Desde suas origens a Pesquisa Psíquica ou Parapsicologia sofre
ataques e preconceitos, seja por seu caráter fantástico,
pela dificuldade ou impossibilidade de se reproduzir alguns de seus
achados em ambiente controlado ou pela subjetividade de certos fenômenos.
O fato é que a Parapsicologia, definida como o estudo de certos
fenômenos psíquicos de origem supostamente sobrenatural
e associados à experiência humana, analisa a natureza das
faculdades mentais, sendo estas não totalmente compreendidas
por seus estudiosos. Tais fenômenos desafiam muitas vezes as crenças,
o senso comum e o establishment científico atual, o materialista.
A possibilidade de que o conhecimento pose ser obtido por vias anômalas
e de que a mente possa ser um substrato não redutível
às funções sistêmicas sempre foram alvo de
ataques por céticos e críticos. O que muitos ignoram é
que várias experiências controladas e observações
fenomenológicas foram replicadas vastamente, eliminando a possibilidade
de fraudes e explicações "normais". Entretanto,
persiste um véu de desconhecimento ou mesmo de ignorância
acerca dos achados, levando o grande público a um completo estado
de ausência de tais achados.
Assim, como foi exposto dias atrás, seguiu-se
uma discussão no site de relacionamentos Orkut, entre este autor
e um físico. Este último não se disse cético
e nem se colocou contra a Parapsicologia. Na verdade, houve um questionamento
de que se as observações feitas em torno dos fenômenos
deveriam ganhar destaque em revistas mainstream, algo que este
autor considera totalmente desnecessário ou mesmo, inútil.
Ver-se-á que o debatedor incorreu em vários erros e contradições,
não só em relação à Parapsicologia,
mas na forma correta com que a ciência deve ser conduzida. Vale
ressaltar que o autor cometeu um erro quando se valeu do argumento da
autoridade, mas conforme será verificado adiante, a intenção
do mesmo foi completamente distinta. O debate foi longo e, em partes,
repetitivo. Para não ser redundante, resumi os pontos-chave da
argumentação pró e contra e os temas mais polêmicos.
Inicialmente, foi questionada uma experiência
onde indivíduos separados em Gaiolas de Faraday, aparato que
parcialmente bloqueia ondas eletromagnéticas, e sem contato visual
apresentavam coincidência em seus eletroencefalogramas (EEG) de
70%, sugerindo fortemente PES (percepção extra-sensorial).
O debatedor não concedeu grande importância ao achado afirmando
que Gaiolas de Faraday não isolam totalmente as radiações
eletromagnéticas. Entretanto, tal argumento não refuta
a possibilidade de PES uma vez que foi apenas questionada a capacidade
de isolamento das gaiolas e não a transferência de informação
via anômala. Apesar de alguns autores levarem a sério tal
possibilidade, creio ser improvável que a PES se dê por
ondas eletromagnéticas, do contrário penso ser esperado
que muito mais pessoas possuiriam faculdades paranormais. No entanto,
agentes psíquicos fortes são bastante raros. Na verdade,
o estudo sugeriu que a PES ocorreu de forma similar à não-localidade,
uma vez que os registros dos EEGs foram simultâneos.
Em seguida o debatedor fez um reforço do paradigma
materialista, insistindo que graças a ele houve grandes avanços
visíveis hoje em nossa sociedade, ao passo que o esoterismo,
o misticismo, a religião e as pseudociências (creio que
ele incluiu a Parapsicologia nesse rol) em nada contribuíram
para o desenvolvimento científico. Notadamente, houve uma confusão
entre Materialismo e método científico. Aqueles que advogam
pelo Materialismo crêem que outros paradigmas sejam incapazes
de fazer a mesma abordagem. No entanto, diversos autores e estudiosos
se valem do mesmo método científico para postular explicações
alternativas que forçam ao máximo o paradigma materialista.
Logo, deve-se separar Materialismo de método científico,
como coisas distintas e não sin equa non. Em nenhum momento foi
feita qualquer defesa de crença ou credo pelo autor.
Depois, cometi um erro parcial que se mostrou mínimo
no transcorrer da discussão. Afirmei que a opinião de
dois físicos, Harold Puthoff e Russel Targ, em questão
era em prol da existência dos fenômenos paranormais, respaldando-os
por serem dois dos inventores do Laser. O debatedor me acusou de ter
usado o argumento da autoridade. E ainda devolveu-me o argumento da
autoridade com outro, perguntado quais seriam as opiniões dos
inventores da Física Quântica e de vencedores do Nobel.
Em tempo, me vali desse discurso não visando expor o argumento
da autoridade, mas sim mostrar que cientistas de renome e gabarito consideram
seriamente tais possibilidades e as investigam. É interessante
constar que é lugar comum entre os céticos, embora nunca
admitido, o argumento da autoridade, uma vez que em suas refutações
sempre se valem das opiniões de seus "ídolos",
que também fazem pouco das evidências e não conferem
a devida atenção a elas. Como réplica, além
de frisar a minha intenção com esse argumento, respondi
que existem, sim, vencedores do Nobel que defendem a existência
de fenômenos paranormais, com destaque recente para Brian Josephson,
renomado físico britânico.
Honestamente, não considerei esses argumentos
lógicos, racionais e científicos. Não é
necessário que se creia em determinado assunto para que ele se
torne cientificamente tangível. A ciência, antes de tudo,
deve ser imparcial. A intenção de refutar uma determinada
hipótese, através de pesquisas, tem o mesmo valor de prová-la
em positivo, caso seja factual. Em relação aos financiamentos,
Dean Radin, PhD, teve grande parte de suas pesquisas financiadas pela
Bell Corporation, conglomerado norte-americano das comunicações.
Suas pesquisas foram bastante frutíferas, com excelentes resultados
estatísticos, inclusive para achados pré-cognitivos. Lembrei
a ele também que a atitude cética de hoje é tão
deletéria quanto os mais fundamentalistas dogmas religiosos e
que a legítima ciência não é feita somente
por interesses econômicos.
O debatedor usou depois de um preceito de LaPlace que
quanto mais forte for a alegação, mais forte deve ser
a prova ou evidência. Além disso, também comentou
que são os que acreditam em algo que devem se esforçar
para provar o que sustentam. Com relação à primeira
assertiva, penso tal fundamento ser subjetivo, uma vez que a força
de um caso ou evidência está aos olhos de quem vê,
sendo que um indivíduo de mente aberta (não quer dizer
crédulo) possa julgar aquilo que possa ser convincente em potencial.
O fato de quem alega é quem deve provar é um fato, porém
pseudocéticos em muito se esforçam para negar e sempre
sem estar a par das evidências. Se por um lado o que o debatedor
falou é correto, por outro é deturpado pela comunidade
científica em geral. Afirmei também que em muitos casos
a ciência nasce da dissidência, citando os exemplos de Horace
Wells, dentista inventor da anestesia, que se matou após uma
demonstração fracassada, e Albert Wegener, proponente
da Teoria da Deriva Continental, hoje conhecida como Teoria das Placas
Tectônicas. Reforcei ainda que a Parapsicologia possui suficiente
corroboração estatística e casuística para
justificar suas pesquisas, lembrando também que Carl Sagan, célebre
cientista e cético, julgou que alguns atos ditos paranormais
mereciam ser investigados.
Outro argumento do debatedor que considero bastante
questionável foi a comparação entre os estudos
das Neurociências e da Parapsicologia, sendo que, segundo suas
palavras, a primeira é bem mais estudada e escrutinizada que
a segunda, como se esta última fosse uma ciência recente.
Tal afirmação denotou falta de conhecimento em relação
à Parapsicologia, e para refutar tal argumento lembrei que a
Parapsicologia existe desde o século XVIV e que em 1967 ela foi
aceita como ciência legítima pela AAAS (American Association
for Advancement of Science). Além disso, pesquisas sérias,
como as de Ian Stevenson sobre CORTs (cases of reincarnation type) existem
há 40 anos, por exemplo. Mostrei a ele também que ilustres
figuras do meio científico, incluindo ganhadores do Nobel, já
investigaram ou investigam a fundo os fenômenos paranormais.
Um ponto em comum entre o autor e o debatedor é
com relação ao excessivo entusiasmo na relação
entre Física Quântica e Parapsicologia. Muitos místicos
e religiosos estão se valendo dessa associação
para proclamar suas crenças. Na verdade, tudo ainda é
especulação e ainda não existem provas substanciais
dessa correlação. Contudo, ressaltei que muitos cientistas
sérios, incluindo físicos, contribuem com modelos para
que se desenvolvam teorias, visando uma Parapsicologia séria
e racional.
Discutimos bastante acerca do Materialismo. Penso que
este paradigma, conforme consta hoje, é insuficiente para elucidar
completamente a natureza da nossa realidade. Se a relação
matéria/energia pode explicar de forma parcimoniosa a totalidade
dos fenômenos, então se deve estender em muito o atual
conceito de matéria. A própria Consciência, juntamente
com seus temas acessórios (memórias, experiência
de primeira pessoa, volição e criatividade) não
são devidamente explanadas por modelos fisicalistas. Considero
que, caso o paradigma esteja incompleto, ele deve ser redefinido. Se
estiver errado, deve ser abolido.
Posteriormente, o debatedor afirmou que não havia
publicações sobre temas parapsicológicos em revistas
de peso. Tal afirmação é uma tremenda falácia,
especialmente se constatarmos que existem tais publicações
em revistas não só voltadas ao público da Parapsicologia,
mas também em revistas médicas e de ciências naturais.
Mostrei um rol de publicações em periódicos respeitabilíssimos,
como Journal of Mental e Nervous Disease e The Lancet. Como um mal-sucedido
ad-hoc, o debatedor afirmou que faltavam publicações em
revistas de "maior" peso como Nature, Science e PNAS. Este
autor discordou plenamente, pois todas aquelas outras também
são peer-reviewed e têm grande valor científico,
com a diferença de que são destinadas a públicos
específicos e que não há sentido em "melhor
ou pior revista". Além disso, revisores de artigos científicos,
geralmente, têm interesses pessoais, bem como a própria
revista em relação aos seus patrocinadores. Isso pode
minar a possibilidade de um artigo "subversivo" ser publicado.
Ainda assim, com hesitação, mostrei a ele publicações
parapsicológicas em revistas que ele considerava de "peso"
como a Science e Nature. A hesitação se deu porque eu
discordo totalmente do argumento do debatedor por razões já
descritas previamente nesse parágrafo.
A tônica maior da discussão se deu em torno
da alegação do debatedor de que a Parapsicologia andava
de mãos dadas com as pseudociências e que, se existissem
tão boas evidências delas, deveriam estar mais difundidas
e documentadas. Em contrário, afirmei que isso não é
uma falsa visão. O Brasil, no que tange à Parapsicologia,
sequer tem representatividade consistente e existe todo um lobby contra
tais estudos por uma maioria de cientistas céticos. Esses raramente
avaliam a evidência e, quando o fazem, é de forma parcial.
Mais comum ainda é a negação de tais evidências
por "achismos" e por "visões que não condizem
com a realidade". Tais falácias são verdadeiros atos
de fé, sem qualquer embasamento científico e baseados
no argumento da autoridade.
Durante todo o debate pude observar que o debatedor
não é um indivíduo dogmático e discutiu
com distinção. Ele argumentou de forma madura, sem ataques
ou ad hominens, o que é raro em discussões desse tipo.
O que ficou claro é que uma grande parcela do público,
mesmo os mais intelectualizados, desconhece os ostensivos dados sobre
a Parapsicologia, seja ela laboratorial ou de campo. Infelizmente nem
todos os debatedores aceitam, com a devida educação, argumentar
em um tema tão espinhoso. Fica registrado um elogio a um crítico
que, mesmo falhando em alguns pontos, soube ser honesto e racional em
tão polêmica contenda.
topo