Por: IHU Online
A Agência Adista,
20-01-2007, publicou o artigo de Gregory Baum, conhecido teólogo
católico canadense, intitulado "O Amor Homossexual".
Os Cadernos IHU Idéias, nº 32, publicaram o artigo "À
meia luz: a emergência de uma teologia gay". Seus dilemas
e possibilidades, de André Sidnei Musskopf.
Eis o artigo de Gregory Baum
"Há alguns decênios,
a reflexão teológica sobre o amor homossexual se desenvolveu
bastante. Dois fatores históricos provocaram este inesperado
desenvolvimento.
Em primeiro lugar, as ciências psicológicas e antropológicas
descobriram que a orientação homossexual não é
nem uma doença, nem uma perversão da natureza, mas uma
variante absolutamente natural que diz respeito a uma minoria de homens
e mulheres.
Durante os anos sessenta e setenta,
organismos profissionais, aí compreendidas associações
de médicos, mudaram, por isso, seu juízo negativo com
respeito ao fenômeno homossexual.
Estas declarações científicas assinalaram uma virada
cultural bastante notável. As grandes tradições
religiosas haviam sempre condenado o amor homossexual como uma perversão
da natureza. Os pensadores religiosos estavam convencidos que a orientação
heterossexual fosse universal e que os atos homossexuais fossem comportamentos
anormais, que transgrediam uma lei essencial da natureza humana. É
por esta razão que alguns textos bíblicos denunciam o
amor homossexual. No século 19 as sociedades modernas também
decidiram criminalizar o comportamento homossexual.
Somente em fins do século 19
muitos pesquisadores reconheceram que a homossexualidade é uma
orientação não escolhida e estável de algumas
pessoas. Reagindo a esta descoberta, os moralistas, não podendo
mais reconhecer nos homossexuais pecadores que podiam converter-se,
começaram a considerá-los inferiores, enfermos, caracterizados
por desordens e privados de equilíbrio psíquico.
A Igreja católica ainda permaneceu ligada a este ponto em seu
ensinamento oficial. Segundo uma Declaração da Congregação
para a doutrina da fé, “a condição homossexual
é destituída de sua finalidade essencial e indispensável
e é, portanto, intrinsecamente desordenada”. Uma declaração
romana mais recente nos diz que os homossexuais não devem ser
ordenados padres porque não são capazes de ter relações
sadias com os homens e as mulheres da sua paróquia. Estes juízos
oficiais, no entanto, indiferentes aos resultados da pesquisa científica,
já não têm mais nenhuma credibilidade.
Dignity, uma associação de católicos gays e lésbicas,
fundada em Los Angeles em 1973, apresentou a própria confissão
de fé: “Cremos que os católicos gays são
membros do corpo místico de Jesus e fazem parte do povo de Deus.
Temos uma dignidade intrínseca, porque Deus nos criou, porque
Cristo morreu por nós e porque o Espírito Santo nos santificou
com o Batismo, fazendo de nós canais pelos quais o amor de Deus
se expande no mundo... Nós cremos que os gays podem expressar
sua sexualidade por um modo conforme ao ensinamento de Jesus”.
Desde então, nasceram associações
de gays e lésbicas em diversos países. Há coletâneas
de livros e artigos nos quais estes católicos contam e analisam
sua experiência religiosa e apresentam reflexões teológicas
fundadas na sua leitura da Bíblia. Neste esforço de repensar
sua tradição, estes católicos são acompanhados
por gays protestantes, judeus e muçulmanos. Segundo eles, ter
fé quer dizer aceitar a própria orientação
sexual como um dom de Deus.
O Deus do universo, que criou uma maioria de pessoas “straight”,
heterossexuais, decide criar uma minoria de pessoas homossexuais. Ao
invés de se lamentar diante de seu criador, estes cristãos
homossexuais têm orgulho da orientação sexual que
Deus lhes deu e vivem o Eros do amor ao seu modo, seguindo o ensinamento
de Jesus. Em suas relações amorosas querem permanecer
fiéis à vida espiritual, superar seu próprio egoísmo,
abrir-se ao amor altruísta pelo outro, recusar a dominação
e a dependência psicológica, praticar a reciprocidade e
a partilha.
Muitos teólogos reconhecem
hoje que a reflexão moral sobre o amor homossexual não
é autêntica se não são lidos os escritos
dos cristãos gays e se não é tomada a sério
o testemunho de sua fé. Todavia, estes teólogos se dão
conta que a posição defendida pelos católicos gays
contradiz o ensinamento oficial da Igreja católica. Os teólogos
sabem, ao mesmo tempo, que a Igreja, condicionada por novas experiências
religiosas, por descobertas científicas e por uma releitura dos
textos bíblicos, mudou, com freqüência, seu ensinamento.
Nós não cremos mais no “fora da Igreja nenhuma salvação”,
doutrina enunciada pelos concílios do passado, não aceitamos
mais a existência do limbo, pregada por séculos, apoiamos
a liberdade religiosa e os direitos humanos, embora estas idéias
tenham sido severamente condenadas pelos papas do século 19;
estamos conscientes que a Igreja mudou seu ensinamento sobre a tortura
e a pena de morte, e assim por diante. É, pois, absolutamente
razoável pensar que num destes dias a Igreja também mude
sua ética sexual."