam pela difícil prova da privação material,
espiritual e moral. Deve assim, o Movimento Espírita levar o
atendimento emergencial, mas, acima de tudo, deve contribuir para a
promoção e elevação moral e, por conseguinte,
social do indivíduo e da família, através da educação.
Referências
Bibliográficas:
(1) COLOMBO, Cleusa Beraldi, 1937-1997. Idéias
Sociais Espíritas. São Paulo. Editora Comenius e IDEBA,
1998
(2) KARDEC, Allan - Obras Póstumas – Credo Espírita.
Rio de Janeiro. Federação Espírita Brasileira;
(3) KARDEC, Allan - Livro dos Espíritos – 3ª. Parte
- Lei do Trabalho. Rio de Janeiro. Federação Espírita
Brasileira;
(4) MARIOTTI, Humberto. O Homem e a sociedade numa nova civilização.
São Paulo: Edicel, 1967.
(5) PIRES, J. Herculano. O Reino – São Paulo – LAKE
– 1946.
(6) KARDEC, Allan – Obras Póstumas – São Paulo
– Edicel – 1971.
(7) DENIS, Léon Revue Spirite (Journal d´études
psychologiques) Paris : Janeiro e Dezembro, 1924.
(8) KARDEC, Allan – Livro dos Espíritos – São
Paulo – LAKE, 1980.
(9) BOFF, Leonardo – Saber Cuidar – Ética do Humano.
Petrópolis, ED. Vozes,1999.
(10) KARDEC, Allan – Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XVII,
item 11. FEB.
(11) KARDEC, Allan – Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XVI,
item 11. FEB.
* o autor é Administrador e Diretor do Departamento
de Assistência e Promoção Social Espírita
da FERGS
Fonte: http://www.cvdee.org.br/artigostexto.asp?id=138
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